Existe Turismo LGBT RELIGIOSO?

Em um artigo de 2006 intitulado “Goodbye Pareto Principle, Hello Long Tail” ( Adeus princípio de Paretto, olá Cauda Longa, em tradução livre) Erik Brynjolfsson, Yu Hu e Duncan Simester trouxeram preciosa contribuição para a economia global nos anos seguintes. O princípio da cauda longa é a ideia de que a internet possibilita, através de uma revolução na comunicação e distribuição, explorar novos mercados e ganhar muito dinheiro, não apenas com nichos, mas nichos de nichos.

Trata-se de uma estratégia que busca atingir vários mercados de baixa procura, em vez de focar em um mercado único com muitos pedidos. No varejo, isso é bastante usado pelos novos empreendedores, que contam com os dados cada vez mais precisos de algoritmos e conseguem maior capilaridade e exatidão em suas promoções.

As políticas identitárias e a customização, decorrente de uma individualização cada vez maior da sociedade, fenômeno muito estudado pelo filósofo francês Gilles Lipovetsky, permitiu que mesmo o turismo se torne cada vez mais segmentado. Hoje há agências de viagens especializadas em turismo de bicicleta, outras em experiências enogastronômicas, outras ainda em turismo enogastronômico em bicicleta.

Mas não apenas para a aviação, o céu é o limite.

Na última edição do LGBT Turismo Expo, organizada por Alex Bernardes e realizada no dia 25 de julho no Hotel Unique, contou com um painel sobre Turismo Espiritual para o público LGBTQIAP+. O que surpreendeu muita gente. E, é claro, por simples ignorância. Afinal, insiders sabem que esse mercado é muito grande.

Ao contrário do que alguns líderes religiosos pensam, esse público pode ser, e é, muito religioso. Obviamente há ateus, agnósticos e antirreligiosos no universo LGBTQIAP+ como existe no universo heteronormativo. Como cientista da religião, tenho observado com surpresa o quanto a população brasileira é religiosa e que tal comportamento se reflete em todos os segmentos da sociedade, de norte a sul, passando por diferentes estratificações sociais e grupos culturais. Basta lembrar que o país dispõe de muito mais instituições religiosas (igrejas, templos, centros espíritas, terreiros, mesquitas, sinagogas) do que instituições de ensino e hospitais.

Além disso, é importante mencionar que mudanças importantes em diferentes religiões têm se dado quando se trata de comportamentos sexuais. Grupos de católicos gays têm forçado mudanças dentro da Igreja, antes mesmo do Pontificado de Francisco. O atual Papa, que fora no passado persona non grata de grupos argentinos gays, hoje tem uma postura mais aberta ao diálogo. A igreja anglicana tomou a frente e defende abertamente uma série de direitos para essas diferentes comunidades. As igrejas evangélicas inclusivas têm surgido cada vez mais em diferentes bairros do Brasil e dos EUA em velocidade espantosa. Muitos terreiros de candomblé, inicialmente transfóbicos, vêm mudando a postura e promovendo maior integração das pessoas transexuais.

O painel do evento, embora inédito, não aprofundou discussões. Mas foi essencial para tirar do armário este mercado e provocar reflexões iniciais. Pensando bem, não tão iniciais. Afinal, atores importantes há tempos vem trabalhando nesse cenário. O escritório de turismo de Israel investe na promoção do destino junto a comunidade LGBTQIAP+ há mais de uma década, não apenas no Brasil, mas em todo o Ocidente.

O Brasil tem amadurecido e se tornado referência quando se fala em turismo LGBTQIA+ . Temos nomes importantes atuando há anos como o próprio Alex, Clovis Casemiro, Franco Reinaudo, Antonieta Varlese, Marcelo Michieletto, Simon Mayle. Marcas como American Airlines, Accor e Panrotas têm sido fundamentais para organizar o mercado. Mas essa última edição do LGBT Turismo Expo permitiu pensar nos subsegmentos, apresentando mais oportunidades de negócios.

Mas, é claro, ganhos potenciais apenas para quem não tem preconceito e medo de arriscar. Mais do que isso, têm orgulho em inovar e empreender.

Jerusalém sob as estrelas

A Ciência da Religião é o ramo das Ciências Sociais que estuda a influência das diferentes tradições espirituais na sociedade. Seja na economia, na política, nas artes, na cultura e até na gastronomia. Uma das áreas de pesquisa que mais cresce é o turismo religioso. Em conversa com a teóloga, mestre em Ciência da Religião pela UMESP e doutoranda em Ciência da Religião pela PUC-SP, Marisa Furlan, exímia conhecedora da Bíblia, fiquei impressionado com suas impressões sobre a terra santa. Pedi então que ela registrasse suas impressões, que seguem abaixo em um texto redigido por ela.

” Israel, um país famoso por sua história rica e importância religiosa, revela-se como um destino luminoso ao cair da noite. Sua beleza noturna é uma combinação envolvente de luzes cintilantes, uma vibrante vida noturna e a serenidade sob o brilho das estrelas.

A cidade de Jerusalém alterna momentos de paz e de guerra em sua longa história. Venerada por três grandes religiões, revela um fascínio único quando a noite cai sobre suas antigas ruas. A Cidade Velha ganha nova vida, expondo uma atmosfera que transcende as fronteiras do religioso para abraçar a beleza natural e a agitação da vida noturna. Os monumentos históricos resplandecem sob uma nova luz, enquanto as ruas ganham um ar de mistério e encantamento. É uma jornada que convida os visitantes a explorar uma Jerusalém além das concepções tradicionais, revelando uma cidade que resplandece com graciosidade e simplicidade sob o céu estrelado.

A Cúpula da Rocha, com seu domo dourado, brilha sob a luz da lua, enquanto o Muro das Lamentações traz seu brilho iluminando o ambiente para uma reflexão tranquila. Passear pelas ruas estreitas de Jerusalém à noite é como caminhar através de páginas da história.

Tel Aviv, a cidade que nunca dorme, é famosa por sua vida noturna agitada. À medida que o sol se põe, os cafés ao ar livre se enchem de pessoas, nos bares. A música e as praias se transformam em locais de festas animadas. A cidade é um caldeirão de culturas, e isso é evidente na variedade de opções de entretenimento noturno, desde clubes de dança até bares de jazz e restaurantes gourmet. Comparando as luzes de Tel Aviv, com as luzes de Jerusalém, Aviva Sarna Segal escreveu: “Mas as luzes de Jerusalém, guiam-me em calmaria, para dentro dos braços da mãe que diz: chegaste, filha, descanse, descanse em nosso abrigo” (Revista Cultura Teológica, p.24 S/D).

