O complicado conceito de Glamping

Glamping na Eyre Peninsula australiana. Foto: Mari Campos

Já sabemos que tudo no universo das viagens hoje em dia tem a ver com “experiências” e é claro que natureza e, sobretudo, ecossistemas diferentes dos quais estamos habituados representam parcela importante destes desejos viajantes. Diversas propriedades em distintos locais do globo souberam unir com maestria a ideia de aventura e extremo contato com a natureza sem abrir mão do conforto, do bom serviço e da boa mesa, como as redes Explora e Tierra Hotels na América do Sul e inúmeros lodges de safári sul africanos (como Tintswalo, Thornybush e tantos outros).

Não faz tanto tempo assim que o conceito de “glamping” tomou conta de parte do mercado de viagens internacional. No princípio, eram poucas empresas investindo nesta ideia de “glamour camping” mas, com o advento das redes sociais, instagrammers, bloggers e youtubers, não demorou muito para a ideia, tão visualmente sedutora, se espalhar por destinos nos cinco continentes.  A proposta de se hospedar em meio à natureza exuberante com a conveniência dos serviços de hotelaria foi desde o início sedutora para boa parte dos viajantes – uma oportunidade de unir o melhor dos mundos em uma viagem cheia de experiências e imersão.

Na onda do glamping, o conceito original das tendas começou com unidades ampliadas, com banheiros privativos, refrigeração ou calefação do ambiente e amenidades de qualidade, e evoluiu para yurts completíssimos que não devem em nada a um bom quarto de hotel, como nos ótimos Eco Camp e Patagonia Camp, no Chile, por exemplo.

O conforto no contato muito próximo com a natureza sempre norteou tais experiências – ao menos em princípio. O ótimo Jawaii Leopard Camp, por exemplo, foi erguido em uma área super remota e selvagem das Aravelli Hills, na Índia. Suas refinadas e completíssimas tendas foram instaladas com todo o conforto em uma região habitada pelos curiosos homens da tribo Rabat e rodeada por uma impressionante população selvagem de leopardos – daquelas experiências intensas das quais jamais me esquecerei.

O peculiar e o inesperado sempre foram bem-vindos neste setor e hoje não são poucas as propriedades em diferentes continentes oferecendo até ofurôs sob as estrelas do lado de fora das tendas. E sustentabilidade é, é claro, essencial para qualquer propriedade do gênero ser bem sucedida no mercado. Mas, assim como o conceito de hotel boutique, parece que cada proprietário entende a ideia de glamping como bem quer.  Tive experiências bastante frustrantes em locais como o Elephant Hills, no sul da Tailândia, de tendas abafadíssimas, serviço pífio, e um menu buffet sofrível que se repetiu, idêntico, pelos dois almoços e dois jantares que fiz ali.

Neste abril, em uma viagem pelo outback da Península Eyre, na Austrália, me hospedei em uma propriedade nas Gawler Ranges que se define em seu website como “glamping experience” e diz que tem “5 star tents”. Cobra 660 dólares por pessoa POR DIA de hospedagem (e não por noite!), não tem sequer ventiladores nas tendas quentíssimas (peguei 41 graus durante o dia, mesmo durante o outono), não oferece nenhum tipo de serviço de limpeza/camareiras (nem troca de toalhas) nem investe em uma gastronomia minimamente caprichada (os jantares até eram ok, mas nos dois almoços que fiz lá, um tinha restos do jantar anterior mal ajeitados em potes plásticos e o outro era um sanduíche de salada na baguete, embalado em papel filme).

Transfers, passeios e refeições estão incluídos, assim como vinhos australianos no jantar. O local utiliza somente água da chuva para chuveiros e descargas e mantém o consumo de energia elétrica ao mínimo possível. A paisagem do outback australiano durante o dia, a vida selvagem nos arredores das tendas e o céu extremamente estrelado no meio do nada compensam, por exemplo, o incômodo irritante das moscas o dia todo; é um fenômeno natural, não há tanto  que possa ser feito. Mas o acampamento cobrar um valor como esse pelo tipo de produto que oferece me parece mesmo injusticável.

