Sempre ouvi, desde que entrei no turismo, no Rio de Janeiro, histórias sobre a Panair do Brasil. Do saudosismo a uma revolta na qual nunca me aprofundei. Cheguei a ir, em uma churrascaria em Laranjeiras, a um encontro de ex-funcionários da companhia aérea, nascida subsidiária da Pan Am e depois nacionalizada.
Mas a Panair, falha minha, ficou somente nessas lembranças. As companhias que davam notícia na época me ocupavam muito mais – Varig, Vasp, Transbrasil, Rio Sul…
Os anos se passaram e veio a decadência da Varig, o drama dos funcionários, o brado de que o Brasil perdia suas embaixadas no Exterior, e uma boa desculpa para o governo justificar a falta de turistas estrangeiros no Brasil.
Mágoa com o governo, escândalo pelo fato de a Gol ter ignorado a tradição da marca Varig (ontem, aliás, anunciou que criou uma empresa própria para administrar o Smiles, grande ativo que hoje sobrevive do mundo Varig, além, claro, da imagem de empresa perfeita na cabeça de muitos), saudades do jeito Varig de voar, inconformidade com um tempo que não voltaria mais. Dramas, choros, esquecimentos do que levou a Varig a essa situação.
Chegamos a 2012, ano negro para as companhias aéreas nacionais, quer dizer, Tam e Gol, com prejuízos, crises, reestruturações, o caso Webjet, a criação da Latam… Orgulho nacional mais uma vez ferido. (E nem citei aqui a derrocada da Vasp, Transbrasi, pois isto é apenas um post sobre percepção e não um tratado sobre aviação – e há muitos livros que podem esclarecer tudo isso).
O mundo não acabou e eu, depois de fazer as malas para passar o Natal no Rio, começo a zapear pelos canais a cabo e me deparo com um documentário sobre a Panair do Brasil. Opa… Boa oportunidade para eu me lembrar do que aqueles funcionários falavam lá no início da minha carreira, há 20 anos.
E eis minha surpresa ao ver os detalhes do fim da Panair, que praticamente foi cassada pelo governo, mais uma vítima da ditadura e, pelo que vi no filme, com a conivência conveniente da nossa Varig, a estrela brasileira. Terá a Varig provado de seu próprio veneno?, me perguntei. Isso não vem ao caso, e sim as coincidências que vi com o fim das duas empresas.
“Nunca mais houve uma companhia com o jeito Panair de voar”. “A família Panair era imbatível”. “O brasileiro precisa de algo no Exterior, ia em uma loja da Panair e tinha uma embaixada do Brasil”. “A manutenção e o serviço da Panair eram exemplares. Do varredor de chão ao piloto, todos tinham de manter o jeito Panair de voar”. “O presidente Paulo Sampaio era um apaixonado por aquilo, e nos guiava”. “A Panair não era de seus dois donos, Mário Simonsen e Celso Miranda, era do Brasil”. “O fechamento da Panair foi um absurdo, o governo não podia ter feito isso”. “Muitos funcionários passaram por dificuldades…”.. “A Panair levava remédios à Amazônia e a qualquer lugar do País. A Amazônia passou a existir graças aos corajosos pilotos da Panair”.
Substitua Panair por Varig e as frases acima continuam valendo.
A Panair acusa o governo de perseguição política (ligações comunistas e amizade com o ex-presidente Juscelino Kubitschek), e houve insinuações do apoio de Rubem Berta ao governo militar (como há de tantas outras empresas).
A Panair perdeu tudo, pelo que vi no documentário, inclusive propriedades e terrenos onde estavam aeroportos como o de Salvador e Recife, que eram dela, rádio, empresa de manutenção (Celma), as famílias dos donos foram perseguidas e alguns deixaram o País… E a Panair está congelada lá atrás… assim como a Varig atualmente, que teve um fim diferente da Panair (que tinha dinheiro e jamais faliu de verdade), mas que foi injustiçada igualmente na visão da Família Variguiana.
Curioso ver como o governo sempre interferiu diretamente no destino das empresas aéreas, o que, parece, não é o caso nos dias de hoje. O que há hoje é despreparo do governo para entender como incentivar a aviação brasileira. Um fala que precisa de mais companhias aéreas (mas as que estão aí estão perdendo dinheiro!!!). Outros que tem que abrir para os estrangeiros. Uns defendem a mão forte do governo, que sequer investe em infraestrutura como deveria. E há os que defendem liberdade total. A presidenta lançou um pacote esta semana. Vai investir na aviação regional.
Já vimos esse filme. E vamos vê-lo de outras formas.
Assim como os filmes Panair, Varig, Vasp, Transbrasil… se assemelham bastante, no drama, no amor pela aviação dos funcionários e (alguns) donos, na cobertura da imprensa, nas surpresas, apesar de também guardarem diferenças gritantes.