Para além dos centros urbanos, a magnificência noturna de Israel também se desdobra em suas paisagens naturais. O Deserto de Negev proporciona uma visão espetacular do céu estrelado, distante do brilho das luzes citadinas. A serenidade do deserto à noite oferece uma experiência genuinamente singular, onde o silêncio é pontuado apenas pelo ocasional chamado de animais noturnos.

O Mar Morto, outro destaque natural de Israel, também é impressionante à noite no verão. A superfície calma da água reflete as estrelas, criando uma cena ímpar de calmaria e beleza.

O magnetismo entre as religiões se funde na cultura desse lugar encantador e impressionante. Nesse culturalismo religioso com diversas tradições, vale ressaltar a festa do Hanukkah ou Chanukáh (festa das luzes).

Hanukkah, conhecido como a Festa das Luzes, é uma celebração anual repleta de significados simbólicos para a comunidade judaica. Ano após ano, durante essa festividade, os lares judaicos são iluminados com a chama das velas do chanukiá, um candelabro de oito braços colocado perto de uma janela, voltado para a rua. A tradição é iniciar acendendo a vela da extrema direita na primeira noite e, a cada noite subsequente, acrescentar uma nova vela, até que, no oitavo dia, o candelabro esteja completamente aceso.

A história por trás do Hanukkah remonta ao século II AEC., durante a ocupação do Oriente Médio pelo Império Selêucida. Diante dessa ameaça à sua fé, o povo de Israel iniciou uma luta pela liberdade religiosa e política.

Na época, o então rei Antíoco IV proibiu a religião e as práticas judaicas e decretou que os judeus deveriam adorar os deuses gregos no Templo. O sacerdote judeu Mataias, seu filho Judas Macabeu e seu exército (os Macabeus) se revoltaram, forçando Antíoco IV a sair da Judeia. Macabeu e seus seguidores recuperaram o Templo e reconstruíram o altar judeu, possibilitando que eles pudessem voltar às suas práticas religiosas.

O hanukkiah é muito semelhante a menorá (candelabro de sete pontas e um conhecido símbolo do judaísmo), o que faz com que muitas vezes seus nomes se confundam. Quando o altar foi reconstruído por Macabeu e seu exército, parte do processo incluia reacender as chanukias que foram proibidas.

Ao reacenderem o candelabro do templo, encontraram apenas óleo suficiente para uma noite, mas, miraculosamente, a chama permaneceu acesa por oito dias, tempo necessário para preparar mais óleo. Esse evento é lembrado como o milagre das luzes e é por isso que o Hanukkah é também conhecido como a Festa das Luzes.

Para relembrar esse acontecimento histórico, a comunidade judaica realiza anualmente uma celebração cheia de simbolismo. As datas do Hanukkah variam de acordo com o calendário judaico, e as famílias judaicas acendem as velas do chanukiá, um candelabro de nove braços, seguindo a tradição de acender uma vela da direita para a esquerda a cada dia, até que, no oitavo dia, todas as velas estejam acesas, relembrando as luzes que guardaram e protegeram a comunidade judaica.

Rito e Celebração do Hanukkah

O maior símbolo do Hanukkah é o candelabro chanukiá, para nove velas, sendo que uma delas fica num lugar mais alto que as demais, chamada de shamásh. É costume colocar o objeto na janela das casas, de maneira que todos possam ver e se lembrar do milagre. Também é comum, nas noites de Hanukkah, o uso de jogos. Esse costume surgiu na Idade Média, quando os judeus eram proibidos de guardar as tradições e as festas. Eles, então, utilizavam de variados jogos, para que se alguém estranho os visse não desconfiasse de que se tratava de judeus realizando alguma cerimônia. Entre esses jogos, os mais usados eram dama e dreidel.

Este último acabou se tornando um dos símbolos da celebração. Ele se parece com um pião de quatro faces, com as seguintes letras do alfabeto hebraico: nun, guímel, hê e shin. Juntas, elas formam um acrônimo para “Nés gadól haiá shâm”, que significa “Um grande milagre ocorreu lá!”, expressando a alegria em ser judeu.

 A culinária também é um ponto forte da comemoração. São servidos sufganiots (um doce parecido com o sonho) e latkes (bolinhos de batata). Ambos são fritos em óleo – alusão ao milagre que manteve o candelabro de velas aceso.

Todas essas curiosidades tornam Israel um destino único e intrigante para quem deseja explorar sua história, cultura e paisagens diversificadas.

Em resumo, a beleza noturna de Israel é uma experiência que vale a pena viver. Seja explorando as cidades iluminadas, desfrutando da vida noturna vibrante ou admirando a tranquilidade do deserto sob as estrelas, Israel à noite é um espetáculo que você não vai querer perder. “

Marisa Furlan, Mestre em CRE pela UMESP

Espaço sagrado e turismo

O turismo religioso avança no Brasil. E se não se desenvolve mais rapidamente, não é por falta de números expressivos tampouco por falta de fé. Para o turismólogo Sidnesio Moura, é a falta de entendimento da indústria e do poder público que atrapalha o setor. Sobretudo o entendimento do que é um Espaço Sagrado e a infraestrutura que exige. E é por essa razão que o ele criou a Associação Brasileira de Turismo Religioso, juntamente com Amadeu Castanho e outras referências no Turismo Religioso do Brasil, entre os quais a Professora Dra. Marlene Huebes e o Professor Dr. Josimar Azevedo, responsável pelo Caminho Religioso da Estrada Real.

Sidnésio é especialista em turismo religioso, membro da Comissão de Diálogo Ecumênico e Inter-religioso da Arquidiocese de Natal, coordenador da Pastoral do Turismo na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, idealizador do Caminho dos Santos Mártires, roteiro que une 9 destinos no RN com aproximadamente 200km, e CEO da MS Consultoria em Turismo

Veja o diagnóstico do vice-presidente da Associação Brasileira de Turismo Religioso para o segmento em nosso país.

1. Há quanto tempo e por que você decidiu trabalhar com turismo religioso?

Eu prefiro falar de quando o meu foco se tornou total no turismo religioso. Isso se deu em 2014. A minha decisão em atuar no segmento se deu pelo amor ao turismo e, em segundo lugar, por ser católico atuante e ter visto, e continuar vendo, muitos erros referentes a definição do que é Turismo Religioso.

Entre 2014 e 2015, o Ministério do Turismo divulgou uma estatística referente às viagens religiosas, que alcançariam um público no Brasil de 17,7 milhões de pessoas, com um impacto econômico de 15 bilhões de reais, abrangendo 344 destinos e 96 atrações. Esses números já partiam de um equívoco: em 2005, quando o Mtur informava que o Brasil alcançava 8 milhões de pessoas no turismo religioso, apenas o Santuário de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, em Aparecida (SP), já recebia 8.005.000 peregrinos.

