Um mal PARA O TRADE pior que o Covid-19

Que ano !! Que fase !! Mais grave é saber que para nosso mercado ainda existe um mal pior que o Covid-19

Podemos reclamar do estrago que o Covid-19 vem fazendo em nosso mercado, afinal, como não reclamar? Porém, esse sentimento esteril está nos fazendo perder um tempo precioso. Não podemos fazer quase nada quanto a esse triste fato. 

No entanto, outro fator ameaça nossa profissão gravemente. Não podemos perder o foco do real perigo, um perigo que já não data de hoje e que pede reações urgentes.

Ouço e leio nas redes sociais casos recorrentes de perda de vendas por parte dos agentes de viagens devido a explosão dos canais de distribuição tradicionais. O fenômeno iniciado com a internet e o desenvolvimento das redes sociais tem causado grandes estragos em nosso mercado. Um fenômeno muito pior que o Covid, para o qual não encontramos remédios e vacinas e que nos ameaça (agentes de viagem) de extinção.

Durante algum tempo o Trade ainda conseguiu marcar pontos neste jogo devido ao financiamento ofertado pelas operadoras. Mas em breve não contaremos também com essa vantagem. Receptivos e hotéis podem dispor da mesma facilidade graças a novas máquinas de crédito que parcelam e cumprem a função.

E agora José?

Os agentes “aproveitaram” do recesso forçado pelo Covid e foram estudar. Foi lindo ver todo mundo se formando e se aprimorando para reforçar suas qualidades de consultores, esperando que o diferencial faça toda a diferença para atrair clientes na hora da retomada. Muitos adotaram igualmente o atendimento remoto, evitando assim a vinda do cliente até a loja e aceitando trabalhar nas horas mais esdruxulas.

Não há dúvida que graças o Covid, os indivíduos se mobilizaram esperando paliar os danos causados pela diversificação de canais de compras de viagens. Mas será que face aos ínumeros blogs, sites, canais Youtube, Facebook, Instagram com informações errôneas e superficiais nossa especialização fará a diferença. Eu pessoalmente não acredito.

Vejo pessoas que passaram 15 dias na França se apresentando como especialistas e muita gente seguindo, satisfeitos com o parco conhecimento e demasiada simpatia. Vejo hotéis oferecendo a tarifa mais baixa possível para o cliente direto. Vejo clientes passando horas na frente de seus computadores, buscando informações de um lado, preços de outro, acreditando em milagres.

E aí mora o perigo! Quais preços encontrarão?

As medidas tomadas pelos indivíduos que foram estudar, se formar, participaram à formações on-line são louváveis, certo, mas não serão suficientes.

O povo unido jamais será vencido.

Um indivíduo pode muito pouco quando se depara com um gigante. Não é a toa que a música de Sérgio Ortega e do grupo Quilapayún* marcou a história! Ela ressalva uma verdade intransigível. Unidos somos mais fortes! Isso não é loucura de esquerdopata, isso é fato! 

Vejo no grupo de agente de viagens do qual faço parte no WhatsApp. Ali, não somos concorrentes, somos colegas e uns ajudam aos outros, facilitando a vida de todo mundo e festejando a venda do outro como se fosse sua. O covid-19 nos uniu, mas precisamos ir mais longe.

Por essa razão convido membros do trade à se unir. As associações são muitas: ABAV Nacional (Associação Brasileira de Agências de Viagens), ABIH (Associação Brasileira da Indústria de Hotéis), ABRACORP (Associação Brasileira de Agências de Viagens Corporativas), AIRTKT (Associação Brasileira dos Consolidadores de Passagens Aéreas e Serviços de Viagens), AVIESP (Associação das Agências de Viagens Independentes do Estado de São Paulo), AVIRRP (Associação das Agências de Viagem de Ribeirão Preto e Região), BRAZTOA (Associação Brasileira de Operadoras de Turismo), CLIA Brasil (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos), FBHA (Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação) e FOHB (Fórum de Operadores Hoteleiros do Brasil).

Essas mesmas entidades se uniram e se dirigiram ao governo em março 2020 para pedir auxílio para o nosso mercado. Mas e entre elas? Quais os objetivos em comum? Como podem se entre-ajudar? Qual o diálogo? Será mesmo que pedir auxílio ao governo basta? Quando entenderão que verdadeiramente unidos seremos mais fortes?

Olhando para o passado para construir o futuro

Você se pergunta: porque estamos falando de politica tarifária em plena crise do Covid-19? Porque eu não estou escrevendo sobre a vacinação iniciada na França? Pois neste momento as empresas estão se reestruturando, se reconstruindo. Senão abordarmos o assunto agora, talvez mais tarde, seja tarde demais.

