10 Festas Populares para conhecer melhor Portugal (parte I)

Mês passado o Porto parou para comemorar o Dia de São João, de longe o feriado mais importante do ano na cidade. A minha visão dessa festa vocês puderam ler neste post aqui. Eu gostei tanto dessa coisa de farrear na rua que resolvi me aprofundar no tema, já que em cada rincão de Portugal as cidades possuem seus próprios santos e padroeiros a serem homenageados.

Fui então celebrar a festa de Freamunde, a 50 quilômetros do Porto. Assim como no Rio de Janeiro, São Sebastião é o padroeiro da pequena cidade do concelho de Paços de Ferreira, onde entre 5 e 10 de julho são comemoradas as Sebastianas – por conta do inverno, a data é empurrada para julho, ignorando o habitual 20 de janeiro.

Essa experiência foi incrível por me mostrar o quão importante são essas reuniões populares por aqui, independentemente do tamanho da cidade. Era nítido que as pessoas haviam passado o ano esperando para brincar sua festa favorita, fosse no Porto, a grande cidade, fosse em Freamunde, a terrinha de menos de 10 mil habitantes.

Por isso resolvi pesquisar outras festas e lugares para visitar em Portugal durante o verão, período em que as comemorações explodem em cada canto do país. Neste post, dividido em duas partes, eu listo as 10 festas populares portuguesas que você não pode deixar de fora do seu calendário:

Os famosos bailaricos de São João, que embalam os portuenses até a madrugada

São João (Porto)

Tá bem, eu sei que eu tenho um post inteiro só sobre o São João no Porto, mas eu me recuso a fazer uma lista como esta e não incluir a festa que participei somente uma vez e já sou grande fã.

Martelos de borracha em mãos, sardinhas na grelha, cerveja no copo e todos na rua. É assim que o Porto vive o dia 23 e, principalmente, a virada para o dia 24 de junho, dia de São João (que, aliás, não é o padroeiro oficial do Porto). As festas se espalham pelas freguesias da cidade e as pessoas saltam de bairro em bairro, como em uma via sacra, para comemorar. O ápice do São João ocorre à meia noite, quando todos se aproximam da margem do Douro para apreciar um incrível show de fogos de artifício.

As famosas vacas de fogo de Freamunde (Divulgação/Associação Sebastianas Freamunde)

Sebastianas (Freamunde)

Diferentemente das grandes festas do país, que têm reuniões espalhadas por toda a cidade, as Sebastianas acontecem em local determinado, no centro de Freamunde, durante o segundo final de semana de julho.

Está lá todo o arsenal de entretenimento português para festas populares. Isso inclui comidas salgadas e doces, muita cerveja e vinho, divertimentos (brinquedos temáticos) e shows.

O viés religioso da festa ocorre durante o dia, em procissões. Mas é de noite que a grande marca das Sebastianas acontece, com uma ensurdecedora queima de fogos de artifício e as tradicionais “vacas de fogo” – que envolve uma pessoa carregar nas costas um barril cortado ao meio (a vaca) que dispara foguetes a todo lado para a diversão (e temor) dos presentes.

A tradicional corrida de garranos, em Ponte de Lima (Flickr/Rui Pedro Costa)

Feiras Novas (Ponte de Lima)

No extremo norte de Portugal, perto da divisa com a Espanha, uma ponte corta o rio Lima. Literais que são, os portugueses fundaram ali a cidade de Ponte de Lima (quase 900 anos atrás!). Essa é a terra das Feiras Novas, que acontecem todo segundo final de semana de setembro.

Com quase 200 anos de história, a celebração em homenagem a Nossa Senhora das Dores surgiu de um decreto de Dom Pedro IV (que no Brasil é o nosso Dom Pedro I). A festa se volta para a cultura popular de Portugal, por isso música e folclore são pontos altos das Feiras Novas.

Como é praxe, também há show de fogos de artifício, além de concursos pecuários, corrida de garranos (uma raça portuguesa de cavalos), cortejos, grupos de bombos (tambores tradicionais) e os familiares gigantones e cabeçudos, que para o olhar brasileiro carregam grandes semelhanças com os bonecos de Olinda.