Na pesquisa de 2014, o Santuário de Nossa Senhora da Conceição Aparecida (SP) registrava 12.112.583 peregrinos; o Divino Pai Eterno, em Trindade (GO), atingia 4.000.000; o Círio de Nazaré em Belém (PA) atingia 2.400.000 e o Santuário de Santa Paulina, em Nova Trento (SC), 840.000 peregrinos. É só fazer o cálculo e perceber que apenas quatro destinos do Turismo Religioso no Brasil ultrapassam as informações divulgadas pelo Mtur.  Essa pesquisa fora realizada na época por mim e o jornalista Amadeu Castanho, da revista eletrônica Viagens de Fé. Isso me preocupou e me fez ter uma atenção maior em buscar orientar as pessoas sobre o Turismo Religioso, e com as estatísticas, que muitas vezes podem ser falhas.

2. ⁠Qual o potencial segmento no Brasil?

O principal potencial do Turismo Religioso no Brasil e referência é a Basílica de Nossa Senhora Conceição Aparecida em Aparecidaque todos os anos recebe milhões de peregrinos vindos de toda a parte do Brasil.

3. ⁠Onde estão as maiores dificuldades do setor?

A maior dificuldade do Turismo Religioso é o foco, o Espaço Sagrado, enquanto estrutura física. O Turismo Religioso hoje está voltado na construção de grandes imagens, fugindo do ponto principal que é o Espaço Sagrado. Esse deve ser bem-preparado para acolher o turista, principalmente no treinamento de quem irá receber estas pessoas, iniciando pelo sacerdote, os religiosos, de maneira geral, e as diferentes lideranças, além dos demais agentes envolvidos. E quando falo de Espaços Sagrados não me refiro apenas ao Catolicismo, que ainda é o incentivador e motivador do Turismo Religioso, mas me refiro a todas as religiões que possuem potencial para o Turismo Religioso.

4. ⁠Que destinos nacionais são benchmarking?

No Brasil vale apena realizar uma visita técnica a Basílica de Nossa Senhora da Conceição Aparecida em Aparecida (SP), ao Santuário de Santa Paulina em Nova Trento (SC), ao Divino Pai Eterno em Trindade (GO), a Canção Nova (SP), e ao Santuário de Irmã Dulce em Salvador (BA). São espaços que estão preparados não apenas para um momento de devoção através do ato da fé, mas sobretudo criaram atrativos para que o peregrino fique mais tempo, visitando lojinhas onde podem ser comprados souvenires do santo de devoção no lugar visitado.

5. ⁠Que experiência religiosa vale a pena viver no Brasil?

Sem dúvida nenhuma, a Basílica de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, em Aparecida. É impressionante presenciar a fé das pessoas que vão ali. Muitos saem a pé de outras cidades ou Estados, pagando promessa. Presenciei idosos, jovens e adultos, caminhando de joelhos até a Basílica, em um ato de fé, que nos faz questionar e analisar a nossa própria vida e nossa fé diante de Deus. E através dos seus testemunhos, fazem com que cada um de nós possamos voltar a nossa intimidade e amor a Virgem Maria.

6. ⁠Quais destinos que você acredita que podem se desenvolver?

Não sei se posso dizer se desenvolver, mas que já estão em passos de desenvolvimento:

Santa Cruz (RN), com a Imagem de Santa Rita, que tem cada vez sendo referência em Turismo Religioso no Estado; as cidades de Juazeiro do Norte e Canindé no Ceará. Para mim o Nordeste hoje é o maior celeiro de devoção e romarias do Brasil, embora falte capacitação e um cuidado maior com a infraestrutura turística dos destinos espirituais. Estados como Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Ceará e Rio Grande do Norte vêm despontando no Turismo Religioso, mas é necessárias mais capacitações, principalmente no que se refere as agências e Operadoras de Turismo que colocam em seus portfolios o turismo religioso, mas não entendem nada do assunto. Lembro de uma fala do Cardeal Vèglio, na Revista Povos em Movimentos nº 21: Para isso, pedimos uma sensibilidade especial por parte do mundo civilizado e de negócios, que reconhece e respeita a dimensão espiritual, a “viagem interior”

Com isto a maior dificuldade está o entendimento e o respeito por esta dimensão espiritual!

7. ⁠Como fazer o segmento crescer no Brasil?

Hoje o primeiro passo já foi dado, a criação da Associação!

Agora precisamos avançar para que os eventos, feiras, simpósios, congressos e seminários voltados ao turismo no Brasil possam dar um espaço para o Turismo Religioso. Principalmente no que se refere a orientação e palestras.

Eu sempre falo que quem faz turismo de sol e praia, ou turismo de aventura, não faz turismo religioso. Mas quem faz turismo religioso pode fazer sol e praia, aventura, lazer, ecológico… O turismo religioso tem a possibilidade de se unir a variedade de segmentos do turismo gerando um forte impacto econômico no destino.

8. ⁠Qual seu trabalho em nível associativo?

Atualmente, eu estou vice-presidente da Associação Brasileira de Turismo Religioso – ABTUR. A Associação teve como iniciativa um grupo que eu e o jornalista Amadeu Castanhos criamos no WhatsApp no ano de 2014. Em 2022 nós a tiramos do papel e demos início a fundação da Associação, onde temos por Presidente o Eluisio Antônio Voltoline. A sede da Associação está em Nova Trento, em uma sala cedida para nós no Complexo Religioso do Santuário de Santa Paulina, mas também em nosso estatuto reza que a sede da Associação acompanha o local de residência do Presidente.

o arauto do turismo religioso

Quando iniciei minha carreira, em uma pequena publicação de moda, eu tinha como referência profissional o jornalista português, radicado no Brasil, Fernando de Barros. Ele fora editor de moda de grandes publicações, como a revista Playboy e VIP, embora o que mais chamasse a atenção naquele mundo de egos inflados, tendências e – paradoxalmente- pouca elegância era seu visual impecável e o comportamento que esbanjava gentileza, discrição e erudição.

Fernando era unanimidade. Do escritor Ignácio Loyola Brandão a Costanza Pascolato, passando por Gloria Kalil, todos reconheciam nele a personificação do adjetivo gentleman. Curiosamente, sempre que encontro Amadeo Castanho nos eventos de turismo, Fernando me vem à memória. Talvez pela serenidade na fala, o respeito irrestrito às normas de etiqueta, assim como a generosidade em compartilhar conhecimentos que ambos sempre externaram.

Amadeo é hoje editor da revista eletrônica Viagens de Fé e tem cursos de especialização em Hotelaria, Marketing e Publicidade, entre outros, atuando como consultor nesses três segmentos.

