ESQUEÇA O “MOBILE FIRST”

O processo de desenvolvimento de novas soluções tecnológicas passa necessariamente por uma fase que chamamos de planejamento da arquitetura do sistema (ou “software architecture”), que nada mais é senão analisar todos os possíveis cenários de uso do sistema a ser desenvolvido, para construí-lo visando a máxima aderência do usuário.

Pode ser considerada uma das etapas do processo de “design thinking”, mas prefiro entendê-la como a integração entre o DT e o descritivo funcional, que é uma espécie de especificação técnica que antecede a codificação do sistema propriamente dito.

Abordo todo esse “tré-lé-lé” para comentar como o usuário final vem impactando o desenvolvimento de novos sistemas corporativos, sejam ERPs, Backoffices, OBTs, SGVCs, TEMSs (legenda no final do texto) ou quaisquer outros, em relação à migração de sua preferência nos últimos 15 anos: dos desktops para laptops, daí para tablets e, atualmente, para smartphones.

A dependência do smartphone começa cedo, influenciada pelo comportamento dos adultos
A dependência do smartphone começa cedo, influenciada pelo comportamento dos adultos

A explosão do mobile, bastante divulgada e debatida atualmente, causaram uma revolução também na produção de inteligência de software, o que levou muitas empresas de tecnologia a seguirem o que os centros de pesquisa e desenvolvimento já faziam há algum tempo: foco na plataforma mobile.

Sistemas pensados para uso via laptop passaram a ser desenvolvidos com versões App para plataforma mobile, um modelo caro de desenvolvimento e manutenção, devido aos diferentes sistemas operacionais das plataformas dominantes do mercado, que exigem equipes especializadas para cada uma, ou seja, vários profissionais fazendo basicamente a mesma coisa, para consumo por Apps diferentes.

Com as últimas versões dos “browsers” mais atualizados, que permitem praticamente todas as funcionalidades dos Apps, atualmente a tendência aponta para direção oposta, mais racional, prática, tão efetiva quanto os Apps e que não apresenta o risco do usuário encontrar versões diferentes de um mesmo sistema corporativo, de acordo com o sistema operacional de seu smartphone.

A metodologia de desenvolvimento baseda no “mobile first” venceu e a produção de software passou a focar nesta plataforma prioritariamente, deixando todas as demais (tablets, laptops e desktops) em segundo planos, gerando os sites chamados responsivos.

Os sites responsivos são desenvolvidos para se adaptarem à plataforma do usuário
Os sites responsivos são desenvolvidos para se adaptarem à plataforma do usuário

O fato é que a velocidade do predomínio do mobile sobre todas as outras plataformas está, agora, provocando nova ruptura no processo, não mais linear, de desenvolvimento de software, fazendo com que muitos sistemas passem a ser desenvolvidos com foco não mais prioritário, mas exclusivo, nas plataformas mobile.

É o tal do “mobile only”, uma tendência mundial (ainda distante para algumas famílias de sistemas) ditada pelo comportamento do consumidor, que compra e usa mais smartphones do que toda a soma de tablets, laptops e desktops, num movimento que o faz misturar definitivamente vida pessoal e profissional, sem qualquer diferenciação entre elas, a não ser a linha delimitatória que cada um consegue traçar no seu dia-a-dia.

Uma mudança de comportamento que parece interessante tecnologicamente, embora preocupante do ponto de vista das relações sociais, e que merece ser acompanhada de muito perto por quem produz sistemas para o usuário final.

Afinal, somos todos protagonistas desta revolução e co-responsáveis por aonde tudo isso vai dar…

A liberdade proporcionada pelo acesso ilimitado ao conhecimento trouxe também um novo tipo de não-liberdade, agravada pela escolha do usuário
A liberdade proporcionada pelo acesso ilimitado ao conhecimento trouxe também um novo tipo de não-liberdade, agravada pela escolha do usuário

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Glossário de alguns termos técnicos deste texto:

– Software architecture = definição dos componentes e propriedades externas de um software, incluindo as interações com outros softwares, com foco principal na análise das necessidades dos usuários para um sistema a ser desenvolvido.

– Tré-lé-lé = o mesmo que blá-blá-blá, só que com algumas tecnicalidades.

– Design Thinking = abordagem do planejamento e desenvolvimento de soluções centrado nas pessoas.

– ERP = enterprise resource planning = sistema de gestão empresarial.

