Sem vistos à vista

Como a volta da exigência de vistos proposta pelo Ministério das Relações Exteriores pode prejudicar a retomada do turismo dentro do Brasil

O Ministério das Relações Exteriores vai voltar a exigir vistos para que pessoas dos Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália entrem no Brasil a partir de outubro deste ano. Dificultar o acesso de estrangeiros dessa maneira e nesse momento traz não poucas consequências. Entre elas, prejudica também o processo de reconstrução do mercado interno de viagens, justamente quando as pessoas voltaram a consumir esse tipo de serviço após os anos de pandemia. Diante de novas barreiras para a entrada no país, as agências de viagens, os hotéis e as companhias aéreas perdem importante receita, uma vez que quem vêm desses países são consumidores dos produtos e serviços vendidos pelas marcas nacionais. 

Os números

Os dados da Polícia Federal e do Ministério do Turismo mostram o reaquecimento da entrada de turistas no Brasil. No ano de 2019, por exemplo, cerca de 6,4 milhões de estrangeiros vieram para cá. Em 2020 e 2021, anos em que a crise sanitária tirou vidas e redefiniu a economia, foram 2,1 milhões e 700 mil, respectivamente. Esse cenário começou a mudar a partir de 2022, com a chegada de 3,6 milhões de pessoas de outros países. A retomada, portanto, é atingida duramente pela decisão do Ministério das Relações Exteriores, comprometendo as previsões positivas de recuperação.  

Globalmente, são grandes os desafios de crescimento da indústria de viagens, especialmente a ampliação da oferta de assentos em voos internacionais, que requer um fluxo de saída e entrada de pessoas para manter operações saudáveis. No caso do Brasil, ainda não atingimos o patamar de oferta de voos internacionais pré-crise.

Além do longo trabalho de recuperação da imagem do Brasil nos mercados emissores, temos o desafio de eliminar barreiras e construir um caminho acessível para que os estrangeiros nos visitem, tragam receitas e colaborem com nossa receita cambial.

Na força-tarefa setorial, a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), a Braztoa (Associação Brasileira das Operadoras de Turismo) e outras entidades mostram, por meio de dados que o tema merece, uma reflexão mais profunda e mais ampla. Em janeiro deste ano a Polícia Federal registrou a entrada de 868 mil turistas estrangeiros em todo o território nacional. O resultado foi inclusive considerado histórico na comparação com os últimos anos. Trata-se de um número 109% superior a dezembro de 2022. As projeções do Euromonitor para os próximos anos mostram a chegada anual de mais de 800 mil norte-americanos ao Brasil, com uma receita média por viagem de US$ 800.

Um dos argumentos para tornar menos simples a entrada das quatro nacionalidades é de que a isenção não surtiu efeitos dentro do país – algo discutível, levando-se em conta que a medida teve início em 2019 e foi seguida por um lockdown global a partir de 2020 por conta da Covid-19. Portanto, o que se sugere do Ministério das Relações Exteriores é uma análise mais profunda do assunto, permitindo um tempo maior de análise dos resultados dos impactos negativos do retorno da exigência dos vistos a esses visitantes. Pelas previsões e números deste início do ano, fica evidente que o setor está vivendo uma retomada. O esperado é que o Brasil traga para a mesa formas de atrair estrangeiros e não crie barreiras que dificultem a entrada de turistas internacionais. 

No visa? Less tourists

brinBrasil, Rússia, Índia e Nigéria: o que os quatro países têm em comum? Acredito que se realmente quisermos pontuar semelhanças de cultura, geografia, identidade social etc., encontraríamos várias. Mas o que me refiro aqui, já respondendo à pergunta, é ao título de serial underperformers, atribuído ao quarteto recentemente.

O termo pode ser explicado como uma definição daquilo que tem ou teve uma performance aquém do esperado, apresentando mau desempenho de forma sequencial, ou seja, nas diversas atividades e/ou análises a que foi submetido.

Durante esta semana, Brasil, Rússia, Índia e Nigéria foram pauta de economistas mundo afora por serem países emergentes que estão falhando na capitalizar seu potencial de turismo, de acordo com pesquisa feita pelo banco de investimento Renaissance Capital.

De acordo com dados do FMI, os números das receitas turísticas de 2015 são: o equivalente a 0,3% do PIB para o Brasil; 0,6% para Rússia; 1% para a Índia e apenas 0,1% para a Nigéria. O WTTC – World Travel & Tourism Council por meio de estudo da Oxford Economics diz que o PIB direto do turismo no Brasil é 3,1%.

É indiscutível que o turismo é uma das atividades econômicas mais importantes do Brasil e independente do seu tamanho atual existe consenso de que pode ser muito maior do que é. Parece brincadeira, mas, sobre o Brasil, para o economista-chefe do Renaissance, Charles Robertson, o fraco desempenho do Brasil é “difícil de explicar”. Enquanto nós, por aqui, dizemos que é “difícil de entender”. E o assunto é sério: basta ter acesso às projeções do setor no país e fazer uma breve análise do tipo de estratégias de mudança que estão sendo aplicadas para desenvolver o turismo.

De uma forma geral e quase unânime, a questão da burocracia e custo dos vistos é um dos principais fatores para a fraca contribuição do turismo no PIB desses países; seja pelo orgulho por conta da não reciprocidade até pela falta de atualização das políticas e termos que regem a administração de vistos.

Segundo projeções da WTTC, a receita do Brasil para o turismo ainda vai declinar 1,6% em 2016 e retrair mais 0,5% em 2017. A boa notícia é que a projeção para 2020 é de crescimento de 2,4% na contribuição do PIB nacional.

Brasil, Rússia, Índia e Nigéria. Poderíamos intitular este post (e não é por falta de vontade) de “Quarteto Fantástico”, porém, o que temos de extraordinário mesmo, por enquanto, é o quase inexplicável baixo desempenho de quatro países onde sobram o potencial de turismo, riqueza de cultura e belezas naturais.

Por ora, ainda não dá pra levantar um brinde à receita do turismo no PIB desses países e o quadro só vai se transformar quando concordarmos que a maneira com a qual conduzimos o turismo no Brasil precisa mesmo ser revista. Sim! E quando aprimorarmos nosso sistema de estudos e pesquisas para medir exatamente quantos turistas temos.