O jornalista Amadeo Castanho passou por algumas das mais importantes instituições católicas do país.

Foi gerente de Marketing na Fundação João Paulo II (Canção Nova), consultor da Associação do Senhor Jesus (TV Século XXI) e trabalhou na Pastoral da Comunicação (PASCOM) da Arquidiocese de São Paulo e no Ministério de Comunicação da Renovação Carismática Católica de São Paulo.

Nesta conversa, ele apresenta um pouco sua visão dessa indústria, sempre em crescimento.


Como você começou a trabalhar com turismo religioso?

Cheguei ao turismo religioso em função da minha atuação na área de Comunicação de movimentos religiosos, do meu trabalho no segmento de Marketing e do meu grande interesse pelo turismo. Observei que havia uma oportunidade de mercado, já que que ninguém escrevia sobre turismo religioso e passei a estudar o assunto. A publicação das matérias e os convites para inúmeras palestras foram só consequência.

Como você enxerga o turismo religioso hoje no mundo? E no Brasil?

Esse segmento é considerado – merecidamente – um dos que mais crescem no mundo todo por diversas razões. Com a vida moderna e suas pressões e efeitos negativos, o homem acabou valorizando a importância do sagrado, ainda que, paradoxalmente, tenha se distanciado das práticas religiosas regulares. A prática do turismo religioso é uma maneira de se aproximar de Deus e de compensar de alguma forma esse afastamento. A isso se somam outros fatores, como, por exemplo, a maior divulgação dos atrativos do turismo religioso, a universalização do acesso à informação graças aos meios de comunicação e à Internet; o aumento da disponibilidade de renda discricionária para viagens, e o crescimento do interesse em viajar e conhecer novos destinos. Ao mesmo tempo, muitos templos e destinos turisticos passaram a entender, se capacitar e aproveitar os benefícios gerados pelos visitantes interessados em visitar igrejas, capelas, museus e outros atrativos de turismo religioso. Esses e outros fatores tem feito o turismo religioso crescer no mundo inteiro e no Brasil não é diferente. Aqui, no entanto, uma visão distorcida afasta muitas operadoras e agências desse segmento: acreditam que turismo religioso é levar grupos para Aparecida, enfrentando a concorrência de organizadores de excursões e , paroquias e até motoristas de ônibus legais ou ilegais. Só que, embora Aparecida seja o nosso destino de turismo religioso mais conhecido e procurado, temos uma vasta oferta de outros destinos para explorar. E mesmo Aparecida ainda oferece muitas oportunidades, como, por exemplo, a inclusão de outros destinos de turismo religioso proximos (Guaratinguetá, Lorena, Cachoeira Paulista) ou a extensão a destinos como Campos do Jordão e as praias do Litoral Norte Paulista, que são muito procurados por peregrinos de outros estados.

Que destino serve de referência?

No Brasil, com certeza é Aparecida, graças à estrutura montada pelo Santuário Nacional para receber e reter os visitantes. No Exterior, os grandes santuários marianos são referência como foco na espiritualidade, deixando infraestrutura e exploração comercial essencialmente a cargo do poder publico e da iniciativa privada.

Em quais destinos você mais aposta?

Gosto muito de destinos de grandes festas religiosas, como Belém e Trindade; de destinos muito estruturados para acolher e explorar o turismo religioso, como Salvador, nas cidades históricas de Minas Gerais (apesar de o turismo religioso ainda ser praticamente ignorado por lá) e em destinos ainda pouco explorados no segmento, como o interior do Paraná ou a Serra Gaúcha, onde está sendo estruturada a interessantíssima Rota dos Capitéis. No Exterior, em cidades ainda pouco exploradas como Chartres, na França; na incrível oferta da Itália e nos grandes Santuários Marianos.

Qual destino marcou sua trajetória?

Em termos de trabalho, sem dúvidas, Aparecida e a Canção Nova, em Cachoeira Paulista. Em termos espirituais, com certeza o Santuário de Lourdes, na França. Visitar Lourdes não é fazer turismo, é ter uma conexão espiritual. É uma pena que um destino tão impactante mereça tão pouco tempo nos roteiros oferecidos pelas operadoras.

Ator em Nova Jerusalém

Pernambuco: alta estação para religiosos

A Paixão de Cristo de Nova Jerusalém é atração para o público de todas as idades com a presença em cena de artistas globais, um visual deslumbrante, recheado de efeitos especiais. O espetáculo conta parte da história de Jesus em uma cidade-teatro com nove palcos-plateia localizada no município do Brejo da Madre de Deus, agreste de Pernambuco, a 180 km do Recife.

Realizada desde 1968, o maior teatro a céu aberto do mundo, atrai, durante a Semana Santa, cerca de 70 mil pessoas do mundo todo .

A apresentação tem início com a cena do sermão da Montanha e termina com a ascensão do Cristo aos céus.

Dezenas de personagens alternam cerca 2 mil figurinos produzidos pelas mãos das costureiras da localidade conhecida como Fazenda Nova, distrito do Brejo da Madre de Deus, sob o olhar meticuloso da arquiteta e figurinista Marina Pacheco, que coordena o desenvolvimento das peças que é produzido com base em extensa pesquisa sobre os trajes usados nos tempos de Jesus.

Nos palcos, a história é vivida por 50 artistas pernambucanos de grande talento, além de cerca de 400 figurantes e também por atores e atrizes da cena nacional que são convidados para participar do espetáculo todos os anos. Nos últimos 25 anos, cerca de 120 artistas renomados do teatro, cinema e TV do Brasil emprestaram seus talentos para abrilhantar a Paixão de Cristo.

Em 2024, a Paixão de Cristo contará com a participação especial dos artistas convidados Allan Souza Lima, no papel de Jesus; Mayana Neiva, fazendo Maria e Dalton Vigh, interpretando o governador romano Pôncio Pilatos. A direção artística é de Lúcio Lombardi e do assistente especial de direção Alberto Brigadeiro. Nos bastidores, a Paixão agrega cerca de 600 profissionais incluindo técnicos, eletricistas, sonoplastas, contrarregras, maquiadores, cabeleireiros, camareiras, entre outros. A coordenação geral de toda essa equipe é de Robinson Pacheco, presidente da Sociedade Teatral de Fazenda Nova.

A temporada 2024 da Paixão de Cristo será realizada de 23 à 30 de março. Os ingressos já po- dem ser adquiridos antecipadamente com desconto no site oficial www.novajerusalem.com.br.

A cidade teatro de Nova Jerusalém, que tem título de patrimônio Cultural Imaterial de Pernambuco e do Brasil, é uma verdadeira obra prima inspirada na arquitetura judaica e romana da época de Jesus, que levou 40 anos para ficar pronta.

