Recentemente em um almoço para recepcionar a delegação de Lisieux que esteve no Brasil, Amadeu Castanho, decano do turismo religioso, provocou uma importante reflexão, a partir dos comentários feitos pela portuguesa Maria Rodrigues, responsável pelo Santuário Francês de Santa Terezinha do Menino Jesus. Disse ele : “há uma brutal diferença entre turismo religioso e turismo para destinos religiosos, mas o mercado não está suficiente maduro para alinhar os dois conceitos. “
Maria se queixava que grupos de devotos que visitavam o Santuário e os locais em que a santa francesa viveu, não tinham uma experiência espiritual satisfatória e muitas vezes voltavam frustrados ao Brasil, embora uma estrutura religiosa esteja à disposição dos fiéis, como irmãs brasileiras para acolhê-los e até a possibilidade de padres realizarem ofícios na cidade em que Santa Terezinha nasceu. Uma experiência completa, segundo especialistas, exige ao menos 3 dias na região, inclusive para se aproveitar toda a oferta gastronômica. Em geral, as visitas se dão em três horas. Dada a proximidade com Paris, faz-se um bate volta. E nisso se perde visita a Alençon e até Pontmain, um dos mais importantes lugares de aparição Mariana.
Tudo isso porque o roteiro não foi pensado para ser uma viagem religiosa. Cria-se pacotes seguindo, em geral a mesma lógica tradicional de visitar, ainda que superficialmente, o maior número de pontos turísticos para fotos e compras de suvenires. O famoso carrossel com 20 países em 14 dias.
Turismo religioso é um turismo de experiência transcendental. Uma jornada de encontro com elementos sagrados de cada turista e, mais do que isso, de reencontro pessoal. E tal atividade não se dá com um guia cronometrando os minutos e, com seu guarda-chuva, apito ou placa, empurrando os visitantes de um lugar para o outro para que se cumpra o roteiro. Além disso, é preciso muito repertório para que haja o famoso encantamento. No caso do Brasil, Santa Terezinha se popularizou muito por conta das escolas que são dirigidas, ainda hoje, por freiras. Poucos católicos, no entanto, apesar de recorrerem à santa em suas orações e devoções, sabem de sua vida, dos milagres que realizou. Ao visitar o norte da França, registram os momentos com os celulares, mas não com os corações e memórias afetivas. Tampouco voltam conhecendo mais sobre a trajetória da mais jovem doutora da Igreja Católica.
Estamos falando de França, mas poderíamos falar de Itália, Portugal, India, Nepal ou Israel. Turismo religioso não é apenas visita de lugares históricos: é seguir passos de líderes espirituais, entender o espaço e a realidade que viveram e se conectar com seus ensinamentos e a presença na vida de cada viajante.
Tal confusão se dá porque falta fiéis profissionais de turismo ou profissionais de turismo especializados em religiões. Você não precisa professar uma ou outra crença para trabalhar com viagens de fé. Mas precisa entender de história e religião. Mais uma prova do diletantismo que é característica da indústria de viagens em nosso país. É claro que há mercado, caso contrário, delegações de destinos religiosos não viriam há anos, ininterruptamente ao Brasil para abrir frentes e manter relacionamentos. O potencial turístico religioso não para de crescer, porque ao contrário do que se dizia no início do século XX a religião não vai acabar, vai mudar de perfil e seu campo de atuação. O que falta é estudo, planejamento e competência para maior parte dos profissionais que desejam atuar na área. Oportunidades não faltam.
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