É claro que entende-se que propriedades pequenas, remotas e que investem em sustentabilidade têm geralmente custos mais altos que um grande hotel em um centro urbano pela própria logística necessária para abastecê-la – sem nem entrar em outros méritos. E sabemos que até mesmo o conceito de “estrelas” na hotelaria ainda é super discutível, então é mesmo utopia querer algum tipo de “standardização” para propriedades que se definiam como hotéis boutique, eco-lodges ou glamping. Mas uma propriedade que cobre o mesmo valor que um hotel de exploração de primeira linha(como os já citados Explora e Tierra, por exemplo) não oferecer sequer ventiladores para amenizar o calor surreal das tendas ou serviço de camareiras se atrever a cobrar preço de hotel de luxo realmente é algo que ainda me choca.

 

 

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A tecnologia a favor do hóspede

A simpática saudação logo que fiz minha reserva

São muitas as redes da hotelaria de luxo que eu admiro, e por diferentes razões. Mas, sejamos francos, a rede Four Seasons vem redefinindo as noções de luxo contemporâneo no mercado há muito tempo, e acho isso louvável mesmo. Ainda na década de 80, foi a primeira rede de hotéis de luxo a oferecer amenities de higiene e beleza como norma e a ter colchões customizados (e desde 2015 é a única em que o hóspede pode escolher o tipo de colchão que quer na sua cama). Depois, a primeira a ter wifi grátis no mundo inteiro, serviço de lavanderia 24/7, roupas passadas em uma hora, concierge 24 horas, room service 24h e mais um série de outros serviços que hoje o turista espera que seja regra na hotelaria de luxo internacional.

Não foi a primeira rede a investir em mobile – Ritz-Carlton, Marriott, Starwood e outras vieram antes. Chegou com um considerável delay neste campo, na verdade – mas foi a primeira a lançar uma app com todas as funcionalidades acessíveis para todos os hóspedes e não apenas para os que têm status elite em programas de fidelidade, como acontece com algumas outras redes.

Só lembrei de avisar que iria chegar antes quando já estava a caminho do hotel. Mas a resposta veio imediatamente

Pois agora a app deles também oferece um inovador serviço de chat on line que eu acabei de testar por conta da minha hospedagem no Four Seasons George V Paris neste final de março, em uma viagem a lazer. O novo serviço digital permite que o hóspede troque mensagens de fato instantâneas com a equipe do hotel antes, durante e depois da sua estada – e de maneira bastante personalizada, num caso raríssimo neste mercado em que a facilitação digital não excluiu o approach humano.

As primeiras mensagens do chat começaram a chegar assim que fiz minha reserva,  saudando-me pelo nome e dizendo que estavam ansiosos para me receber novamente. Até aí tudo bem, a maioria das apps de hotéis operam em sistema semelhante. Fiz meu check-in online, confirmei dados do cartão de crédito etc. No dia da minha chegada enviei uma mensagem logo cedo, avisando que já estava liberada e iria chegar antes do previsto para fazer o meu check-in. A resposta veio imediatamente, confirmando meu novo horário aproximado de chegada, dizendo que avisariam o front desk imediatamente e que fariam o possível para liberar meu quarto antes. Recebi a notificação de que o quarto estaria livre para early check-in enquanto ainda me dirigia ao hotel. E, de fato, o front desk já sabia de toda a troca de mensagens pelo chat quando cheguei ao hotel e fui rapidamente encaminhada para meu quarto, sem maiores burocracias.

A notificação de que meu quarto havia sido liberado para early check-in chegou durante meu trajeto para o hotel

Depois, já hospedada, nos dias seguintes, o chat continuou servindo para coisas do dia-a-dia de viagem, como pedir informações ao concierge, solicitar reservas ou um balde de gelo para o champagne que tinha comprado. Com respostas sempre imediatas, dia e noite, independentemente do request.

Christian Clerc, o presidente de operações da rede, defende sempre que a conexão humana é o elemento mais importante na experiência de um hóspede Four Seasons – e foi mesmo uma ótima surpresa ver que eles conseguiram de fato aliar esse componente também ao aplicativo, fazendo a tecnologia realmente trabalhar em favor do hóspede de forma customizada, sem que ele se sinta lidando simplesmente com um sistema operacional ou máquina.