Inaugurado em 1968, esse monumento foi idealizado e construído por Plínio Pacheco numa área de 100 mil metros quadrados. A magnífica cidade-teatro é cercada por muralhas de pedra granítica de três metros de altura e conta em seu perímetro com 70 torres de sete metros. Em seu interior, nove palcos-plateia reproduzem cenários naturais, arruados, lagos, jardins e palácios, além do Templo de Jerusalém.

Já na sua inauguração, essa obra fascinou os seus contemporâneos graças à riqueza, ecletismo e ou- sadia de seu plano arquitetônico e decorativo. Para realizá-la, Plínio cercou-se dos melhores artesãos e escultores de sua época. Essa obra prima logo se tornou o mais grandioso dos teatros à céu aberto do mundo e, de tão magnífica, conquista, até hoje, o coração de todos os amantes da arte que a conhecem e vivem em seus espetáculos inigualáveis emoções.

No interior da Nova Jerusalém, funciona o ano todo a Pousada da Paixão. Trata- se de um local diferenciado que tem como pontos de destaque sua programação temática e cultural, além de uma arquitetura diferenciada que remete a antiga Jerusalém de 2 mil anos atrás.

Na semana do espetáculo são oferecidos os jantares temáticos realizados no cenário da Santa Ceia. Trajando figurinos da Roma antiga em um ambiente realista, os hóspedes experimentam uma viajem no tempo e sentem-se como se fossem habitantes da Jerusalém do passado.

Outra atração que turistas não devem deixar de visitar é o Espaço Cultural Plínio e Diva Pacheco, que apresenta um rico acervo de fotos históricas, documentos e objetos pessoais dos idealizadores e construtores da Nova Jerusalém. A mostra conta a surpreendente história da saga das famílias Mendonça e Pacheco que teve início em 1951 quando as apresentações da Paixão de Cristo começaram a ser encenadas nas ruas da pequena vila de Fazenda Nova, distrito do município do Brejo da Madre de Deus (PE).

O Brejo da Madre Deus, município onde está localizada a Nova Jerusalém, também oferece atrações imperdíveis para o visitante, a começar pelo impressionante Parque das Esculturas Monumentais Nilo Coelho, que fica a apenas 2 km da cidade-teatro. Nele, esculturas gigantes em monobloco graníticos- de figuras folclóricas da história e da cultura do homem nordestino estão espalhadas por uma área deslumbrante circundada pela exuberante vegetação da caatinga e impactantes formações rochosas.

Também não se deve hesitar em dar uma esticada até a sede no município para conhecer a autenticidade do Brejo da Madre de Deus marcada pelos centenários casarios de azulejos portugueses. Também não se deve perder a oportunidade de um passeio a pé pelas trilhas da Fazenda Encantado- para conhecer a maior reserva da mata atlântica do interior do Estado e experimentar o conforto de um microclima no qual a temperatura máxima não passa dos 22 graus.

Sainte Baume, gruta de Maria Madalena

Maria Madalena : a Nova (?) santiago de Compostela?

No último dia 23 de setembro, o Papa Francisco visitou Marselha, capital da Provence, marcando a primeira visita papal à região em mais de 500 anos. A escolha de Marselha como destino papal tem múltiplos objetivos, incluindo a união dos povos do Mediterrâneo e a recuperação da fé católica na Europa, onde o número de pessoas sem religião está em crescimento.

A visita do sumo pontífice também teve outros objetivos, entre eles, promover o papel das mulheres na igreja, com a valorização do culto a Maria Madalena em 2016, ao indicar 22 de julho, data da apóstola dos apóstolos, como data essencial no calendário litúrgico da Igreja Católica e reafirmado com sua benção sobre a rota histórica da santa, que recebeu investimentos importantes do governo francês nos últimos anos.

Papa Francisco tem se preocupado em resgatar a história do Cristianismo primitivo, isto é, a vida dos cristãos nos dois primeiros séculos da era comum. Dizem as lendas que os primeiros cristãos a chegar na Europa e começar um trabalho intenso de evangelização foram Madalena, Marta, Lázaro, Sara Kali, Maria Jacó e Maria Salomé (tias de Cristo e irmãs de Maria de Nazaré). Isso porque Marselha é um importante porto no Mediterrâneo, há 2600 anos.

A rota de Maria Madalena, semelhante à rota de Santiago de Compostela, emergiu como a nova estrela do turismo francês, embora no passado, principalmente na Idade Média, era um dos caminhos mais importantes para a Cristandade. Não só para se ver os restos mortais daquela que São Tomás de Aquino e Papa Bento XVI afirmaram ser a apóstola dos apóstolos, mas também por conta dos sítios arqueológicos, como uma imensa piscina para batismos coletivos.

Compostela ganhou notoriedade na contemporaneidade graças a Paulo Coelho no final do século passado. Fora o destino de Tiago, outro discípulo de Cristo. Mas até a publicação do livro “Diário de um Mago”, a rota de Maria de Madalena, até então, era a mais importante.

O percurso começa em Saintes Maries de la Mer, uma cidade litorânea encantadora que inspirou obras de Van Gogh, santuário dos ciganos de todo o mundo, principalmente entre 24 e 26 de maio. Os peregrinos seguem, então, para Martigues, passando por paisagens deslumbrantes, restaurantes peculiares e construções medievais muito bem preservadas.

Em Marselha, eleita capital cultural da Europa em 2013, é possível visitar pontos de interesse entre eles a gruta Cosquer- para apaixonados por arqueologia e história; o MUCEM- a plataforma cultural mais importante do sul da França e maior museu dos povos mediterrâneos; a Basílica de Notre Dame de la Garde e a abadia de São Vitor, essas duas últimas igrejas com fortes conexões históricas e relíquias ligadas a Maria Madalena.

A jornada continua para Saint-Maximin-La Sainte Baume, onde a Basílica de Maria Madalena exibe seu crânio em um altar e também as relíquias de Sidônio ( o cego curado por Cristo) e São Maximiliano. Imponente, é uma obra arquitetônica que causa admiração e emoção.

A região não atrai apenas católicos, mas também entusiastas da história, sendo atualmente um destino também para mulheres que fazem parte de um movimento que resgata o “Sagrado Feminino”. Comparado a Santiago de Compostela, esse destino também atrai aqueles em busca de turismo espiritual, focado em autoconhecimento e autodesenvolvimento, mas que não dispensam uma boa comida e paisagens notáveis.

