Não seja um turista inconveniente

A frequentemente assediada estátua do trabalhador em Bratislava, Eslováquia

Eu nasci e cresci em São Paulo, uma cidade que não vive necessariamente do Turismo, passei uma temporada em Dublin, que também não é dos destinos europeus mais badalados, mas foram nesses meses aqui no Porto que eu tive contato mais próximo com um local que vive intensamente a indústria de viagens. Neste verão o Porto foi tomado por turistas de um jeito que os locais nunca haviam visto. Os números mais tarde vão dizer se recordes foram batidos, mas a sensação é de que, de fato, a cidade estava mais cheia do que nunca.

Ótimo para a economia e para aqueles que vivem do Turismo, nem tão bom assim para quem vive alheio a essa universo. Pela primeira vez como morador de uma cidade-destino, eu tive que driblar turistas quando eu queria apenas chegar ao mercado; vi ruas amanhecerem sujas diante das noitadas dos estrangeiros; fui paciente para entender que, mesmo longe de casa, as pessoas carregam seus hábitos locais.

Pode soar extremamente prepotente para alguém que mal se instalou numa cidade cheia de turistas, mas resolvi pontuar aqui alguns hábitos comuns que acredito serem facilmente contornáveis – já que eu realmente acredito que há mais falta de atenção do que falta de educação, propriamente.

Com meu pai, sendo inconveniente na hora da folga do rapaz

Cultura
Instintivamente achamos que todos os lugares funcionam tal qual sua própria cidade. Aqui se atravessa a rua na faixa? O semáforo é respeitado? Tem fila para entrar no ônibus? Parece óbvio, mas em cada lugar as coisas são de um jeito. Um dos meus exercícios prediletos quando sou turista é a observação. Paro, olho, analiso, pergunto e, por falta de termo melhor, copio os locais – mesmo (ou principalmente) nas coisas mais simples. Ganha a cidade, já que a compreensão diminui a possibilidade de atritos, e ganha o turista, que tem a chance de experimentar uma forma de viver que não seria tão óbvia em um primeiro momento.

Cotidiano
Turista é um ser meio perdido por excelência e disso não vou reclamar jamais, faz parte do negócio. Tem vezes que é preciso mesmo parar a caminhada para checar o mapa ou uma sinalização, mas não custa nada dar uma olhada ao seu redor antes de fazer isso. Não é raro ver gente parando ao pé de escadas rolantes, na porta do metrô/trem ou na beira de uma via, atrapalhando um fluxo de pessoas que têm n outros motivos para estar ali.

Serviços
Suas férias são sagradas, claro que são. Quem lhe serve, seja em um hotel, restaurante ou atração, trabalha justamente para que este seja um momento livre de preocupações. Mesmo assim, má experiências acontecem, humanos são passíveis de erro. Dito isso, acredito que descontar frustrações em funcionários é uma forma muito injusta de lidar com seus problemas. Exija o retorno por um serviço que contratou, evidentemente, mas seja razoável quando suas expectativas não forem alcançadas.

Inconveniente em Sintra, Portugal

Conservação
Por mais que viva do Turismo, um destino também é a casa de quem ali mora. Às vezes tenho a impressão de que alguns (poucos) turistas enxergam essas cidades de forma descartável. Que elas estão lá para seu próprio usufruto, independentemente dos moradores ou dos que venham a visitar no futuro. Para mim parece razoável esperar que convidados cuidem da casa do anfitrião tão bem (ou melhor) quanto cuidam da sua própria casa.

Apesar de incomodar, certamente esses pontos não são os piores reflexos do Turismo em massa em uma sociedade. É extensa e muito mais profunda a discussão sobre o Overtourism (Turismo em excesso) e a sua consequência direta, a Turismofobia. Para quem quer ler mais sobre o tema, a amiga e repórter da Panrotas, Karina Cedeño, publicou recentemente uma série de reportagens analisando o fenômeno. Nela, a repórter traça um panorama geral do Turismo em grande escala, abordando a discussão sob o olhar de grandes destinos, da indústria de cruzeiros, de órgãos governamentais e dos profissionais do mercado.

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A Veneza que não é feita para turistas

A vista de Veneza e o Canal Grande na chegada pelo mar

Eu cheguei duas vezes em Veneza. No fim de tarde de uma sexta-feira, o Seabourn Ovation se aproximava da cidade que, em todo o seu esplendor, nos aguardava para dar essa primeira e encantadora recepção. A segunda chegada ocorreu no dia seguinte (e foi um tanto quanto assustadora).

Ainda no porto, ao desembarcar do navio, eu e outros hóspedes entramos num desses barcos de, sei lá, 50 passageiros, para um tour ao redor das ilhas de Veneza – passeio disponibilizado pela Seabourn em nossa despedida. Novamente, lá estava Veneza ao longe, muito formosa, com suas belas construções e um céu azul incrível.