Flores e pães ornamentam os tabuleiros de Tomar (Flickr/Jaime Silva)

Festa dos Tabuleiros (Tomar)

Assim como a Copa do Mundo, a Festa dos Tabuleiros também é realizada de quatro em quatro anos. Por conta disso, a expectativa para cada edição é enorme conforme se aproxima o ano de desfilar pelas ruas da cidade do Centro de Portugal. Para a sorte do leitor que está programando férias futuras, a próxima Festa dos Tabuleiros ocorre já em 2019.

No ano que vem, de 29 de junho a 8 de julho, Tomar estará colorida pelo povo carregando seus tradicionais tabuleiros. Sobre suas cabeças, as mulheres caminham com uma espécie de pilar adornado com flores, pães e espigas, algo que dizem ser uma lembrança das antigas festas das colheitas. Ao seu lado acompanham homens, trajados com roupas tradicionais.

Durante os dez dias de celebrações, diversos cortejos preenchem as ruas da cidade, que por conta da festa se fecham para veículos. Nestes desfiles se destacam o Cortejo dos Rapazes (para os pequenos das escolas locais), Cortejo do Mordomo (a entrada na cidade dos bois de sacrifício – que não mais são sacrificados, que fique claro) e o Grande Cortejo (no domingo final).

Na véspera do Grande Cortejo, os participantes se encontram no estádio municipal de Tomar para os Jogos Populares Tradicionais, que consistem em disputas de corrida de bilhas e pipas, tração de cordas (cabo de guerra), subida de pau ensebada e chinquilho (uma espécie de bocha com discos).

Lugar de destaque para Nossa Senhora dos Remédios, na Procissão do Triunfo, em Lamego (Divulgação/A Romaria de Portugal)

Festa dos Remédios (Lamego)

É preciso muita confiança de que sua festa é boa para chamá-la de “A Romaria de Portugal”. As festas em honra de Nossa Senhora dos Remédios, em Lamego, são assim conhecidas pela população local, que divulga esta ser “uma das mais grandiosas do país, na qual os rituais religiosos e profanos se misturam numa harmonia perfeita”.

Pois bem, aí está o resumo. As caminhadas religiosas têm papel fundamental, como no ápice das celebrações: a Procissão do Triunfo (8 de setembro), quando imagens sagradas são puxadas por carros de boi.

O outro lado da comemoração conta com uma programação de shows e desfiles, como a Marcha Luminosa e a Batalha das Flores. Neste ano, a festa de Nossa Senhora dos Remédios acontece entre 23 de agosto e 9 de setembro. Lamego, para quem não sabe, é uma cidadezinha do Norte de Portugal, não muito distante do Porto e bem próximo do curso do rio Douro.

Estas foram as primeiras cinco festas populares portuguesas que resolvi destacar. Como o post ficaria muito longo com todas as celebrações que pesquisei, acabei por dividi-lo em duas partes. Fique ligado no blog para a próxima postagem!

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Mimo, um jeito brasileiro de fazer música na Europa

Público em peso para o show do Baiana System no Mimo Festival 2018

Originalmente pernambucano, orgulhoso olindense por nascimento, o Mimo Festival ganhou o Brasil desde sua estreia, há 15 anos. Batucou também por Recife, João Pessoa, Ouro Preto, Tiradentes, Paraty e Rio de Janeiro antes de desembarcar em terras portuguesas, em 2016.

Escolheu como sede a extremamente aconchegante Amarante, a nordeste do Porto. Sua terceira edição aconteceu neste final de semana e com um line up incrível (e, importante, gratuito), foi impossível dizer não para essa viagem de apenas 45 minutos de ônibus (Rodonorte, € 8 por trecho).

Rio Tâmega visto da área em que parte do público acampou

Amarante por si só já é um baita destino turístico, principalmente pelo centro histórico, pelas construções medievais, pelas igrejas barrocas e pelo Mosteiro de São Gonçalo, que tem uma igreja em que a visita é tida como obrigatória. A calma que a cidade transpassa, refletida nas águas do rio Tâmega e no ritmo interiorano do amarantino também valem o destaque.

É neste cenário em que se encontra o Mimo e seus três dias de intensa programação, com apresentações musicais toda noite e dias compostos por tantas outras atividades, como uma mostra de cinema (com 13 filmes nesta edição), fórum de ideias, poesia, oficinas, workshops e exposições.

