COMO TIRAR LEITE DE PEDRA…

Parei para analisar a realidade dos fatos recentes sob um ponto de vista um pouco menos glamouroso, mesmo que um tanto ácido…

Imagine um grande torneio entre diferentes agremiações, que participam com forte estrutura técnica, incluindo preparadores, assessores e estrategistas, todos apoiando os principais competidores. Estes, como grandes atores, se emocionam ao cantar o hino nacional, afirmam lutar para defender o seu país, buscam conquistar a confiança da população e dão mesmo tudo de si, enfrentando a equipe adversária com todas as armas que dispõem. Como todos desejam sair vitoriosos a qualquer custo, nem sempre utilizam recursos lícitos para derrotar o oponente e tentam burlar a vigilância atenta do juiz. No fundo, o que todos esses competidores buscam, a qualquer preço, são os louros da vitória, na forma dos benefícios de quem sagra-se vencedor nesta disputa, cujo principal símbolo é o título que passarão a ostentar por 4 anos, até a próxima edição da competição.

Isso mesmo, estou me referindo às eleições.

Depois do período de redução acentuada nos negócios, provocada pela Copa do Mundo no Brasil, voltaremos os olhos para um novo torneio.

Mesmo diante de um horizonte sombrio para nossa economia, continuo achando que o empreendedorismo brasileiro, como mola propulsora da sociedade, conseguirá tirar leite de pedra neste segundo semestre (que avança rapidamente) de 2014.

Mas sou mesmo um otimista incorrigível.

As empresas voltaram a viajar, acordos voltaram a ser negociados, negócios precisam ser fechados, contratos devem ser assinados, a produção, o trabalho e a economia urgem.

Refiro-me aqui especialmente ao mercado de viagens corporativas, o qual, como previsto e declarado pela Abracorp desde o início do ano, represou os eventos e deslocamentos dos executivos durante a Copa, com consequente incremento neste pós-Copa…, pelo menos até as eleições.

Pois neste curto período entre a Copa e as eleições, o governo despejará dinheiro na economia (através dos mecanismos macroeconômicos de sempre), visando estabelecer um ambiente favorável, mesmo que artificialmente, às intenções de eleição e reeleição dos candidatos do partido da situação.

Lamentável do ponto de vista político, apesar de tratar-se de expediente corriqueiro independentemente do partido, estes 3 meses configuram uma janela de oportunidade comercial, antes dos meses de incerteza que iniciam logo após os resultados serem divulgados.

Só nos resta trabalhar em busca de bons resultados, pelo menos até outubro…

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CONFUSÕES

Não sei aonde vamos chegar, mas os impactos no mercado de viagens e turismo são inevitáveis.

Não dá pra encarar as recentes confusões no mundo, sem analisar suas imediatas consequências sobre o fluxo de passageiros no transporte aéreo comercial.

Numa primeira análise, parecem longe de nós os conflitos na Faixa de Gaza (mais de 500 mortos civis até agora) e a derrubada do avião da Malaysia Airlines (também quase 300 mortos)…

Mas não dá para jogar pra baixo do tapete o fato de que existem armamentos capazes de derrubar um avião a 10.000 pés de altura, em mãos de extremistas, terroristas, milicianos ou ou nome que se queira dar a exércitos paramilitares.

Como se comportará o mercado da aviação quando o passageiro for informado que, conforme informações não oficiais e não confirmadas (ainda), a cia. aérea israelense El Al, prepara-se para equipar todos os seus aviões com sistemas antimísseis?

No vídeo abaixo, o CEO da El Al fala com tranquilidade sobre este sistema antimísseis, já em testes desde 2013:

Como se comportará o passageiro europeu, sabendo que qualquer rota próxima ao leste do continente, carrega um risco potencial de estar ao alcance de baterias antiaéreas sofisticadas, disponíveis a exércitos rebeldes, alimentados por grandes potências militares?

Depois do impacto do 11 de setembro, o mundo foi obrigado (pelos acontecimentos e pelo padrão imposto pelos EUA) a acostumar-se com a paranoia da segurança nos aeroportos.

Será que nos acostumaremos à paranoia da beligerância em pleno voo?

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Obs.: Num cenário desses, a Airbus ainda quer que os passageiros viajem em assentos de bicicleta…!

Airbus - Assento de Bicicleta
Airbus requer patente de assentos similares aos de bicicletas

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POR QUE O GOVERNO QUER EVITAR AS AGÊNCIAS DE VIAGENS?

A iniciativa do Governo Federal de adquirir passagens aéreas diretamente com o prestador do serviço de transporte aéreo encontrará, como está encontrando, justa resistência de todos os tipos, em especial da nossa categoria profissional.

Até aí nenhuma novidade, mas estou certo que o MPOG anteviu esta resistência e, seguramente, preparou-se para defender seu plano de desintermediação.

A questão que coloco aqui é: “Qual o real motivo que levou o governo a querer evitar as agências de viagens?”

Pelas primeiras reações (recursos das associações, comentários postados, comentários não postados etc.), percebi 3 diferentes conjuntos de opiniões:

1 – Alguns acham que o governo deseja criar uma nova estatal.

Minha opinião: acho esta uma conjectura totalmente inverossímel.

2 – Outros acreditam que o governo deseja controlar mais um segmento econômico através da centralização do poder de compra do maior cliente do país, o próprio governo.

Minha opinião: acredito na segunda parte desta hipótese, não na primeira.

3 – E ainda há os que suspeitam que a verdadeira motivação é o interesse em aumentar a eficácia do governo na contratação de passagens aéreas, melhorar o planejamento e a gestão dos deslocamentos de servidores, além de reduzir o custo global das viagens à serviço.