– Backoffice = sistema de gestão financeira.

– OBT = online booking tool = sistema de reserva online.

– SGVC = sistema de gestão de viagens corporativas.

– TEMS = travel and expense management system = sistema de gestão de viagens e despesas.

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RETROSPECTIVA 2016: TECNOLOGIA

O ano voa, mal começou e parece que já vai acabar…

Ano de crise ética, política e econômica, de impeachment, de renascimento da esperança, de Jogos Olímpicos, de início de retomada da economia (será?), de reconstrução da nação…

A evolução tecnológica acelera o ritmo de inovações, buscando atender demanda do consumidor e o mercado de viagens e turismo vai junto, embalado por uma tsunami de novidades, de tecnologias disruptivas, que oferecem novas formas de fazer a partir de comportamentos diferentes.

Pensando nesse tema, li o excelente artigo do Luis Carlos Vargas, da Travelport, publicado Portal Panrotas em 19/04, que me estimulou a reler o também ótimo artigo do Alexandre Cordeiro, do Sabre, no Portal Panrotas de 16/03, ambos sobre a revolução que a tecnologia está provocando no mercado de viagens e turismo (recomendo a leitura de ambos).

Inspirado por esses dois artigos, iniciei a construção deste post, mas lembrei-me de entrevista que concedi no final do ano passado, sobre as tendências e novidades do mercado de viagens e turismo para este ano de 2016.

O resumo das respostas desta entrevista são as tendências tecnológicas em que acreditamos e apostamos em nosso planejamento estratégico para este ano de 2016:

1. As empresas buscarão, mais do que nunca, novos meios para cortar custos, otimizar processos, reduzir despesas, fazer mais com menos e, seguramente, a tecnologia de gestão de despesas (expense management) é o caminho natural.

2. As agências de viagens focarão em capacitar-se para novas ferramentas tecnológicas para o atendimento e encantamento do cliente, seja para operação ou agenciamento de viagens, de turismo ou corporativas.

3. A diversificação será a tônica para um mercado sem barreiras, em que todos podem tudo, agenciar, operar, intermediar, consolidar, distribuir e representar, diretamente para o cliente final ou através do agente de viagens ou através de grupos associados com o mesmo propósito.

4. O NDC (New Distribution Capability), novo padrão tecnológico desenvolvido pelo IATA para distribuição de reservas e bilhetes aéreos, deixará de ser uma promessa e começará a mostrar suas vantagens, integrado aos sistemas que focam em inovação (no início) e a todos os demais (em seguida).

5. Não bastará a uma agência de viagens corporativas ser uma TMC puramente, devido à crescente demanda por novos e variados serviços, como gestão de despesas, gestão de eventos e gestão de frotas, entre outros serviços e produtos agregados a viagens corporativas.

6. Da mesma forma, não bastará a uma agência de viagens de turismo e lazer ou a uma operadora de turismo, ser intermediário de serviços prestados por cias. aéreas e hotéis, entre outros, já que estes investem cada vez mais na comercialização direta com o consumidor.

7. A similaridade entre todos esses cenários são os investimentos em tecnologia, não mais opcionais, mas mandatórios, seja num sistema backoffice mais eficiente, num motor de reservas para entrar no mercado de OTAs, num sistema de gestão de viagens corporativas (self-booking tool) para disputar o mercado de viagens corporativas, num sistema de gestão de eventos ou de frotas, ou mesmo numa plataforma de gestão de despesas para diversificar e abrir o leque de ofertas para a mesma carteira de clientes corporativos.

O que não dá mais é para ficar parado lamentando a velocidade do bonde sem ao menos tentar entrar nele, afinal poucas coisas são tão democráticas quanto as novas tecnologias.

Quanto mais se usa em casa, mais se aprende a usar no trabalho.

E o agente de viagens já descobriu isso.

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PONDO ORDEM NA CASA !

É mais usual do que parece o movimento de padronização de tecnologias, em especial aquelas inovadoras e disruptivas, que chegam para mudar abruptamente o comportamento do consumidor em relação a determinado produto ou serviço.

Como exemplo de tecnologia recente, ainda nascendo, basta observar a tão comentada Internet das Coisas ou IoT de “internet of things”, que inclui “wearable devices”, “embedded systems”, entre outros.