Como muitos fazem, acampar na própria cidade de Amarante foi a minha escolha. O Parque de Campismo de Penedo da Rainha é o único camping local (€ 10 por dia) e tem uma estrutura exemplar, com restaurante, bons banheiros e chuveiros, além de acesso direto a uma área remota do rio Tâmega. O único porém é a caminhada de 30 minutos para o palco do Mimo, o que pode ser estafante ao final dos shows, lá pelas 3h da madrugada.

No camping de Penedo da Rainha, acesso direto ao rio

Muita gente também acampa em áreas abertas da cidade, às margens do Tâmega e mais próximos do centro. Para os dias do festival as autoridades locais fazem vista grossa e permitem a estada. Apesar da falta de estrutura que o camping proporcionaria, o lugar privilegiado e o clima de segurança que a pacata Amarante oferece validam essa possibilidade de alojamento. Hotéis, hostels e o bate e volta desde o Porto são outras opções.

Apesar de totalmente gratuito, o Mimo possui estrutura que não perde em nada para os grandes e caros festivais da alta temporada. Isso é sentido na grande oferta gastronômica, com food trucks de todos os tipos, nos banheiros quase sempre sem fila e num sistema de som respeitável.

Como minha presença em Amarante foi especificamente voltada à música, é também de música que falo neste texto. O cartaz do festival prioriza artistas que cantam em língua portuguesa, com representantes em 2018 de Brasil, Portugal e Moçambique, mas não exclui participantes de outros locais, como China, Mauritânia, Israel e Estados Unidos, por exemplo.

Dona Onete, rainha

O Brasil foi destaque na primeira noite do festival, com as apresentações marcantes da entidade paraense Dona Onete e seu delicioso carimbó, seguida pelo frenético batuque eletrônico do Baiana System. Compartilharam o palco neste dia, mantendo alto o nível das exibições, os moçambicanos do Timbila Muzimba e os portugueses do Dead Combo.

No dia seguinte, passaram pelo Mimo os brasileiros Almério e Otto, além do veterano e favorito dos portugueses Rui Veloso. Quem encheu os meus olhos, no entanto, com a proposta de mescla entre rock, pop e a música tradicional de seu país, a Mauritânia, foi Noura Mint Seymali.

O encerramento do festival foi em grande estilo. Havia muita expectativa sobre o concerto do bósnio (ou iugoslavo, como prefere se definir) Goran Bregović. O músico confirmou o porquê da excitação em torno de seu nome e fez um show que, de fato, mexeu com os presentes. Música pulsante, instrumentos em sintonia e vocais riquíssimos fizeram da apresentação uma das minhas favoritas de todo o festival – acabando com a deliciosa versão de Bregović da aclamada Bella Ciao.

Pôr do sol em Amarante

O Festival Mimo volta no ano que vem e já possui datas confirmadas. Ao longo do ano a programação será divulgada, mas é certo que em 26, 27 e 28 de julho de 2019 boa música estará mais uma vez tocando em Amarante. Para dar um gostinho do que foram esses três dias de shows, dá uma olhada no vídeo oficial do Mimo 2018.

Se o texto ainda não te convenceu, eu escrevo aqui sobre o quão rico de atividades como o Mimo são os verões na Europa. Não deixe de dar uma olhada em posts passados e acompanhe a jornada do Viajante 3.0 pela blogosfera da PANROTAS e também pela conta no Instagram.

Uma galeria de arte em alto mar

Juntos, corredores nos déques das suítes possuem cerca de 400 obras em exibição (Assaf Pinchuk/Artlink)

Quem acompanha o blog sabe que em maio passado eu estive a bordo do Seabourn Ovation, em seu cruzeiro inaugural pela Itália. Após mostrar os bastidores do navio e questionar uma certa ânsia por exclusividade que presenciei na viagem, escrevo agora sobre um dos pontos que mais me chamaram a atenção nas bem decoradas áreas da embarcação: a arte.

Tal Danai, da Artlink (Divulgação/Artlink)

Com 12 déques em sua totalidade com bares, restaurantes, spa, cassino, halls, corredores e muitas dezenas de outros espaços, adornar um navio de cruzeiro de luxo não é das tarefas mais simples. Coube ao israelense Tal Danai, diretor da Artlink, empresa especializada em curadoria de arte, escolher artistas e obras para o Ovation. O trabalho é realmente complexo, para se ter uma dimensão do desafio, a equipe de Danai buscou artistas em cinco continentes, selecionando 120 nomes que, juntos, disponibilizaram mais de 1,6 mil obras para o navio.

