Até o século passado (me refiro a 1995, por exemplo), quando estávamos em um determinado lugar com algumas pessoas, significava que estávamos naquele lugar com aquelas pessoas.
Hoje não.
“Hoje somos onipresentes”, comentou um amigo carioca numa mesa no Devassa. “Estamos em todos os lugares que quisermos, se e quando quisermos”, completou nada enigmático.
De fato, antes da internet e da telefonia celular, nosso contato com o mundo se resumia à TV e ao telefone fixo.
O sujeito chegava do trabalho, sentava diante da TV e absorvia as notícias do dia, achando fantástico como o mundo inteiro chegava até ele, sem que ele fizesse um esforço sequer, a não ser apertar o controle remoto, um incipiente contato com a mobilidade.
Se ele desejasse falar com alguém, bastava pegar o telefone, consultar a agenda telefônica da família, que era um livretinho que ficava ao lado do telefone (sim, o aparelho não saía do lugar), ou o guia da cia. telefônica, um calhamaço de papel gigantesco (que era editado anualmente) e pesquisar, por ordem alfabética, o nome e sobrenome do sujeito, para achar seu número telefônico e somente então discar (ooops, digitar).
Que trabalheira!
Bem, hoje todos sabemos como funciona, como contactar o mundo ficou mais simples, fácil e rápido.
“E sem graça”, emendou uma amiga na mesma mesa de bar. “Nunca estamos somente com a pessoa que escolhemos estar”.
“Carente”, imaginei, mas bastou olhar em volta e perceber que ela tinha razão, ninguém naquele bar estava somente ali.
A maioria das pessoas estava usando o smartphone, falando, consultando, pesquisando, facebookando, instagrando, jogando, blogando, tuitando, whatsappeando, skypeando, torpedeando ou, simplesmente, com parte da atenção voltada para o celular, sempre de prontidão em cima da mesa.
Ou seja, estávamos todos ali para encontrar, confraternizar e papear com os amigos presentes, mas estávamos também em todos os lugares que quiséssemos e, pior, participando da vida de outras pessoas em outros lugares.
“Onipresente só Deus”, lembrou um amigo, em tom religioso, e complementou… “que consegue estar em todos os lugares e com todas as pessoas ao mesmo tempo, mesmo que não seja fisicamente”.
As pessoas ouviram aquilo, olharam pros seus smartphones, digitaram alguma coisa, pensaram na frase derradeira, olharam pro céu (o Devassa fica em frente à praia da Barra), até que um outro manifestou: “Somos cada vez mais a imagem e semelhança de Deus. Somos onipresentes sim”.
O “temente a Deus” reagiu imediatamente: “Podemos ser multipresentes, jamais onipresentes”…
Ao ouvir aquele papo de biriteiro, o garçon virou-se, com a bandeja cheia e perguntou: “E qual a diferença?”
Num ato reflexo, todos pegaram seus aparelhos para perguntar “àquele que tudo sabe”, se de fato, com a internet e os aparelhos móveis, somos onipresentes ou multipresentes.
Pensei: “Nem uma coisa nem outra, estamos é cada vez mais ausentes”…
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