Na última semana o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) autorizou a montagem de uma estátua de Nossa Senhora Aparecida, feita pelo artista plástico Gilmar Pinna, em Aparecida, no interior do estado. Desde 2019 a obra, doada à cidade, por conta dos 300 anos do primeiro milagre atribuído à santa, estava embargada após ação da ATEA- Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos. A entidade alegava que não poderia haver nenhum investimento público, inclusive para a montagem e manutenção da imagem, uma vez que o Brasil é um Estado laico e arrecadação de impostos, pagos por não católicos, não poderia beneficiar nenhuma religião.
Tal imbróglio não é inédito. No passado, para a construção do Cristo Redentor, entidades não católicas diversas, inclusive protestantes, também se colocaram contra a construção da estátua no Rio de Janeiro. Tal questionamento se deu também na construção da estátua de Padre Cícero, no Ceará e na imagem de Santa Rita de Cássia, no Rio Grande do Norte.
A forma encontrada para resolver a contenda jurídica foi baseada no turismo religioso. O desembargador Ponte Neto entendeu que a obra contribuiria para a promoção de Aparecida como destino turístico, atraindo mais investimentos, criando empregos e “melhorando a qualidade de vida dos moradores”. Para completar o argumento, atribuiu-se à estátua um caráter artístico. Tal alegação de arte é sempre lembrada também quando se fala na manutenção das imagens de Orixás no dique de Salvador.
O prefeito de Aparecida explica que a cidade, reconhecida internacionalmente pela comunidade católica apostólica romana, como uma capital mariana, atrai cerca de 13 milhões de peregrinos por ano. No ano de 2020 quando as atividades religiosas no Santuário foram suspensas, a arrecadação caiu cerca de 80%.
Diferentemente do perdão das dívidas de igrejas que não encontra nenhuma justificativa econômica, certas construções e benfeitorias (em patrimônio histórico religioso) se colocam como investimento turístico. Assim foi com a sinalização dos terreiros tradicionais de candomblé em Salvador, nos templos de Cotia e do Templo de Salomão, da Igreja Universal do Reino de Deus, em São Paulo. Assim se dá em muitas cidades pelo mundo: de Jerusalém a Ouro Preto. É inegável a movimentação que tais empreendimentos promovem nas comunidades. De bares e restaurantes até lojas de souvenires.
A ATEA, inclusive, neste momento da decisão judicial, não sabe se pretende entrar com recurso. Especialistas afirmam que os números econômicos apresentados pela defesa e a construção da peça jurídica, em cima do turismo religioso, tornam a causa praticamente perdida.
Não há nenhuma dúvida sobre a importância do turismo como gerador de empregos diretos e indiretos, sobretudo para mão de obra menos qualificada. Tampouco se duvida de seu potencial econômico, respondendo entre 7% a 84% do PIB de certas comunidades. O turismo serve até mesmo de argumento para quiproquó jurídico. Por que segue então recebendo tão pouca atenção das autoridades? Eis aí um mistério, nada divino.
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