A rota pode se tornar tão ou mais importante que o destino espanhol, atraindo diversos públicos, desde católicos devotos a pesquisadores universitários. A região da Provence, com sua rica história e paisagens deslumbrantes, pode se consolidar como um destino turístico espiritual nos próximos anos. O Sul da França é conhecido pela história como palco de grandes acontecimentos envolvendo religião. Avignon foi sede papal por mais de cem anos. Nostradamus nasceu naquela região. Uma série de movimentos – cátaros e templários- têm sua história conectada ao mediterrâneo francês, assim como escolas iniciáticas de magia, tradições ocultistas e seitas esotéricas lá surgiram.

Os viajantes não precisam fazer a rota a pé. Embora haja milhares de pessoas que o façam. Muitos são associados de uma organização chamada “Caminhos das Santas e Santos Provençais“. Esses peregrinos não pagam por hospedagem. São acolhidos por devotos dos santos da região. Aliás , não faltam entusiastas dessa jornada. Há também a associação de apoio ao santos provençais e a associação para o desenvolvimento de Sainte-Baume.

Essas entidades foram criadas após o filme Código da Vinci, baseado no livro homônimo de Dan Brown. A obra, como bem especifica o autor, é uma ficção. Mas muita gente não entendeu isso. Surgiram muitas teorias de conspiração e lendas urbanas. É preciso lembrar que os restos de Maria Madalena sempre estiveram na região. Nunca foram parar na Grã-Bretanha, uma vez que a santa nunca botou os pés na Bretanha, e tampouco seus restos mortais nunca estiveram no subsolo do Louvre, guardados por uma ordem secreta. Do mesmo modo que não há nenhum registro histórico que justifique a ideia de uma ligação romântica entre Cristo e sua discípula. Nem mesmo os evangelhos apócrifos, incluindo aquele atribuído à própria Maria Madalena, trazem qualquer vaga menção a um relacionamento amoroso entre ambos.

A bem da verdade, Maria Madalena sempre foi um personagem envolto em fake news. A história de que ela fora uma prostituta não encontra respaldo em nenhum dos evangelhos. Atribui-se a ela também o papel de pecadora que lava os pés de Cristo com seus cabelos e óleos perfumados. Outra informação sem fundamento. Encontramos no Novo testamento, 14 menções a Madalena. Nenhuma delas indica nenhum pecado a ela. Fala-se que Cristo expulsou 7 demônios dela e, a partir daí, essa mulher rica tornou-se sua seguidora.

O papa Gregório Magno foi quem , no séc. VI, criou confusão ao dizer que a mulher que fora salva por Cristo do apedrejamento e Maria de Bethânia fossem também Maria Madalena. A Igreja Ortodoxa nunca aceitou tal ideia. E hoje, busca-se acertar as narrativas também na Igreja Romana.

Fazer essa rota é uma oportunidade de entender melhor as estórias acerca de Maria Madalena, que tem uma igreja belíssima em sua homenagem em Paris, vivenciar o melhor da Provence, seja na gastronomia, seja no estilo de vida. É também uma viagem com forte apelo histórico e artístico.

O Caminho de Maria Madalena pode ser um momento de reencontro espiritual, sem ser religioso. Esses caminhos sempre trazem muita reflexão e reconexão com nossa história e a história da humanidade. Nos conduzem a um mergulho em nossos próprios valores. Maria Madalena é, sem dúvida, um símbolo de lealdade e coragem. De renascimento e amor. Tudo o que as pessoas mais precisam encontrar nos dias de hoje.

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Caminho de peregrino – documentário

Para o peregrino e produtor de conteúdo no YouTube “Vida de Mochila’, Richard Oliveira, a peregrinação foi uma forma de estar sozinho sem internet, esvaziar a mente para diminuir a ansiedade do dia a dia. “ No meu caso, a peregrinação foi a alternativa que deu certo, e planejo continuar buscando esses momentos para me conhecer melhor e para aumentar a minha felicidade pessoal”, aborda o mochileiro.

O estudo feito pela Universidade de Essex, no Reino Unido, aponta que caminhar em meio a natureza pode melhorar significativamente a saúde mental, trazendo benefícios para o humor e a autoestima. Essa atividade estimula a liberação da endorfina, conhecida popularmente como hormônio da felicidade, auxiliando no combate da ansiedade e estresse, permitindo um momento reflexivo, incentivando a autopercepção.   Uma possível explicação para o aumento na percepção da solidão recai sobre o uso excessivo da internet, em que muitos deixam de se conectar com o que está a sua volta para dar atenção ao online.

Um levantamento da empresa NordVPN, empresa de tecnologia virtual, aponta que os brasileiros passam mais de 41 anos na Internet, ou seja, 54% do tempo de vida médio da população. Portanto, caminhar em meio a natureza pode ser uma forma de as pessoas se reconectarem com elas mesmas e viverem em solitude.  

Frequentemente relacionada a uma jornada de cunho religioso, seja por devoção ou por promessa, a peregrinação consiste no ato de percorrer uma rota previamente estabelecida, a pé, cujo propósito é buscar um maior entendimento de si e a possibilidade de redenção.   O percurso brasileiro mais famoso é o Caminho da Fé, cujo destino é a Basílica de Nossa Senhora de Aparecida, na cidade de Aparecida, em São Paulo. Estima-se que cerca de 80 mil pessoas já o fizeram, a pé ou de bicicleta. Em 2022, segundo a Associação do Caminho da Fé, estima-se que pelo menos 20.240 viajantes realizaram o percurso.

Entretanto, existem outros caminhos tão famosos quanto, como a Estrada Real, retratado no documentário “Um mochileiro no caminho dos diamantes, Estrada Real” disponível no canal do Vida de Mochila, no YouTube. Refletindo sobre a vida, a morte, família, amigos, solidão e solitude, Richard Oliveira retrata os 32 dias de viagem, sendo 25 deles caminhando e 7 de folga, percorrendo o Caminho dos Diamantes e o de Sabarabuçu, situados na Estrada Real, totalizando 540 km viajados.  

A Estrada Real é uma antiga rede de rotas de transporte terrestre de recursos naturais preciosos, como ouro e diamante, estabelecida no Brasil Imperial. A Estrada é um patrimônio cultural e turístico importante, constituída por 4 caminhos: o Velho — que parte de Ouro Preto, Minas Gerais, até Paraty, Rio de Janeiro; o Novo — com destino à capital carioca; o de Diamantes — de Ouro Preto às Diamantinas, ambas cidades mineiras, e o de Sabarabuçu — de Cocaisà Glaura, passando também na Serra da Piedade (antigo Pico de Sabarabuçu); as duas últimas apresentadas no documentário.  

Com as bençãos de alah

Turismo Halal: Embratur e Câmara de Comércio Árabe-Brasileira se reúnem para ampliar negócios no setor

Como a gente vem falando há tempos, o turismo espiritual vai muito além das peregrinações em destinos católicos ou visitas a Terra Santa. Há congressos, seminários, cursos e também, quem diria, acolhimento especial na hotelaria seguindo as necessidades religiosas de muitos turistas. Nos anos 2000, quando eu era gerente de marketing no Sofitel, criei um serviço especial para os muçulmanos que me rendeu até a capa no Valor Econômico.