Voltar a velha estratégia de ética tarifária sim ajudaria muito. O fornecedor deve ter uma tarifa balcão e duas tarifas profissionais ( uma para o agente que tem condições de operar e uma para as grandes operadoras) no mínimo. Dando assim espaço para todos interventores e ganhando de todos os lados. Simples assim!? O que você acha?

Ou será que seguiremos optando por dar tiros uns nos pés dos outros?


Notas *Quilapayún Este grupo mistura instrumentos andinos tradicionais com letras poéticas ou politicamente engajadas em suas canções. Cerca de 35 álbuns foram produzidos e excursionados em mais de 40 países. Em 1972, o grupo foi nomeado embaixador cultural do Chile pelo presidente da república, Salvador Allende. Após a morte de Salvador Allende durante o golpe de Estado do general Pinochet, em 11 de setembro de 1973, a banda, em concerto na França, pediu asilo político. Seus membros viveram na França durante quinze anos. El pueblo unido jamás será vencido se tornou o hino da oposição ao regime.


O cliente, a internet e a razão

O cliente tem sempre razão?

Outro dia um jovem senhor não obteve resposta via messenger quanto ao preço de um serviço e teve a brilhante idéia de declarar em meu Facebook que a empresa onde trabalho é a pior do mundo. Como interlocutora da empresa eu pedi muitas desculpas e expliquei que a mensagem não havia sido vista devido a uma falha humana, escrevi que sentíamos muito sua reação. E neste caso, quando escrevi “reação” eu me referia, sem dar precisões, tanto ao seu sentimento de insatisfação quanto a seu comportamento hostil.

Para quê? Aí a “coisa” ficou pior, o jovem achou que eu estava “respondendo” e como “sabemos” que cliente tem sempre razão, minhas explicações e defesa foram percebidas como uma agressão. Será que ele queria que eu dissesse sim você tem razão? Somos os piores mesmo! E dizer que somos os piores não me machuca o ego, mas seria um desrespeito para com meus colaboradores, atendentes, motoristas, técnicos de operações e pessoas que trabalham (sem falsa modéstia) muito bem. Chamar gente a quem você nunca viu em rede social de “piores do mundo” e colocar em jogo suas vidas ou ganha pão, na minha cartilha, chama-se simplesmente calúnia, aparentemente oriunda de uma maldade egocêntrica. O cliente tem sempre razão, mas esse senhor não era meu cliente, era só alguém impaciente e inconseqüente quanto à vida alheia. Como reagir? Bastante frustrada e confusa quanto a essa experiência, encontrei consolo nas palavras de meu colega francês, turismólogo e especialista em direitos do consumidor, François Teyssier. François não tem piedade deste “novo” consumidor a quem chama de déspota em sua crônica do jornal on-line La Quotidienne du Tourisme.

Gostei de ler e divido com vocês. Vale a pena conhecer sua análise e opinião:

Um cyber viajante um tanto quanto déspota*, não?

Ao longo do tempo, o “neo-consumidor” tornou-se o mestre dos relógios. Ele impõe o ritmo. Ele é um tirano que avalia, julga, puni e às vezes assedia com base em suas experiências de consumo. Não é mais um viajante. Mas, “nuance”, um consumidor de produtos turísticos.

O uso generalizado de smartphones e redes sociais mudou o braço de ferro entre consumidores e profissionais.
O que leva a:

Uma impaciência generalizada
. Agora, tudo deve ser feito na escala dos segundos. Uma demora no site de reservas muitas vezes provoca imediata “zapping” para o site de um concorrente. Um parâmetro técnico a ser sempre monitorado e melhorado.

Um aumento de infidelidade. O cyber consumidor não tem mais medo de mudar de fornecedor. Ele tornou-se oportunista e impulsivo. Referências não existem mais. Isso é um fato que impera regularmente.

Uma total falta de modéstia. Todo cyber viajante que se preze está em constante interação com os “seguidores” de suas redes. Às vezes são alguns milhares. O que cria um sentimento de onipotência, utilizado graças a suas afirmações, instantaneamente com um único clique.

Assim que é infeliz ou insatisfeito com algo, ele diz, mais exatamente, ele compartilha com muitas pessoas a raiva que ele sente. O que dá uma sensação de autoridade absoluta que ele usa e abusa. Certo ou errado, porque vale a pena.

Alguns oportunistas estão no limite da chantagem quando buscam compensação inadequada.

Agentes de viagens devem estar cientes desse fenômeno e não sentir mais empatia equivocada em relação a alguns desses clientes. Claro, o cliente é rei, mas não de tudo e qualquer coisa.

Devemos começar por estar cientes.

François Teyssier