Eu sou Charlie

Inútil repetir o que todos viram na televisão. Alguns entraram em contato para saber se estávamos todos bem. Sim estamos bem, embora muito tristes, perplexos.

O ato é patético, isolado e triste. Trágico e tantos outros sinônimos mais. Não vou recontar o ocorrido, somente reiterar que entre as vítimas do massacre estavam os Cartunistas ( com C maiúsculo)  Chakrapani, Cabu, Wolinski, Tignous e outras figuras ícones do jornalismo cômico francês. Jornalistas satíricos, destes que alegram nosso quotidiano com piadas, simples e, no entanto tão complexos guardiões da liberdade de expressão.

A França, embora chocada, reagiu rapidamente. De acordo com o jornal Liberação, mais de 100.000 pessoas se reuniram na tarde de quarta-feira em todo o país para homenagear as vítimas do ataque contra o jornal Charlie Hebdo. Se não fosse tão triste, essa união poderia ter sido chamada de linda, mas não havia beleza, somente tristeza e indignação para todos os lados.

Segundo a polícia de Paris aproximadamente 35.000 pessoas manifestaram na Praça da República, nas imediações da sede do jornal, a convite de vários sindicatos, associações, da mídia e de partidos políticos. No meio da multidão, muitos usavam um adesivo preto ou um sinal de “Eu sou o Charlie,” que pode ser visto nas redes sociais. Algumas pessoas tinham uma vela na mão,outros acenavam com lápis, símbolo da liberdade de imprensa. Primeiro em silêncio, depois os manifestantes aplaudiram e em seguida se colocaram a gritar slogans como: “Charlie, Charlie”, “Não temos medo, Charlie! Cartazes proclamavam  “Liberdade de expressão, “Liberdade não tem preço”, “Espingardas contra canetas”.

Dentre os presentes, muitos não deviam ser leitores regulares, porém foram defender a paz e a liberdade de expressão com uma edição do jornal à mão. Reuniram-se também entre 13.000 e 15.000 pessoas nas ruas em Rennes, a maioria ostentando a edição de Charlie Hebdo e entre 10.000 e 15.000 em Lyon cantando uma musica francesa chamada Charlie, 10.000 em Toulouse, cidade do economista igualmente morto no ataque Bernard Maris. Outras manifestações pacíficas aconteceram em Grenoble, Bordeaux, Nantes, Estrasburgo e Metz, Dijon, Rouen e Clermont-Ferrand, além de Nancy, Montpellier, Nice, Angoulême, Limoges, Besançon, Poitiers ou Agen.

Caros leitores, os dados acima vêem da mídia local, sinceramente hoje meu coração não está disposto a “bater papo”, repasso com minhas palavras o que li para coloca-los a par desta reação exemplar. Hoje, minha única vontade  é  de oferecer a França meus sentimentos e também minha grande admiração. O país inteiro soube reagir com elevação ao golpe baixo que recebeu, com honra, muita inteligência, dignidade e sobretudo paz.

 

Feliz Ano Novo Parisiense!

Você deve estar pensando que estou atrasada, mas não estou! Aqui na França é durante todo o mês de janeiro que damos nossos votos de um bom ano novo.

Um ano que começou bem em Paris, cheio de surpresas. Em 2011 o antigo prefeito senhor Bertrand Delanoë havia anunciado que sua decoração natalina ficaria exposta por 5 anos. Felizmente a nova administração, embora também socialista, resolveu investir em uma decoração clássica com guirlandas iluminadas. Ufa! Nesta passagem de ano a Avenida Champs Elysées estava mais linda do que nunca!

Madame Hidalgo, a nova prefeita, deu também um outro super presente a cidade. Um espetáculo de som, luzes e fogos de artifícios no Arco do Triunfo. Após anos de recesso, Paris e seus fogos de artifícios voltaram a brilhar na noite de São Silvestre. Uma boa surpresa e promessa para vários réveillons futuros.

Voltando aos votos para 2015: Merde, muita “merde” para você! Perdão pelo palavrão. Não fique bravo(a).

Artistas de todo o mundo costumam desejar a seus colegas “merde”, substituindo com esta palavra os votos de uma boa representação. A superstição leva a crer que isso é somente um voto de sorte, mas na realidade a tradição faz referência ao número de carruagens que paravam diante dos teatros no século dezenove. Uma vez parados ou estacionados, os cavalos das charretes se abandonavam as suas necessidades naturais deixando na entrada e arredores dos teatros suas fezes. Esta camada de merda era levada pelos sapatos da platéia teatro adentro. Sendo assim, quanto mais merda de cavalos na entrada e nos tapetes, mais gente dentro da sala. Com carinho e respeito, para você e seus negócios, caro leitor, muita “merde” em 2015.

Beijos e até a próxima.