Atualmente o hotel Jequitimar privatiza o hotel uma vez ao ano para grupos de judeus ortodoxos. E não é o único. Há empreendimentos espalhados pelo Brasil que também fecham finais de semana para grupos iogues veganos. Nada de couro, carne, laticínios, ovos. Nada, mesmo, de origem animal. Nem seda. É preciso uma expertise operacional para que dê tudo certo. Porque algumas expressões de fé costumam ser rigorosas, uma vez que interditos desrespeitados podem gerar graves problemas para adeptos de uma crença.

Recentemente o presidente da Embratur, Marcelo Freixo, e o CEO e secretário-geral da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, Tamer Mansour, se reuniram para ampliar parcerias voltadas ao turismo halal.

Essa categoria abrange destinos turísticos preparados para receber o viajante muçulmano, respeitando as regras e os costumes da população islâmica. É um segmento que leva em consideração questões como os horários para reza, higiene que deve ser feita antes dela, a necessidade de estar direcionado para Meca ao orar, o jejum durante o Ramadã, entre outras. Na época do Sofitel, os clientes recebiam no quarto um cesto com minitapete, bússola, água de rosas e chá.

Para o presidente da Agência, Marcelo Freixo, o turismo halal é um dos mais promissores do mundo. “Com a parceria, queremos aproximar mais o mundo árabe para investimentos no setor turístico, como hotéis e aviação. E, consequentemente, aumentar o número de turistas daquela região, que representa cerca de 72 milhões de turistas do mundo. Temos grande interesse nesse mercado, pois é uma grande oportunidade para empresas de turismo brasileiras”, comentou Freixo.

O CEO e Secretário Geral da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, Tamer Mansour, acredita que a união de esforços dos dois países irá gerar bons frutos para as duas culturas. “Temos a honra de estabelecer uma parceria tão promissora. Tenho certeza de que, com a Embratur, teremos uma parceria muito ampliada na promoção de destinos”, finalizou.

Se esse mercado interessa, atenção: nos dias 23 e 24 de outubro, será realizado o “Global Halal Brazil Business Forum, que reunirá especialistas e players do mercado halal do Brasil e do mundo no WTC Events Center, na capital paulista. Hoteleiros, o mercado muçulmano é bem grande e fiel. Que tal iniciativa possa trazer mais turistas para o Brasil. Insh’Allah.

Uma malásia espiritual

A Malásia é rica por sua história cultural, belos marcos históricos e estilo de vida local hipnotizante que atrai muitos visitantes. Cerca de 63,5% da população pratica o Islã; 18,7%, budismo; 9,1%, o cristianismo; 6,1%, hinduísmo e o restante incluem animistas, taoístas, sikhs e testemunhas de Jeová. Recentemente o Turismo da Malásia, através da Raidho, organizou um encontro para apresentar as novidades.

Falou-se muito do turismo de aventura, das experiências de luxo e dos resorts incríveis. Para nós, com exclusividade, o vice-presidente para as Américas da entidade, Irni Nor, explicou a oferta espiritual. O país é um exemplo de respeito às diferenças de crença e uma vitrine das práticas espiritualistas da Ásia.

Qual é a oferta de turismo espiritual da Malásia?

Com um fundo multicultural, a Malásia abraçou sua diversidade de religiões, crenças, celebrações e locais de culto, apresentando o muçulmano, hindu, cristão, sikh e budista como os principais destinos de “turismo espiritual” do país.  Embora a religião oficial na Malásia seja o Islã, outras religiões também são praticadas e, assim, abraçamos harmoniosamente as festas e celebrações uns dos outros.

Existem eventos religiosos importantes?

Sim… Temos um grande número de eventos religiosos na Malásia. Para os muçulmanos há dois grandes festivais: Hari Raya Aidilfitri e Hari Raya Aidil Adha.  O Hari Raya Aidil Fitri marca o fim do Ramadã, o mês de jejum,. enquanto o Hari Raya Aidil Adha, celebrado no 10º dia de Zulhijjah, marca a conclusão da peregrinação anual a Meca. Além dos principais festivais acima, os muçulmanos da Malásia também celebram Maal Hijrah (Ano Novo Islâmico) e Maulidur Rasul (Aniversário do Profeta Maomé PBUH).

Já a comunidade chinesa na Malásia celebra o Ano Novo Chinês no primeiro dia do calendário lunar chinês em janeiro ou fevereiro de cada ano. Outro festival importante é o Wesak Day.

Os devotos hindus celebram Deepavali, ou o Festival das Luzes, em maio e Thaipusam em janeiro.

Quais são os principais templos para se visitar?

Existem inúmeros locais de culto na Malásia. As Cavernas de Batu, em Selangor, e o Templo Sri Mahariamman, em  Kuala Lumpur, são importantíssimos para os hindus. Os muçulmanos encontram mesquitas de rara beleza como a de Jamek e a Mesquita Nacional, em Kuala Lumpur; a Mesquita do Sultão Salahuddin Abdul Aziz Shah, em Selangor e a Mesquita de Putra, em Putrajaya.

Lindos também são os templos chineses Thean Hou, na capital, e o Kek Lok Si, em Penang. A Catedral de Santa Maria Kuala Lumpur é a principal para os cristãos. Não podemos deixar de mencionar o  Templo Gurdwara Tatt Khalsa, local de devoção sihk.

Há festivais religiosos?

Sim. As celebrações mais alegres são realizadas após o mês de jejum do Ramadã. Este é o momento em que as pessoas que trabalham nas grandes cidades e vilas fogem para os seus “kampungs” ou aldeias. Orações especiais são realizadas nas mesquitas, e tempo para pedir perdão à família e amigos. Durante esta celebração de um mês, haverá muitas visitas domiciliares e festas. Os malaios têm uma tradição maravilhosa conhecida como “casa aberta”, que é uma exibição calorosa da hospitalidade malaia. Amigos e familiares se reúnem e celebram a culinária tradicional e biscoitos especiais são servidos durante esta ocasião especial.

Há o Hari Raya Haji, outra importante celebração religiosa para os muçulmanos na Malásia. Marca o fim da peregrinação anual, ou Haj em Meca, um dos Cinco Pilares do Islã, que todos os muçulmanos capazes são obrigados a realizar pelo menos uma vez na vida. Neste dia, muçulmanos de todo o mundo são encorajados a abater gado, ovelhas ou cabras como um sinal de sacrifício – símbolo de sacrifícios maiores que eles são convidados a fazer para defender a pureza da religião.

