Na época em que ocupava o cargo de diretor adjunto da Atout France na América do Sul, participei na França de um evento em que se discutiu a síndrome de Paris, tema de diferentes matérias jornalísticas e documentários no final dos anos 1990 e início dos anos 2000, comumente manifestada pelos turistas japoneses quando visitavam pela primeira vez a capital francesa Tratava-se de um fenômeno recente que escancarava as diferenças culturais entre os dois povos. Uma tensão no contato entre franceses, sempre francos (adoro etimologia das palavras), com os japoneses, conhecidos pela dificuldade de dizer não publicamente e detentores de um código de hospitalidade muito próprio, chamado de omotenashi.
Mas há outra síndrome muito comum no universo de viagens e muito mais antiga. Quem trabalha com viagens religiosas conhece muito bem: a síndrome de Jerusalém.
Ela se manifesta principalmente entre judeus e evangélicos, sobretudo os cristãos pentecostais. Trata-se de um surto em que fiéis religiosos, ao chegar à Cidade Santa, começam a manifestar comportamentos psicóticos. Já no aeroporto de Ben Gurion.
Artigos acadêmicos apontam que o psiquiatra Heinz Herman já estudara tal fenômeno nos anos de 1930, portanto antes mesmo da criação do Estado de Israel. A literatura, no entanto, aponta registros de tais ocorrências desde a Idade Média e descrições detalhadas em obras literárias do século XIX.
Grosso modo, algumas pessoas passam a manifestar comportamentos atípicos: desde saírem do hotel durante a noite enroladas em lençóis bancos como se voltassem no tempo, até pregações desconexas em lugares públicos, anunciando o final do mundo.
Guias experientes identificam a síndrome a partir de sinais iniciais muito particulares: ansiedade extrema, agitação, sudorese, desejo de separar-se do grupo, emoções intensas, obsessão por banhos e roupas limpas, discursos radicais religiosos e entoação de cânticos, hinos e louvores ininterruptamente. Os primeiros sintomas podem ser notados quando o avião aterrissa em Israel.
Imediatamente profissionais de saúde mental são acionados e a administração de medicamentos torna-se necessária, além de um acompanhamento muito de perto por parte dos responsáveis. Nos anos 1980 e 1990 foram observados menos de cem casos. Com o crescimento dos movimentos pentecostais no Brasil, nos EUA e em países africanos, o número de ocorrências aumentou significativamente. Isso é explicado pela doutrina do avivamento que é uma das características dessas igrejas em relação as igrejas protestantes históricas. Trata-se, segundo os adeptos, de um transe em que ocorre a manifestação do Espírito Santo durante o culto.
Mas a síndrome é também observada junto a homens judeus e católicos. Muitos deles passam a se intitular profetas durante o processo.
O assunto serviu de mote para um episódio do desenho animado “The Simpsons”: The greatest story ever d’ohed. Nele, Homer, em uma viagem a Jerusalém, é acometido da síndrome e passa a se intitular um novo messias de uma religião cujos fiéis são chamados de “Chrismujews” ( uma mistura de cristãos, muçulmanos e judeus).
Apesar do tom bem humorado da produção televisiva, trata-se de um assunto sério e que pode causar transtornos durante a viagem e depois dela, embora não se tenha registrado nenhum caso fatal ou muito grave.
Profissionais que atuam no setor precisam aprofundar o conhecimento sobre o assunto. Afinal, saúde, principalmente mental, não é brincadeira.
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