Escalar promessas ou sustentar entregas?

O mercado de viagens e turismo sempre viveu numa montanha russa, entre “novos modelos” confrontando os negócios consolidados e a frequente quebra de empresas alavancadas.

A fórmula é conhecida, empreendedores criam novas agências de viagens (corporativas ou de lazer) ou novas operadoras, rotulam de “inovação” aquilo que todo o mercado já oferece, fazem um marketing agressivo (é onde gastam mais) e trabalham super-alavancadas financeiramente, do mesmo jeito que Hotel Urbano e outras, que só funcionam se seguirem crescendo vertiginosamente, porque não dependem da operação, mas sim da expectativa de seus investidores em venderem a empresa ali na frente.

Mas se a bicicleta parar antes da venda da empresa, vai tudo ao chão e é aqui que mora o perigo…

Da mesma forma foram as *empresas de milhas*, que pareciam uma ameaça ao mercado no passado recente (e deu no que deu), e que me fizeram relembrar os sites de *compras coletivas* (Peixe Urbano, Groupon, quem lembra?), além de diversas *OTAs* muito alavancadas no passado, como Submarino, Viajo.com, Ziptravel, essas há bem mais tempo.

Lamentavelmente, todas sucumbiram à realidade do mercado brasileiro, me fazendo recordar as palavras de Beto: “O Brasil é isso aí, meu amigo, o Brasil é o país do coitadinho, é o país do direito sem obrigação, é o país da impunidade, isso é cultural e não vai mudar”.

O fato é que todas essas empresas que citei (entre outras) pareciam representar ou pretendiam ser uma ameaça ao negócio original das agências de viagens corporativas, das agências de turismo e das operadoras tradicionais, aquelas que vivem de sua operação, compram, vendem e prestam serviços dentro das regras do jogo, investem e crescem de forma orgânica e saudável (como bem afirmou o Fernando Vasconcellos no ótimo texto que republico no final deste post), não se empanturram de dinheiro impagável e miram, antes de tudo, construir e preservar sua reputação, processo que requer longo prazo, incompatível com investidores que têm pressa.

Lembro que pouco antes da pandemia, novos players do mercado de gestão de viagens e despesas corporativas (= agências de viagens que se rebatizaram com o neologismo da moda) também surgiram repetindo esta mesma fórmula de “inovar” com o que já existia, associado à alavancagem financeira e um marketing agressivo.

Sobreviveram à pandemia recebendo novos sócios, e agora em 2025 tiveram que socorrer suas operações com dinheiro novo, diluindo a participação dos fundadores, numa decisão aparentemente inteligente, mesmo que os controladores sejam outros e a tecnologia esteja defasada (falta muito em IA), mas a verba de marketing parece garantida e a alavancagem financeira ganhou novo lastro, para seguir comprando mercado com descontos impossíveis.

Por isso, o texto do Fernando Vasconcellos (Kontik), originalmente postado no Linkedin, faz tanto sentido e nos leva a refletir sobre esses movimentos:

“No mundo corporativo, há uma diferença gritante entre construir um legado e perseguir valuation. Uma coisa é ser uma empresa sólida, que atravessa ciclos econômicos, investe em tecnologia com responsabilidade e entrega valor real ao cliente há décadas. Outra bem diferente é depender de rodadas de investimento para sobreviver, crescer a qualquer custo e, no fim, buscar uma saída rápida via aquisição.

Empresas que duram não são feitas de hype, mas de consistência. Não precisam de slogans provocativos — têm clientes que confiam, times que entregam e parceiros que permanecem.

A solidez pode não ser “sexy” para quem valoriza só crescimento exponencial, mas ela constrói algo que o mercado respeita: reputação.

No fim do dia, o que vale mais: escalar promessas ou sustentar entregas?

Fernando Vasconcellos

Diretor da Kontik”

ESCOLHA DE SOFIA: VENDER VIAGENS OU ATENDER O CLIENTE?