A saudação inicial na app mudou logo após o meu check-in

O chat é capaz de traduzir mais de 100 idiomas diferentes (inclusive o português) com resposta em (literalmente) instantes, contra os doze minutos de média da indústria (me disseram que o sistema alerta o staff imediatamente auditiva e visualmente para garantir que nenhuma mensagem seja deixada para trás). Como resultado, diz a rede que o engajamento dos hóspedes tem sido muito mais regular desde o lançamento do chat, com uma média de seis chats por quarto durante a estadia. Well done, Four Seasons. Que sirva de inspiração para o mercado.

 

 

 

 

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A nova flagship dos W Hotels

Um dos impressionantes murais do W Bellevue. Foto de Mari Campos

Criada a partir da chamada “bold attitude” (ousadia) da cidade de Nova York, a bandeira W Hotels da Marriott International sempre provocou, desde seu surgimento, uma disruptura com o cenário da hospitalidade upscale internacional. Do seu icônico botão de serviço “whatever/whenever” para atender o hóspede em qualquer circunstância (hoje marca registrada na hotelaria) ao design bastante provocativo, ao longo de quase duas décadas (e mais de 80 hotéis depois) a marca continua rompendo regras do luxo tradicional na hotelaria em todos os sentidos.

No comecinho de março estive em Seattle, onde a nova flagship da marca foi lançada: o W Bellevue, inaugurado no segundo semestre de 2017, ficou mesmo um espetáculo – e não poderia ser mais diferente do W Seattle, a meros 20 minutos de distância, perfeitamente localizado no centro de Seattle, mas com alguns quartos precisando urgentemente de um extreme makeover.

Fui convidada a me hospedar no novo hotel e gostei muito do que experimentei. O novo W Bellevue tem 245 quartos e design inspirado em uma lake house do noroeste americano – o que justifica, por exemplo, o repetido uso dos tetos A-frame. Mas o jogo de texturas e formatos nos móveis de design e a combinação de cores nos imensos murais nas paredes em quase todos os cômodos não poderia ser mais iconicamente “W”. Aliás, tudo ali combina muito com a nova bossa de Bellevue, um dos destinos dos arredores de Seattle que mais rápida e charmosamente se desenvolve, virando um novo hub de compras, gastronomia e vida noturna para moradores e turistas que visitam a região.

O design do hotel abraça sem pudores a história regional e as belezas naturais que o rodeiam (inclusive nos imensos murais de artistas renomados como Gaia, Lady Aiko e Zio Ziegler), sem abrir mão das inovações tecnológicas nos quartos e nas áreas comuns (tomadas mil, entradas usb mil, tudo se conecta o tempo todo, uma maravilha). Os murais mesclam backgrounds regionais e internacionais, em ambientes que brincam o tempo todo com a ideia de privado e público, grandes espaços e lounges intimistas.  O staff é super jovem e relax, mas ao mesmo tempo extremamente pontual e profissional (fiz ali um dos mais rápidos check-in e check-outs do últimos tempos).

Da recepção ao chamado Living Room (que é quase um playground para o viajante moderno!), o elemento lúdico está em alguns murais com jeito de cartoon, em uma cabine de DJ e mesas de jogos instaladas em meio aos sofás e pufes do super sexy  lounge bar  (com música animada o tempo todo, é claro). Todo esse lado posh contrasta com a sala chamada de “biblioteca”, de cores claras, poesia nas paredes, sempre silenciosa. E há ainda um imenso terraço externo, com móveis que vão de sofás tradicionais à beira da lareira à adoráveis balanços de vime.

Detalhe do quarto do W Bellevue, vista cidade. Foto de Mari Campos

Os banheiros públicos do primeiro andar, apesar de serem identificados por gênero do lado de fora, se fundem todos no mesmo espaço unissex do lado de dentro.  Os corredores dos quartos são adornados com fotos enquadradas de lake houses da região e o design dos quartos continua misturando o sexy (como nos boxes transparentes em banheiros completamente abertos para os quartos) com o lúdico (como no formato da cômoda, cujas gavetas foram propositalmente construídas como se estivessem sido deixadas abertas) – e vista para o lago ou para o skyline de Bellevue, com direito a sofazinho para contempla-la. A academia é gigante e completíssima, e os hóspedes também recebem fones de ouvido e três mapas de corrida diferentes pelo bairro, com diferentes distâncias a percorrer. Mas não há spa.