O aniversário do profeta Maomé, ou Maulidur Rasul, é um evento significativo no 12º dia do terceiro mês do calendário islâmico (lunar), marcado por procissões para demonstrar a unidade dos crentes em alguns Estados. Orações, sermões e discussões religiosas são realizadas durante este tempo para fortalecer o muçulmano fé e espírito da comunidade.

Já o Thaipusam é um festival hindu anual, que cai no final de janeiro ou fevereiro. É uma celebração do aniversário do Senhor Subramaniam. Na véspera de Thaipusam, uma estátua do Senhor Subramaniam é levada em procissão em uma carruagem puxada por bollocks. No dia seguinte, os devotos carregam kavadis (um arco de metal ou madeira com decorações elaboradas, que é colocado nos ombros dos devotos. Ganchos ou espinhos se estendem do kavadi a várias partes do corpo do devoto.  O festival é realizado em grande escala em Selangor e Penang.

Os budistas observam Wesak para comemorar o nascimento, a iluminação e a morte de Buda, todos os quais ocorreram na mesma data lunar no cálculo budista. É observado anualmente no domingo mais próximo da lua cheia em maio. Os budistas seguem uma dieta vegetariana para se “limparem” antes da ocasião. Milhares de devotos acorrem aos templos antes do amanhecer para orações, oferendas, meditação, cânticos e doações de caridade. Pombas e jabutis também são soltos em um gesto simbólico de libertação da alma e abandono de pecados passados.

Temos de falar também do  Deepavali /Diwali, também conhecido como Festival das Luzes, representa o triunfo do bem sobre o mal para os hindus. As casas hindus são iluminadas para simbolizar a vitória sobre as trevas. Além disso, pinturas coloridas de arroz conhecidas como ‘Kolam’ são criadas na frente de cada casa para trazer prosperidade e sucesso. Estas ‘pinturas’ são feitas com arroz colorido e decoradas com velas e pequenos candeeiros. É comemorado em outubro ou novembro de cada ano que pode durar cerca de cinco dias. As orações Deepavali são realizadas tanto em casa quanto nos templos na véspera do festival. Antes de ir ao templo, os hindus tradicionais tomam um banho de óleo antes do nascer do sol, rezam em casa e queimam incenso. Uma homenagem aos mais velhos da família é seguida por casas abertas para parentes e amigos, onde uma grande variedade de deliciosas iguarias tradicionais indianas são servidas.

O Vaisakhi é comemorado pelos sikhs em abril. A ordem do dia inclui orações em casa e nos templos, bem como dietas vegetarianas. Gatka (artes marciais sikhs) e Bhangra (uma dança tradicional) são realizadas durante todo o dia em templos e na Associação Sikh.

É importante falar do  Festival Sabah Ka’amatan, localmente conhecido como Tadau Ka’amatan (Festival da Colheita), este festival nativo dos Kadazan-Dusun, o maior grupo étnico do estado de Sabah, Bornéu da Malásia. O festival anual em maio é uma tradição atemporal em homenagem ao Bambaazon, o espírito do arrozal. A comunidade Kadazan-Dusun acredita que o espírito da planta padi é responsável pelo seu crescimento e bem-estar, oferecendo proteção contra perigos naturais e uma colheita abundante para seus alimentos básicos. O festival, realizado no Hongkod Koisaan, sede da Organização Cultural Kadazan-Dusun, apresenta esportes tradicionais como queda de braço, tiro com zarabatana, competições de catapulta e corridas de revezamento. O ritual ‘Magavau’, realizado pelos Bobohizan, é um ritual de limpeza e bênção. Nos últimos anos, o festival da colheita sofreu modificações, incluindo um Concurso de Rainhas da Beleza, onde participam belas donzelas Kadazan. Durante o festival, o tapai, o vinho de arroz local ou cerveja, flui livremente, e o arroz é tratado com respeito e reverência.

Já o Festival Sarawak Gawai é também conhecido como Festival da Colheita no estado de Sarawak. Marca o ápice da celebração da colheita. A data oficial é 1º de junho, mas a celebração dura um mês inteiro, permitindo que o Dayak renove amizades, esqueça preocupações passadas e faça as pazes com velhas brigas. É também uma oportunidade para novas amizades, reuniões familiares e para prestar homenagens aos mais velhos e aos que partiram. O ritual “Miring” envolve Dayaks junto com seus convidados colocando vários alimentos e ‘tuak’ (vinho tinto local) em pratos como oferendas aos deuses. Um poema especial é recitado e um galo é sacrificado.

turquia investe no turismo do Santo que inspirou papai Noel

Localizada em Anatolia, na Turquia, a igreja construída em nome de São Nicolau acaba de passar por uma reforma e já está reaberta para receber seus visitantes. O Bispo Nicolau era conhecido por dividir seus bens com os pobres e se tornou muito conhecido ao deixar presentes escondidos pelas janelas dos moradores de sua cidade, que inspirou a criação de um dos personagens mais famosos do mundo, o papai Noel ou Santa Klaus.

A Igreja de São Nicolau passa a receber seus turistas em 2023 após as obras de restauração e paisagismo, como a  retirada das coberturas antigas e construídas novas coberturas de proteção, conservação e reparação no interior e exterior da igreja, desde as paredes até à cúpula, abóbada e piso. Além do trabalho de documentação e conservação das pinturas murais originais e dos mosaicos do piso, o espaço da galeria no segundo andar também foi incluído no percurso do visitante, além das adaptações internas para os visitantes com dificuldade de mobilidade.

São Nicolau era considerado a segunda maior autoridade do cristianismo de Anatólia e faleceu em 6 de dezembro 365 d.C., data em que se celebra o santo. Após sua morte, o povo da cidade construiu um monumento que depois se tornou uma grande basílica em cujas paredes estão retratados os milagres que se acredita serem realizados por São Nicolau.

A Igreja de São Nicolau, uma das obras essenciais da história da arte bizantina com acréscimos feitos no século 11, está entre os exemplos mais proeminentes do período bizantino.  A igreja, que está na Lista Provisória do Patrimônio Mundial da UNESCO desde 2000, é muito frequentada anualmente por inúmeros turistas locais e estrangeiros. A igreja é essencial não apenas por ser um centro histórico, mas também por ser um centro religioso e no passado era conhecida como um destino dos peregrinos que iam a Jerusalém vindos da rota do Mediterrâneo. Há também um sarcófago romano decorado com escamas de peixe e folhas de acanto, que se acredita ser de Nicolau e já os ossos que se acredita pertencerem a São Nicolau são exibidos no Museu de Anatolia.

Para mais informações sobre o destino, visite o site oficial do Turismo Turquia: Go Türkiye.