 

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Projeto Blachere Iluminações, Champs Elysées 2014
Iluminações mantidas nos canteiros, Champs Elysées
Iluminações mantidas nos canteiros, Champs Elysées
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Projeto Iluminações Blachere Champs Elysées 2014
Iluminações de Delanoë, muito criticadas, não duraram 5 anos como previsto
Iluminações de Delanoë, muito criticadas, não duraram 5 anos como previsto

 

Iluminações Champs Elysées, Paris 2011 a 2013
Iluminações Champs Elysées, Paris 2011 a 2013

 Champs Elysées 31 dezembro 2014

 

 

Rue,Faubourg,Boulevard,Porte e meus votos de Feliz Natal

A Rua Saint-Martin começa na beira do Rio Sena, em frente a Ponte Notre-Dame e segue para o norte de Paris, tornando-se Faubourg Saint-Martin após a travessia do Boulevard Saint-Martin. No eixo de encontro entre as três vias que levam o nome de São Martinho, a Porta Saint-Martin designa um dos pontos de entrada do burgo parisiense tal como traçado pela muralha do rei Charles V em 1356.

Impossível passar por aqui e não ficar curioso: Rue Saint-Martin, Boulevard Saint-Martin, Faubourg Saint-Martin, Porta Saint-Martin? Mesmo porque, quanta gente eu já não vi perdida “na rua” buscando “o faubourg”, ou no “boulevard” buscando “a rua” e vice-versa. Parece complicado, mas não é.

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Antiga Comunidade de Saint-Martin, atual Conservatório Nacional de Artes
Antiga Comunidade Religiosa de Saint-Martin, atual Conservatório Nacional de Artes.
Baixo Relevo n° 89 Rue Saint-Martin. Gabriel anuncia a Maria a vinda de Jesus
Baixo Relevo n° 89 Rue Saint-Martin. Gabriel anuncia a Maria a vinda de Jesus
Porta Saint-Martin, construída sob Luis XIV quando retirou a muralha de Charles V em 1675
Porta de Saint-Martin, construída sob Luis XIV quando retirou a muralha de Charles V em 1675
Em azul muralha de Felipe Augusto e na margem direita traço da muralha de Charles V Munser1572
Em azul muralha de Felipe Augusto e na margem direita traço da muralha de Charles V
Traçado da Muralha de Felipe Augusto
Traçado da Felipe Augusto séc XII- A porta Saint-Martin já existia

A partir do séc. XIII o termo Rue foi reconhecido oficialmente para as “rotas” dentro do burgo enquanto Faubourg designava estas mesmas “rotas” fora do burgo. Já a origem etimológica de Boulevard é bouleverk – muralha em antigo holandês. Hoje nenhuma das sete muralhas que um dia protegeram Paris existe, mas as organizações Antigas e Medievais subsistem, submersas no asfalto e outros marcos históricos, estão ai se prestarmos atenção.

“Cardo-maximus” romana a atual Rue Saint-Martin foi durante toda antiguidade o principal eixo de travessia na margem direita da cidade tendo sua importância suplantada pela rota paralela, a Rue Saint-Denis, a partir da idade média. A rota de Saint-Martin levava aos territórios de Flandres e a rota Saint-Denis à basílica católica onde estão enterrados atualmente todos os reis da França. Mas essa é outra história.

Voltemos a Saint-Martin. Sim claro, por que uma vez o mistério Rue/Faubourg/Bouvelard/Porte resolvido resta uma duvida. Quem foi Saint-Martin? Bispo de Tours e fundador do primeiro mosteiro de França tornou-se conhecido por sua grande bondade.

Será com o relato de um pequeno trecho de sua vida que deixarei a você leitor meus agradecimentos pela sua “presença” durante 2014 e, sobretudo meus sinceros Votos de Feliz Natal e um Ano Novo Cheio de Paz, Amor, Saúde e Prosperidade.

 

Sao Martinho
Martinho entrega sua capa ao pedinte.

Em um dia frio de Novembro 337 d.c., Martinho, jovem soldado da legião romana, ia a cavalo por territórios franceses quando começou uma grande tempestade. Viu então um homem pobre e quase nu a pedir esmola. Não tendo moedas, com a espada Martinho cortou ao meio a sua capa entregando-a ao mendigo para agasalhá-lo, provocando, com esta atitude de solidariedade, risos aos seus companheiros de armas por ter ficado com a sua capa rasgada.

Foi então que a chuva parou e raios de sol quentes apareceram por entre as nuvens como em um dia de verão.

Na mesma noite Martinho teve uma visão de Jesus coberto com seu manto e ouviu dele as palavras que o levaram a conversão e vida dedicada ao bem do próximo:

“Cada vez que fizeres o bem ao mais desprotegido é a mim que o fazes”.

Natividade
Feliz Natal. Melhores Votos para 2015 pleno de Amor, Paz, Saúde e Prosperidade

 

Notas e Curiosidades:

Cardo-maximus – via principal da cidade cortada em seguida por perpendiculares e paralelas constituíam a base da construção urbana romana.

Metade da capa pertencia a legião romana, a outro a Martinho. O que explica porque ele deu somente uma metade!

O nome Martin tem sua origem no culto politeísta romano e significa devoto a Marte, rei da guerra.

O culto da capa de São Martinho na França dará origem a palavra Capela

fotos Rua Saint-Martin wikipedia