Minha opinião: concordo com esta hipótese, apesar de acreditar que a melhor estratégia para o governo alcançar este objetivo deve envolver, necessariamente, a participação das agências de gestão de viagens corporativas, pelo menos das que atuam de forma séria e profissional (e não é difícil distingui-las).

Mas tenho a minha própria visão a respeito do que levou o governo a promover esta revolução em nosso mercado (com potencial para ampliar-se para os poderes legislativo e judiciário, além das esferas estaduais e municipais) e apresento abaixo, para sua reflexão:

O Edmar escreveu recentemente um post no Blog Espaço Abracorp sobre a omissão da ANAC – Agência Nacional da Aviação Civil – na fiscalização do prazo de pagamento de reembolsos pelas cias. aéreas, realmente uma festa de descaso com a regulação da própria ANAC.

Segundo o portal da própria agência, a ANAC “tem como atribuições regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e de infraestrutura aeronáutica e aeroportuária. Para tal, o órgão deve observar e implementar as orientações, diretrizes e políticas estabelecidas pelo governo federal, adotando as medidas necessárias ao atendimento do interesse público e ao desenvolvimento da aviação”.

Portanto, a ANAC regula (ou seja, estuda, analisa, normatiza) as atividades da aviação comercial, através de instruções, resoluções, portarias (ou seja lá qual for o instrumento), mas tem deixado de fiscalizar o cumprimento de algumas de suas próprias normas.

Senão, vejamos:

A Resolução da ANAC No. 138, de 09/03/2010, publicado no DOU No. 48, S/1, páginas 13 e 14, em 12/03/2010, em seu artigo 8o., alíneas VII, VIII e IX, escreve, textualmente:

“Art. 8o O bilhete de passagem deverá conter, no mínimo, as seguintes informações, independentemente de sua forma de emissão:

VII – valor da tarifa do serviço de transporte aéreo em moeda corrente nacional;

VIII – valores individualizados relativos ao pagamento das taxas governamentais, impostos, tarifas aeroportuárias ou de qualquer outro valor que apresente característica de repasse a entes governamentais;

IX – valor total pago pelo adquirente do bilhete de passagem em moeda corrente nacional;

…”

Esta resolução, cujo objetivo, tão claro quanto seu texto, é dar transparência à comercialização de passagens aéreas, seja da forma direta ou intermediada, simplesmente não vem sendo cumprida pelas cias. aéreas nacionais, com a única exceção da Azul.

Desconheço qualquer medida da ANAC no sentido de fazer valer sua própria resolução, mas conheço o teor do Acórdão do TCU No. 1973/2013, de 31/07/2013, (mais de 3 anos após a Resolução da ANAC No. 138), que em seu item 9.8, determina:

“ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões expostas pelo Relator, em:

​9.8. determinar à Agência Nacional de Aviação Civil, com fundamento no art. 250, inciso II, do RI/TCU, que faça cumprir os artigos 6º e 8º, incisos VII, VIII e IX, da Resolução-ANAC 138/2010, exigindo que as companhias aéreas façam constar de seus cartões de embarque o valor da tarifa paga, conferindo transparência às compras de passagens aéreas para o consumidor final, informado ao Tribunal, no prazo de 90 (noventa) dias, as providências adotadas;

…”

Este Acórdão também foi tema de matéria no Portal Panrotas, sob o título TCU quer tarifa aérea paga no cartão de embarque, publicada em 01/08/2013.

RESUMO DA ÓPERA:

1) A ANAC emite Resolução para que as cias. aéreas publiquem a tarifa e taxas na passagem aérea.

2) As cias. aéreas entendem que já apresentam tarifa e taxas na passagem aérea e, por isso, não se sentem na obrigação de fazê-lo também no cartão de embarque.

3) O TCU publica Acórdão com determinação para que a ANAC exija que as cias. aérea publiquem a tarifa e taxas no cartão de embarque.

4) A ANAC não atende o TCU e as cias. aéreas alegam que o assunto não é com elas, mas um conflito de interpretação entre os dois órgãos públicos

5) Sem a transparência da tarifa e taxas publicadas no cartão de embarque, o “make up” de bilhetes continua disfarçado de “mark up”.

Como algumas agências de viagens ainda utilizam sistemas que permitem a adulteração do valor do bilhete (o valor X obtido da cia. aérea é informado como sendo Y), o consumidor corporativo fica mesmo sem alternativa para defender-se e tende a querer evitar este agenciamento, pois acaba acreditando que todas as agências de viagens fazem isso.

O resultado é que crescem as ameaças à atividade de agenciamento de viagens e o que o governo federal está tentando fazer, nada mais é do que uma forma enviesada de evitar ser ludibriado por maus agentes, aqueles cuja atitude infelizmente acaba nivelando a categoria por baixo.

O triste é que foi o governo federal que assumiu a liderança deste movimento e, ao tentar resolver o problema, optou por retirar o sofá da sala, quando poderia simplesmente substituí-lo por outro.

Resta agora às nossas associações convencer o MPOG:

1) da importância e do valor da consultoria das agências de gestão de viagens corporativas.

2) de que existem outros caminhos legais para resolver o problema do “make up” de bilhetes.

3) de que o melhor para o governo é manter os benefícios da especialização e experiência dos verdadeiros profissionais do setor.

A julgar pelo empenho de nossas lideranças, prefiro acreditar que temos chances de reverter este quadro, em benefício do setor público e da sociedade.

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