Com certeza me emocionarei também com um documentário que fale da Família Varig e de qualquer outras dessas empresas. Eu via paixão no que a maioria desses funcionários faziam. Não sei se é a mente que nos torna saudosista, mas era outra época. Acho que hoje, na aviação mundial, não há lugar para essa paixão. O melhor atendimento que recebemos, por exemplo, das asiáticas, seguem livros de conduta e têm a ver com a cultura dos países das companhias. O business hoje fala mais alto. A empresa aérea tem de transportar bem e dar lucro. Quem representa o País é o Itamaraty. É a presidenta em suas viagens internacionais. Até porque, em época de globalização e consolidação, você diria que a Air France-KLM-Alitalia representa que cultura? A Latam é brasileira ou chilena? A Swiss continua suíça 100% depois de vendida à alemã Lufthansa? O jeito United de voar é o mesmo depois da fusão com a Continental? A Delta manteve a traição da Pan Am nas rotas internacionais? A pensar…
Não são tempos melhores ou piores (apesar de nossa emoção e memória teimar que são piores) e sim diferentes.
Mas que o caso da Panair me surpreendeu até pela questão política, não há dúvidas. Olhemos para esse passado com carinho. Mas também como forma de aprendermos. Os ainda apaixonados pela aviação no Brasil merecem um tratamento melhor.
Cacei na internet (Wikipedia) algumas curiosidades da Panair:
O nome Panair era o endereço telegráfico da Pan American em Nova York.
Entre 1960 e 1965 operou o Voo da amizade em conjunto com a TAP-Transportes Aéreos Portugueses, com uma aeronave em cuja fuselagem estavam escritos os nomes de ambas as companhias aéreas.
O “tempo Panair” inspirou mesmo algumas músicas no Brasil, uma das quais, interpretada por Elis Regina, fez sucesso: “Conversando no Bar” (Saudade dos Aviões da Panair), composta por Milton Nascimento e Fernando Brant. Os versos dizem: “A primeira Coca-cola, foi, me lembro bem agora, nas asas da Panair…”
O “tempo Panair” inspirou ainda a criação de uma anedota típicamente caipira: “atã compadre, não pegou o avião? Não, ele dizia Panair e eu nã fui”.
Em Florianópolis, Santa Catarina, nas proximidades de onde atualmente está localizado o Aeroporto Internacional Hercílio Luz, existe a favela da “Panaia”. O nome da comunidade foi dado em referência à empresa, que era proprietária do terreno que foi invadido após o encerramento das operações comerciais, e posteriormente utilizado para a construção dos primeiros casebres.
Havia também uma anedota que dizia que Panair significava “Pelo Atraso Não Adianta Ir Reclamar”.
Por fim, vale assistir ao documentário Panair do Brasil, que vi no Canal Brasil, mas que pode ser comprado pela internet em diversas lojas. A direção é de Marco Altberg.
O trailer, no Youtube, já dá uma ideia do que é o filme: http://www.youtube.com/watch?v=1XzCz72ij_c.
Bom tema Artur,
Eu já assisti este documentário e fiquei boba com as coisas que vi.
Como bons brasileiros, sempre acreditamos que sabemos de futebol e aviação como nenhum outro. E na verdade não conhecemos metade das histórias sobre o “Brasil que o Brasil não conhece” como dizia numa novela aê…
As empresas querem clientes fieis, mas não conseguem fidelizar seus próprios funcionários e talvez por isso não existam mais aquele amor pelas empresas, o saudosismo… É uma pena.
PresidentA, Artur?… PresidentA?…
Até você se “dobrou” ante a exigência d’A ignorantA?…
Uma vez mais, um bom texto, e deixa espaço para que muito se possa escrever sobre o assunto; mas ler presidentA, foi de doer aos olhos e ouvidos…
Tem razão, caro Mury. Gerúndio substantivado não tem gênero:”presidentA” doi demais nos ouvidos. (Ocorre diariamente n’A Voz do Brasil’, onde até que é compreensível, porque os editores são do próprio governo.)
hahahahaha só você mesmo Luiz Fernando…
É Natal, tô com a Dilma: presidenta do Brasil. Não vejo problemas… É bom que ressalta o fato de ser mulher… Mas tem quem não goste. Respeito.
Feliz Natal
Ho ho ho
`Meu` Redator,
As causas foram totalmente distintas… com receio de deslizar na distincao entre a perseguicao politica e outros males acessorios, da PANAIR, e a ma gestao, ou gatunagem, ou ambas com seus socios e acessorios, da VARIG.
Palavra de viuva!… desta, como muitos que poderao concordar e comentar seu post. Fico nessa perspectiva.
Bencaos do Senhor, Boas Fetas e meu abraco,
Marcos Estevao Vajas Hernandez
Manchester-UK, + 44 79 7973.3380
Caro Artur,
Também vi este documentário, e tive o mesmo sentimento que o redator, veremos novamente este filme, tomará que não.
Feliz Natal
Rogério Amaro
Relembrar nao ofende.
2001.
Varig / Varig Travel = Queda e fechamento da Soletur
A ditadura foi tamben o fim da. Panair como tamvem foi o fim da tv tupi