Henry Ford é autor, entre outras, da famosa frase que inspira empreendedores até hoje, 120 anos depois: “Se eu tivesse perguntado aos consumidores o que eles queriam, teriam dito um cavalo mais rápido.”

Esta frase foi reeditada por outro especialista em marketing e criador de produtos inovadores focados na real necessidade do consumidor: ”As pessoas não sabem o que querem até você mostrar a elas” (Steve Jobs)

A partir desta premissa, insistimos todos em oferecer o que nós, agentes de viagens, acreditamos que as empresas precisam: viagens corporativas.

A pandemia do coronavírus nos mostrou que, se fôssemos seguir o que os clientes querem agora, estaríamos investindo em:

Treinamento à distância

Devido ao distanciamento social, o EAD virou febre. A febre vai passar, mas seus efeitos vieram para ficar.

Eventos remotos

O olho no olho via Zoom (e outras plataformas) não é a mesma coisa, mas funciona, seja para uma reunião ou para mega-eventos. Parece ser outra tendência que já virou realidade.

Teletrabalho

Empresas que não admitiam sua adoção, agora o defendem com fortes argumentos: redução de gastos com escritório, alimentação, transporte, ações motivacionais presenciais etc. Quem tinha dificuldade em avaliar o desempenho de cada colaborador a partir de métricas subjetivas, passou a fazê-lo baseado no único indicador que restou: a entrega de resultados.

Gestão de despesas

Com a pandemia, o mundo inteiro freou a lógica econômica, vigente desde a segunda guerra mundial, que preconizava investimentos permanentes no crescimento dos negócios como única solução para sua perpetuidade, estimulando gastos crescentes como estratégia para seguir adiante. Esta lógica foi posta em cheque e, agora e daqui pra diante, controlar todas as despesas passou a ser tão importante quanto foi reduzi-las durante a pandemia. 

Após analisar esses fatos, vejo que os agentes de viagens corporativas estão diante do desafio de escolher entre:

1) Seguir oferecendo o que sabem fazer, mas o cliente não quer e não pode comprar neste momento: viagens corporativas

ou

2) Direcionar seu time para oferecer o que as empresas precisam e mais querem neste momento: controle e redução de todas as despesas corporativas.

Como iniciei, concluirei este texto com outra frase famosa de Henry Ford, que também merece a nossa reflexão sobre qual caminho devemos seguir:

“Não nos tornamos ricos graças ao que ganhamos, mas com o que não gastamos”.

E é justamente nisso que todas as empresas do mundo estão dispostas a investir, agora e sempre: gastar menos e gastar melhor.

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AQUI NÃO É O SILICON VALLEY…

First mover, empreendedorismo, inovação, disrupção, tecnologia na veia !

Com cases apresentados em palestras de 30 a 45 minutos, das 9:00h às 18:00h do sábado, 07/10, no Expo Center Norte em São Paulo, o evento recebeu 2 mil pessoas, ávidas por conhecer as histórias de quem errou, falhou, quebrou, deu a volta por cima, empreendeu de novo e agora virou benchmarking de sucesso para motivar os pretendentes a startupers.

O Mauricio Benvenutti, da StartSe, é um sujeito cabeludo, barbudo, magro e falante, um biotipo oposto ao da imagem icônica do empreendedor do Vale do Silício, tipicamente um jovem nerd de óculos, cabelo curto e um tanto acima do peso.

Mas ele conhece o seu negócio e conduz o evento com eficácia, tanto com sua onipresença no palco (ele sobe até para apresentar quem vai apresentar os palestrantes…), quanto com sua onipresença nos inúmeros vídeos, entre uma palestra e outra, estimulando os congressistas a “viver a experiência Silicon Valley” in loco.