Na gastronomia, o The Lakehouse é acessível tanto da recepção do hotel quando do mall adjacente e, sob o comando do chef Jason Wilson (vencedor do James Beard), investe pesado no conceito de “farmhouse” da região Northwest dos EUA. Os pratos vêm sem frescuras, mas bem saborosos, e o ambiente é delicioso. É no Lakehouse também que é servido o café da manhã do hotel (à la carte). O downside fica por conta do serviço de quarto, bastante limitado.

No térreo, e também comandado por Wilson, o interessante e discretíssimo Civility & Unrest é um speakeasy lounge que fica escondido atrás do mural gigante de Gaia à entrada do hotel. Vale entrar sem medo, que a mixologia é assunto seríssimo por lá (e o local ganha ares de balada nos finais de semana).

Sou fã de carteirinha de algumas unidades do W, principalmente as que brincam com essa vibe lúdico+sexy, como Santiago, no Chile, ou Verbier, na Suíça. Mas no W Bellevue mesmo ficou claríssimo, já à primeira vista, porque ele passará a ser o flagship da bandeira – inclusive pelo serviço realmente cinco estrelas que, sejamos bem francos, não é todo W que tem.

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Hotel não é apenas para dormir

Preview do novo Four Seasons que abrirá suas portas em breve em São Paulo | Foto de divulgação/Four seasons

Seja bem-vind@! Aqui é a Mari Campos. Sou jornalista especializada em turismo e hotelaria de luxo e é um prazer ter sua companhia aqui nestas páginas, a partir de agora. 

Esta coluna Hotel Inspectors é um projeto idealizado e assinado por alguém apaixonado por turismo, hotelaria e o mercado de hospitalidade em geral, com larga experiência profissional na área. Mas, antes disso, foram também muitos anos de viagens puramente por paixão e por prazer – que seguem tomando boa parte do meu ano até hoje.

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Como freelancer especializada neste nicho, colaborando com diversas publicações diferentes no Brasil e em outros seis países, hoje, percorro o mundo em busca de novidades, experiências e hospedagens interessantes que possam virar boas histórias. Durmo em inúmeras propriedades diferentes ao longo de um ano e sigo acreditando 100% que hotel não é apenas para dormir.

O projeto do Hotel Inspectors começou em 2017 no Instagram @HotelInspectors, com muita coisa acontecendo no mercado hoteleiro. A Marriott comprou a Starwood. A InterContinental adicionou a Kimpton ao seu portfólio e procura nova bandeira de luxo. A Hilton inovou seu padrão clássico com a Curio Collection, de hotéis independentes com ênfase em arte. Surgiram vários hotéis boutique (embora até hoje se faça tanta confusão com este termo). Hotéis de luxo inauguram semanalmente mundo afora. Brasileiros passamos a valorizar associações e selos, como Leading Hotels of the World, Preferred Hotels, Relais&Châteaux, Traveller Made e Virtuoso.

O artsy The Darcy, novo hotel da Curio Collection by Hilton em Washington DC | Foto de Mari Campos

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Todas as semanas falarei por aqui sobre tudo isso e muito mais. Sempre com base em minha própria experiência, no meu olhar, seja durante viagens a trabalho ou de férias (até porque sim, jornalistas de viagem também gostam – e muito! – de viajar nas próprias férias!).

Nas notícias, relatos e avaliações que você encontrar por aqui, honestidade, ética e objetividade serão sempre regra inegociável. Tudo será experimentado antes, com olhos bem treinados para reconhecer o bom serviço, o bom design e a funcionalidade, itens fundamentais em um bom hotel de qualquer faixa de preço – até porque a vida é boa, bonita e hi-lo, e hotel não é só para dormir – mesmo!

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Acredito fielmente que um serviço cuidadoso, atencioso e, de preferência, surpreendente acaba fazendo toda a diferença no saldo final de uma viagem – assim como tomar um bom banho e descansar bem depois de um dia intenso na rua é fundamental para seguir feliz em qualquer viagem. O quarto pode até ser básico e pequeno – mas se tiver uma cama dos sonhos e uma banheira com vista fica melhor ainda, não? 

Vem que a viagem será gostosa, eu garanto. Será mesmo um prazer ter a sua companhia por aqui.

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