De mapas estilizados a fotografias conceituais, passando por cerâmica e arte em vidro, para definir a história que o Ovation queria contar, foi preciso de muita pesquisa e proximidade com o designer responsável pelos interiores do navio, Adam Tihany. “Ao longo dos anos, nossas equipes desenvolveram um complexo processo criativo e inspiracional”, disse Danai. “Muitas vezes, a discussão foi mutuamente inspiradora, quando as duas escolas, o design interior e a arte, foram reunidas em um esforço conjunto pelo aperfeiçoamento mútuo”, complementou, lembrando que este é o quarto navio em que trabalham juntos.

Cultura contemporânea na tradicional cerâmica oriental. Este é Luck (+), obra do coreano Yoo Eui Jeong (Assaf Pinchuk/Artlink)

Em um projeto curatorial como este, uma junção de fatores define que tipo de artista e arte estarão a bordo do cruzeiro. Nesse sentido, tem um papel importante as diretrizes passadas pela Seabourn e, é claro, o perfil do viajante da armadora. “A coleção de arte para qualquer projeto é o resultado de um diálogo entre o proprietário, os designers e os consultantes de arte. Reunimos a visão de cada uma dessas partes e nosso trabalho é costurá-las em uma narrativa, a qual é traduzida em uma coleção que ecoa e expande ideias.”

Sobre os passageiros do navio, o diretor da Artlink afirma que “o trabalho curatorial supõe que todos aqueles que cruzarão com nosso trabalho possuem uma sensibilidade natural para o que tem qualidade e é genuíno. Nós acreditamos que a boa arte eleva e inspira pessoas, por isso buscamos introduzir arte que realce a experiência de seus espectadores”.

Black Coral, por Valéria Nascimento (Divulgação/Seabourn)

Esse é o caso do Sushi, restaurante de comida nipônica do Ovation. A experiência local não se restringe a olfato e paladar, invadindo também a esfera visual do presente com obras que remetem ao universo marinho. Dentre elas, se destaca o trabalho da brasileira Valéria Nascimento. Com a delicadeza da porcelana pigmentada, a artista criou no espaço uma áurea de fundo do mar ao reproduzir em mural a sua versão de um recife, na obra assinada como Black Coral.

Detalhe da obra de Valéria Nascimento (Assaf Pinchuk/Artlink)

A pluralidade de vozes promovida pela centena de artistas e todas as suas variadas escolas representadas certamente não é um resultado ocasional – nem o efeito que isso causa no viajante. “A curiosidade pelo novo, pelo diferente e pelo desconhecido sempre foi um motivo essencial para que pessoas entrassem em navios para experiências além do familiar”, afirma Tal Danai. “A gente supõe que a força motriz de uma viagem é o embarque em uma jornada interna e externa. A arte pode contribuir com referências, pontos de vista alternativos, momentos de reflexão e experimentação de culturas estrangeiras.”

Mapas incomuns ganham a atenção dos olhos daqueles que caminham pelo Seabourn Square, principal área de convívio do navio, no déque 7. A cartografia estilizada com recortes de livros, atlas e fotografias em formato de pássaros, intitulada Migratory Species I, é assinada por Barbara Wildenboer. A Artlink interpreta que, “pelo processo de alteração de livros, a artista enfatiza o entendimento do observador sobre os termos abstratos da ciência por meio de metáforas e da dita autoridade do texto”.

O mapa do globo sob o olhar de Barbara Wildenboer, em Migratory Species (Assaf Pinchuk/Artlink)

Valéria Nascimento e Barbara Wildenboer são exemplos de que “a arte a bordo oferece narrativas distintas para que os passageiros se conectem”, como conta Danai. “Os corredores das suítes do Ovation, por exemplo, expõem quase 400 trabalhos que foram cuidadosamente selecionados para retratar impressões pessoais de viajantes imaginários.” “Muitos dos trabalhos são imagens de lugares, de viagens e de impressões pessoais, evidenciadas em um pensamento oculto, como em um bordado destacando a pétala de uma rara flor, ou o verso do poema favorito escrito na representação de uma ave exótica”, finaliza.

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