Geolocalização, a nova vilã do Turismo

Horseshoe Bend, no Arizona, cenário que viralizou nas redes sociais e trouxe efeitos para o mundo real (Flickr/dawgfanjeff)

Imagens e relatos são por essência grandes promotores do Turismo. Quem nunca definiu as próximas férias diante da experiência de um familiar ou amigo? Há quase uma década, essa perspectiva se expandiu ao migrar para as redes sociais, que têm gerado tal efeito inspiracional com maestria. Grande objetivo dos marqueteiros, que investem um bocado em influenciadores do mundo digital, a onda quase que instantânea de turistas pode ter efeitos alarmantes em alguns tipos de destinos – especialmente naqueles que envolvem natureza.

Mundo afora especialistas parecem ter encontrado uma vilã: a geolocalização em redes sociais. Em pouco mais de oito anos de existência, o Instagram foi capaz de colocar no mapa de destinos em alta alguns lugares que, até então, eram relíquias apenas exploradas por um punhado de viajantes locais. De acordo com dados da agência Omnicore, postagens geolocalizadas têm 79% mais engajamento do que as imagens sem tagueamento – de uma base que, hoje, chega aos 500 milhões de usuários ativos por dia.

Em um primeiro momento, não é de todo mal reunir um catálogo de imagens variadas em um só lugar, como é o caso da seção de geolocalização do Instagram, por exemplo. Ela de fato tem o poder de apresentar um novo local a potenciais visitantes e isso gera uma valiosa exposição que, consequentemente, retorna com mais turistas e o crescimento econômico que muitos destinos buscam. O problema surge, de acordo com alguns órgãos turísticos “reféns” do tagueamento virtual, quando paisagens específicas viralizam.

Turistas em visita a Horseshoe Bend, no Arizona (Flickr/Simon Walhalla)

Alguns casos são famosos ao redor do mundo e mostram, na prática, como as redes sociais têm o poder de influenciar os viajantes em suas escolhas e as consequências disso. Nos Estados Unidos, na divisa entre os estados do Arizona e Utah, uma vista curiosa do curso do rio Colorado se popularizou entre fotógrafos e viajantes profissionais. O Horseshoe Bend, pelo formato de ferradura que o rio tem neste ponto, viu em pouco tempo o número de visitantes por ano saltar de alguns milhares para mais de um milhão e meio no ano passado. Como se pode imaginar, o novo volume demandou intervenções estruturais, como a criação de um estacionamento, e aumentou a preocupação das autoridades com a preservação do parque naquele local.

Uma solução para os efeitos nocivos da geolocalização é o uso de tags mais genéricas. Ao invés de estampar lugares exatos, a sugestão é localizar a reserva, a cidade ou a região em questão. No final do ano passado, o bureau turístico de Jackson Hole, em Wyoming, iniciou uma campanha de conscientização sobre o tema, batizada de Tag Locations Responsibly (“tagueie lugares com responsabilidade”).

“Infelizmente, toda vez que alguém tagueia com a localização precisa uma foto incrível de natureza, é atraído um tráfego em excesso que é prejudicial ao nosso ambiente. Como entusiastas da conservação, nós pedimos que você compartilhe suas fotos utilizando uma tag genérica”, propõe o Visit Jackson Hole, que como parte da campanha criou no Instagram a localização “Tag Responsibly, Keep Jackson Hole Wild”.

As tags genéricas em prol da preservação de biomas sensíveis é uma tentativa de barrar a depredação que comumente acompanha o fluxo massivo de turistas a um determinado local. Apesar de ainda não estar claro se evitar a exatidão geográfica tem resultados práticos, não custa nada abrir mão de uma tag específica na próxima postagem em área preservada.

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Entendendo o “encerrado para férias”

Antes de sair de férias, floricultura faz promoção para desafogar o estoque

Parece inconcebível para os que passam por Portugal em agosto que, em pleno verão, comércios troquem turnos duplos e casas cheias de turistas endinheirados pela tranquilidade de suas próprias férias. Agosto é o mês que escancara a maneira própria dos portugueses em gerir seus negócios, algo um pouco difícil de entrar na cabeça daquele brasileiro, digamos, mais capitalista.

Por aqui, muitos e muitos bares e restaurantes são geridos por famílias. Mesmo aqueles pontos mais tradicionais, que se tornaram clássicos ou “visitas obrigatórias”, não raro têm no comando até hoje os fundadores originais ou parentes próximos. É uma mistura de orgulho, zelo e desconfiança que impede que eles deixem seus negócios nas mãos de terceiros.

Ao mesmo tempo, como qualquer bom profissional que ralou durante o ano todo – e já enfrentou (e faturou) os movimentados meses de maio, junho e julho -, há de se reservar algumas janelas do calendário para o próprio descanso, que em geral acontece ao longo do mês de agosto.

Aí que surge o conflito. Há quem, racionalmente, com números e fórmulas, irá argumentar que é preciso se manter aberto o maior tempo possível na alta. Talvez até aumentar o horário de funcionamento e contratar temporários para maximizar os lucros da temporada.