Muitas startups correram, e ainda correm, para sair na frente e desenvolver soluções inovadoras baseadas em IoT, sonhando que sejam dominantes no futuro em função de seu grau disruptivo, mas as grandes indústrias de bens de consumo (refiro-me a eletrodomésticos, carros, roupas, entre outras) estão tão atentas a esta tendência, que não perderam tempo e já começam um movimento de padronização desta nova tecnologia, em comum acordo com os grandes provedores de tecnologia no mundo:

IoT: Empresas mundiais criam fundação para padronizar tecnologia

Esta fundação agregará diversos segmentos da indústria, com o objetivo de organizar um mercado ainda incipiente e que envolve todo e qualquer produto, desde malas, sapatos, geladeiras, armários, bicicletas, roupas, material esportivo, carros, alimentos, remédios etc, etc, etc.

Os fabricantes de bens de consumo buscam um padrão tecnológico para a Internet das Coisas estar em todos os lugares até 2025
Os fabricantes de bens de consumo buscam um padrão tecnológico para a Internet das Coisas estar em todos os lugares até 2025

Como IoT é uma tecnologia nova a ser embarcada em produtos velhos conhecidos do consumidor, os tradicionais fabricantes não querem ficar de fora desta festa e, mais do que isso, não querem depender de poucos fornecedores, ou de empresas que utilizem padrões próprios para desenvolver e manter este ou aquele dispositivo, não querem se tornar dependentes de ninguém.

Isso nos lembra alguma coisa?

Sim, uma analogia direta com nosso mercado nos faz lembrar que, desde que a IATA citou pela primeira vez o termo NDC, diversos questionamentos surgiram no mercado sobre seus reais objetivos.

Diziam que as cias. aéreas desejavam a posse e o controle de todos os dados dos passageiros para alavancar sua estratégia de desintermediação, ou que o objetivo era enfraquecer o hub de distribuição representado pelos GDSs, cada um com um padrão tecnológico proprietário, ou ainda permitir que todos os players de tecnologia da distribuição tenham as mesmas condições concorrenciais e, assim, estimular inovações disruptivas que mudem o rumo do negócio.

A verdade é que a real motivação do NDC não é nenhuma dessas, mas o mais prosaico dos objetivos: padronização tecnológica tal e qual as indústrias de bens de consumo estão buscando para a IoT.

Aliás, comparativamente ao objetivo da padronização da IoT, veja o que diz a IATA sobre o NDC:

The power of standardization

An industry standard will facilitate a more efficient airline distribution system, thereby benefitting airlines, agents, GDSs, IT providers and travel start-ups. Structured around seven distribution-related functions, the NDC Standard provides the opportunity to address the end-to-end airline distribution process, e.g. shopping, booking etc., and to deliver enhanced customer experiences.

A IATA lançou o projeto de padronização da tecnologia de distribuição no final de 2012 e batizou-o NDC (New Distribution Capability)
A IATA lançou o projeto de padronização da tecnologia de distribuição no final de 2012 e batizou-o NDC (New Distribution Capability)

Para maiores detalhes sobre o NDC, veja diretamente na fonte: IATA NDC Standard

Se para ter força suficiente para organizar o mercado, a padronização de uma tecnologia depende de ser promovida por uma entidade, fundação ou associação representativa dessa indústria, no caso da distribuição de reservas aéreas, essa entidade sem dúvida alguma é a IATA, cujas mais de 400 cias. aéreas associadas produzem 84% do tráfego aéreo mundial, processam US$ 367 bilhões em vendas via BSP e atendem 35 mil agências de viagens em todo o mundo.

As cias. aéreas, aqui representadas pela IATA, são as efetivas donas do mercado de transporte aéreo, cessionárias que são deste modal de transporte no mundo e, tal e qual os citados fabricantes de bens de consumo, pretendem arrumar a casa, padronizando a tecnologia de distribuição de seu serviço.

A questão aqui é que, diferentemente da IoT, as tecnologias de distribuição de reservas aéreas existem há mais de 50 anos e, por isso, o desafio da IATA de estabelecer um padrão, enfrenta décadas de legado tecnológico, de práticas e acordos comerciais (que envolvem incentivos financeiros bilaterais) e que são diferentes de mercado para mercado, de país para país, transformando sua implantação numa missão tão complexa quanto substituir todo o combustível de uma aeronave em pleno voo…

Claro que não é impossível de ser feito, mas há que se encontrar alternativas para o equilíbrio comercial entre todas as partes envolvidas.

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