Eu não havia nem pisado na cidade e já estava a considerando pacas gostando do que via. Eis que o tour acabou e o barco desembarcou os passageiros em plena Piazza San Marco. Se você não está familiarizado com Veneza, a praça que hospeda a Basílica de San Marco é um dos pontos de maior concentração de turistas na Europa.

A calma manhã de domingo na fondamenta Misericordia

No espaço de minutos eu tinha trombado com muita gente, topado com carrinhos de bebê, desviado de paus de selfie, dito uma porção de “não” para comerciantes e presenciado um atendimento médico na fila para entrar no Palazzo Ducale. Aquilo era um caos e confesso que fiquei assustado.

Muita gente havia sugerido que eu me perdesse pelas ruelas de Veneza, que essa era a graça do passeio pela cidade. De fato a estratégia era boa, as multidões tinham sumido e a calmaria estava, por vezes, presente. Ainda assim, eu me sentia em um “parque temático” à beira dos grandes pontos de interesse.

Para a minha sorte eu teria dois dias em Veneza e, assim, eu pude organizar melhor o meu roteiro a fim de evitar a bagunça da véspera. Foram duas as soluções para conhecer a ilha principal de outra maneira: acordar cedo e evitar o centro.

Ainda não eram 9 horas do domingo e a cidade tinha outra atmosfera. Decidi passar minha manhã na sestieri de Cannaregio, perambulando por áreas como o Antigo Gueto (morada dos judeus entre os séculos 16 e 18) e descobrindo passagens minúsculas nas travessas da fondamenta Misericordia.

Os pequenos celebram a comunhão na igreja de Madonna dell’Orto

Essencialmente eram bairros residenciais, refúgios dos pouquíssimos venezianos que ainda moram na ilha principal. Era distante da aglomeração o suficiente para que a vida existisse, para que o treino de remo acontecesse, para que primeiras eucaristias fossem celebradas. Lá eu presenciei de relance o que pode ser a vida em Veneza e isso, pra mim, valeu a visita.

Acho necessário, por fim, fazer um adendo. Não posso ignorar o fato de que eu era um turista, assim como qualquer outro, que invadia esse espaço mais “privado” da cidade. Mas eu realmente acredito que, com respeito e bom senso, é possível o convívio mútuo entre cidadãos e visitantes – sem que aqueles tenham de mudar sua forma de viver por conta destes.

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O que pretende um Viajante 3.0?

O embarque

O Viajante 3.0 pretende ser um espaço de descoberta. Sem dúvidas assim será para mim, que escrevo esse blog, mas principalmente para você leitor que acompanhará nas próximas postagens minhas peripécias por destinos internacionais.

Baseado em Portugal, no Porto, meu foco principal estará em cidades europeias – apesar de que destinos fora do Velho Continente também podem ser uma constante. Às vésperas de me tornar um trintão, a minha ideia aqui é dialogar com os meus, viajantes que já possuem alguma experiência mas que buscam inspiração para ir além na próxima viagem. O “3.0” no nome indica um momento de vida, mas não o delimita.

Atualmente, segmentos dos mais variados ganharam a alcunha “3.0” para descrever uma atuação mais conectada à realidade das práticas atuais (e futuras, por que não?). Na indústria de viagens não foi diferente e o “Turismo 3.0” remete à exploração de destinos de forma consciente, amparada por tecnologia e inovação.

O Viajante 3.0 quer trazer ao público essa experiência na prática, mesclar Turismo e Lifestyle de um jeito não óbvio, sem ignorar por completo a estrutura turística tradicional e também não fechar os olhos para o novo. A pretensão neste espaço é transitar entre o novo e o velho mundo – e mostrar que cada um pode viajar à sua maneira, fugindo dos padrões “de sempre” (ou não, se assim preferir).

Entre meus irmãos, em frente ao Hotel Doce Mar, em Búzios/RJ

Sobre mim

Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero, já rodei pelas mais variadas redações, de setores segmentados à grande mídia. Nestas andanças, variei também de temas e, há cerca de dois anos, ao me tornar repórter da PANROTAS, uni o trabalho ao prazer por viajar.

Tradição familiar desde que me conheço por gente, as viagens de verão aconteciam praticamente ano a ano – e, durante minha infância, sempre em destinos nacionais (já que a estrada é um dos prazeres do meu pai). Desde então foram 12 Estados e o Distrito Federal visitados.

Cruzar fronteiras logo se tornou uma prioridade e, então, comecei a me aventurar fora do País. Argentina, Holanda e Estados Unidos foram os países que visitei enquanto ainda era um estudante de jornalismo. Há três anos morei por uma temporada em Dublin, Irlanda, e assim consegui conhecer outros cantos do Velho Continente. No passaporte, constam atualmente carimbos de 15 países.

Alguns carimbos mais virão, só que agora com o blog e Instagram (@viajante3.0) ficou mais fácil de acompanhar. Vejo vocês por aí.