Fui almoçar e…

No outro lado da argumentação, além do cansaço acumulado por tocar uma operação em ritmo frenético nestes cerca de quatro meses, trabalhar até o fim do verão significa ter para as férias pessoais o outono (que é lindo, mas…), um período menos convidativo, de dias cada vez mais curtos e temperaturas cada vez mais baixas.

Confesso que não foi fácil entender de cara essa opção pelas férias. Mas, pessoalmente, eu respeito muito essa escolha. Fechar seu estabelecimento no meio da alta temporada é tanto um reconhecimento aos funcionários que deram duro nos meses anteriores, quanto um recado a todos de que ali há pessoas que priorizam conforto e bem-estar ao invés de dinheiro.

Dei como exemplo bares e restaurantes, mas isso acontece de uma forma meio que geral pelos mais variados tipos de serviços. Fecham-se papelarias, drogarias e floriculturas (como a da foto). É difícil encontrar dentistas ou advogados atendendo, por exemplo.

Enfim, pode ser bem frustrante dar de cara com a porta fechada e um recado comunicando a data de retorno, mas eu não vou julgar aquele que só quer tirar um tempo para descansar e estar com os seus.

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Não seja um turista inconveniente

A frequentemente assediada estátua do trabalhador em Bratislava, Eslováquia

Eu nasci e cresci em São Paulo, uma cidade que não vive necessariamente do Turismo, passei uma temporada em Dublin, que também não é dos destinos europeus mais badalados, mas foram nesses meses aqui no Porto que eu tive contato mais próximo com um local que vive intensamente a indústria de viagens. Neste verão o Porto foi tomado por turistas de um jeito que os locais nunca haviam visto. Os números mais tarde vão dizer se recordes foram batidos, mas a sensação é de que, de fato, a cidade estava mais cheia do que nunca.

Ótimo para a economia e para aqueles que vivem do Turismo, nem tão bom assim para quem vive alheio a essa universo. Pela primeira vez como morador de uma cidade-destino, eu tive que driblar turistas quando eu queria apenas chegar ao mercado; vi ruas amanhecerem sujas diante das noitadas dos estrangeiros; fui paciente para entender que, mesmo longe de casa, as pessoas carregam seus hábitos locais.

Pode soar extremamente prepotente para alguém que mal se instalou numa cidade cheia de turistas, mas resolvi pontuar aqui alguns hábitos comuns que acredito serem facilmente contornáveis – já que eu realmente acredito que há mais falta de atenção do que falta de educação, propriamente.

Com meu pai, sendo inconveniente na hora da folga do rapaz

Cultura
Instintivamente achamos que todos os lugares funcionam tal qual sua própria cidade. Aqui se atravessa a rua na faixa? O semáforo é respeitado? Tem fila para entrar no ônibus? Parece óbvio, mas em cada lugar as coisas são de um jeito. Um dos meus exercícios prediletos quando sou turista é a observação. Paro, olho, analiso, pergunto e, por falta de termo melhor, copio os locais – mesmo (ou principalmente) nas coisas mais simples. Ganha a cidade, já que a compreensão diminui a possibilidade de atritos, e ganha o turista, que tem a chance de experimentar uma forma de viver que não seria tão óbvia em um primeiro momento.

Cotidiano
Turista é um ser meio perdido por excelência e disso não vou reclamar jamais, faz parte do negócio. Tem vezes que é preciso mesmo parar a caminhada para checar o mapa ou uma sinalização, mas não custa nada dar uma olhada ao seu redor antes de fazer isso. Não é raro ver gente parando ao pé de escadas rolantes, na porta do metrô/trem ou na beira de uma via, atrapalhando um fluxo de pessoas que têm n outros motivos para estar ali.

Serviços
Suas férias são sagradas, claro que são. Quem lhe serve, seja em um hotel, restaurante ou atração, trabalha justamente para que este seja um momento livre de preocupações. Mesmo assim, má experiências acontecem, humanos são passíveis de erro. Dito isso, acredito que descontar frustrações em funcionários é uma forma muito injusta de lidar com seus problemas. Exija o retorno por um serviço que contratou, evidentemente, mas seja razoável quando suas expectativas não forem alcançadas.

Inconveniente em Sintra, Portugal

Conservação
Por mais que viva do Turismo, um destino também é a casa de quem ali mora. Às vezes tenho a impressão de que alguns (poucos) turistas enxergam essas cidades de forma descartável. Que elas estão lá para seu próprio usufruto, independentemente dos moradores ou dos que venham a visitar no futuro. Para mim parece razoável esperar que convidados cuidem da casa do anfitrião tão bem (ou melhor) quanto cuidam da sua própria casa.

Apesar de incomodar, certamente esses pontos não são os piores reflexos do Turismo em massa em uma sociedade. É extensa e muito mais profunda a discussão sobre o Overtourism (Turismo em excesso) e a sua consequência direta, a Turismofobia. Para quem quer ler mais sobre o tema, a amiga e repórter da Panrotas, Karina Cedeño, publicou recentemente uma série de reportagens analisando o fenômeno. Nela, a repórter traça um panorama geral do Turismo em grande escala, abordando a discussão sob o olhar de grandes destinos, da indústria de cruzeiros, de órgãos governamentais e dos profissionais do mercado.

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