O StartSe Silicon Valley Conference atraiu cerca de 2 mil pessoas que passaram o sábado atentos aos casos de startups apresentados

Aprendi no evento que, no Vale (como o Silicon Valley é chamado na intimidade), os protótipos de carros autônomos andando pelas ruas são tão corriqueiros, que já não chamam a atenção e que, atualmente, o tema cool por lá é a nova corrida espacial protagonizada por empresas privadas, incluindo projetos pra colonização de Marte…

Também aprendi que uma empresa que pretende copiar os concorrentes, não é bem-vinda no Vale, frase repetida algumas vezes nos painéis, inclusive por Michele Messina, da Explora, uma espécie de tutora dos novos entrantes na região, apesar do conflito com o extraordinário case da Movile, uma ex-startup brasileira que hoje tem sede no Vale, cujo fundador Eduardo Henrique citou 14 vezes a palavra “copiamos” fulano, beltrano e sicrano, geralmente se referindo à Ambev, ao Google e outros players deste porte, durante sua ótima palestra motivacional.

Atualizei-me sobre os avanços da impressão 3D, uma tecnologia liderada pela HP, cuja visão de futuro é zerar estoques, esvaziar armazéns e torná-los desnecessários nos próximos anos, quando praticamente quaisquer peças e materiais poderão ser impressos, sob demanda nas lojas revendedoras ou mesmo pelo próprio cliente “no conforto da sua casa”, segundo o brasileiro Vinicius David, que lidera projetos de inovação dentro da HP no Vale do Silício. O Vinicius, mais de uma vez, referiu-se à HP como “minha empresa”, denotando o que se habituou chamar “espírito de dono”.

As impressoras 3D já são realidade e prometem imprimir 10% de tudo o que for fabricado no mundo até 2025

Surpreendi-me com o sucesso da Brain Care, emprendimento do brasileiro Plinio Targa, startup brasileira que desenvolveu e patenteou, no Brasil e nos EUA, tecnologia de exame cerebral não invasivo, que simplificou, barateou e tornou indolor e sem risco, os exames de diagnóstico de hidrocefalia, muitas vezes confundidos com Alzheimer e Parkinson. O primeiro projeto da Brain Care é um estimulador do cortex cerebral, aparelho que promete ampliar as capacidades cognitivas, de concentração e até a resiliência física de esportistas e profissionais que demandam esforço no limite em suas atividades.

A Brain Care pesquisa e desenvolve aparelhos que estimulam o cortex, além de equipamentos que simplificam exames cerebrais não invasivos

Concordei com os conceitos proferidos pelos empreendedores da BovControl, do RankMyApp e, principalmente, da Worthix, caso raro de empresário experiente, pé no chão, que teve a coragem de recomendar o óbvio para uma plateia um tanto deslumbrada: “Estou meio cansado de empreendedores de palco, o que funciona é empreender de olho na grana, pois é isso que vale no final das contas.”

Gostei de algumas frases ouvidas no evento:

Um equipamento inovador tem que ser simples, barato e portátil.

Plinio Targa, da Brain Care

Ideias valem muito pouco, o que tem muito valor é a execução de uma ideia.

Eduardo Henrique, da Movile

Passei 2 anos consertando startups no Vale e outros 6 meses consertando a cabeça de empreendedores de startups que quebraram, porque não conseguimos consertar.

CEO de Venture Capital

Inovação tem 3 pilares: rebeldia, conhecimento e capital. Somente os 3 juntos têm potencial para gerar inovação.

Mauricio Benvenutti, da StartSe

Não gostei do mantra que estimula o empreendedor a falhar como caminho natural para ser bem sucedido no negócio seguinte, pois se num ecossistema de negócios extraordinário como o Vale do Silício, 90% das startups quebram, 9% sobrevivem e menos de 1% realmente bombam no mercado, imagine no cenário econômico brasileiro, onde o capital de risco não é abundante e as regras de negócios, quando existem, podem mudar a qualquer momento ao sabor do politico de plantão.

Aqui, você não precisa falhar antes para ser bem sucedido depois, aliás eu recomendo: evite falhar, isso não vai te ajudar no Brasil.

Mas, se no final das contas, você quiser seguir a sugestão do Felipe Lamounier, da StartSe, que apresentou o conceito Fail fast, fail often, eu sugiro numa boa: vá para o Vale.

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