Direto de Paris distrações e esperanças

A França continua seu processo de « desconfinamento » progressivo. Parisienses e franceses redescobrem felizes esse semblante de retomada à vida, deixando lentamente para trás os piores capítulos dessa tragédia infinda.

Apesar da inconveniente restrição de locomoção há mais de 100 quilômetros de suas residências, dos bares e restaurantes ainda fechados, das medidas de distanciamento social, do triste luto, das desastrosas perdas financeiras, os pesares causados pelo Codiv-19 parecem se dissipar um pouco enquanto as pessoas buscam retornar a uma pseudo normalidade.

As notícias apresentam mudanças a cada dia. Enquanto escrevo o governo prepara a segunda fase desse processo de “desconfinamento” em função dos resultados numéricos.

Alguns franceses aguardam para saber quando abrirão seus estabelecimentos, outros quando cessará o sistema home office de trabalho, outros querem saber se poderão viajar fora do território francês durante as férias de julho e agosto ou ainda se seus filhos terão aulas em junho.

Neste mar de incertezas vamos flutuando como podemos. Cada um se apega aonde dá .

Justamente! Cada um busca consolo moral onde pode. E como minha bóia durante esse processo foi a própria cidade de Paris compartilho com vocês imagens desse percurso de 2 meses entre confinamento e redescoberta da “liberdade”, ainda que uma semiliberdade condicional.      

Projeto 1 hora e 1 km

Como mencionado em postagem anterior, o Francês teve durante o confinamento o direito a uma saída diária e o deslocamento num raio de um quilômetro de sua residência. A burocracia exigida para esse deslocamento através da obrigatoriedade de apresentação de atestado justificativo e a presença massiva de imponentes policiais controlando e multando nas ruas serviam como agentes dissuasivos para as escapadas. Assim, em dois meses, eu sai aproximadamente 8 vezes.

As notícias dos óbitos, a insegurança continua, a tristeza rebentando pediam alívio.

E foi nestes momentos de desespero que encontrei distração descobrindo que 1 hora e 1 km são suficientes para qualquer pessoa se apaixonar por Paris.  

Vejam algumas imagens do meu projeto 1 hora, 1 km:

Portas e Portais

Perspectivas

redescobertas

Passagens

Encontros

A Arte

O Rio Sena

O Louvre

E assim, a beleza da cidade me ajudou a passar pela tristeza dos acontecimentos. Como Paris é linda!

No entanto, acho mesmo que serão as imagens à seguir que trarão à você uma luz de esperança.

Neste retorno parcial à normalidade, as lojas com menos de 40 000 mil metros quadrados estão abertas, pequenos museus igualmente, alguns castelos também começaram a receber visitantes, restaurantes fazem pronta entrega.

As fronteiras da França com a Europa devem abrir completamente em julho, assim como os grandes museus e atrações.

Para você que está em meio ao confinamento, espero que as imagens tenham lhe distraído um pouco também. E peço: querido leitor, tenha paciência e não perca as esperanças. Como dizem os italianos: Chi va piano, va sano e se va lontano.

Air France se prepara para o “desconfinamento”

A França começa a se preparar para o “desconfinamento” progressivo. Comerciantes retornam aos seus negócios para tirar a poeira, marcar o solo com “scoth tape” designando o distanciamento obrigatório entre as pessoas e balcões, verificar o estoque etc.

A companhia aérea Air France também se prepara para a retomada de boa parte seus vôos no espaço Schengen a fim de assegurar seus clientes que estão prontos para o desafio, garantindo condições sanitárias seguras.

Para isso, seus aparelhos serão completamente pulverizados com um produto desinfetante de largo espectro e duração a cada cinco dias. Além disso, as áreas limpas com paninhos desinfetantes serão mais vastas. Hublôs, compartimentos para malas de mãos externa e internamente, cintos de segurança e todos os pontos de possíveis contatos com as mãos dos passageiros serão desinfetados sistematicamente.

O uso de máscaras dentro da cabine será obrigatório, tanto para os tripulantes como para os passageiros.  Álcool-gel será oferecido no momento de embarque.

Os deslocamentos dos passageiros dentro do aparelho deverão ser feitos com menos freqüência evitando contato de proximidade. Em outras palavras: nada de bate papo nas filas contra as portas dos banheiros.   

A distribuição de lanches ou refrigerantes será abolida para os vôos com menos de 2h30. Para os vôos de longa distância toda comida será servida em embalagens plásticas juntamente com a água, limitando assim o serviço de bebidas.

A empresa destaca também a capacidade regenerativa do ar de seus filtros empregados em seus aparelhos. 50% do ar vêm do exterior antes de se misturar ao ar já existente na cabine. 99,97% do ar é completamente filtrado.  Em sua campanha de comunicação a Air France reitera igualmente que esses filtros são idênticos aqueles utilizados em hospitais.

  Vejo o vídeo da Air France realizada para o Jornal Figaro clicando aqui.

A notícia da retomada à vida normal do país é acolhida com certa precaução pela população, mas, sobretudo com muita alegria. Aparentemente toda epidemia segue uma curva em formato de sino, e após dois meses de confinamento estamos chegando lá!

Coragem queridos leitores, no Brasil isso também ocorrerá!  

É normal se sentir estressado, triste, frustrado ou ter medo durante uma crise. Fale com amigos, familiares e entres queridos em que você confia.

O confinamento e o essencial através do mundo

A grande maioria do planeta está confinada. Aparentemente a vida de muitas pessoas está se transcorrendo de maneira similar, eu cheguei ingenuamente a achar que confinamento significava na França a mesma coisa que no resto do mundo.

Foi falando com amigos e especialmente amigos brasileiros que descobri o contrário. De fato, bastava refletir um pouco para imaginar que cada pessoa e cada país reagiriam com seus traços culturais e dispositivos governamentais característicos às suas raízes.

Nesta imensidão de seres e opiniões, encontramos muitos pontos em comum, mas também muitas diferenças radicais.

Diferenças entre confinamentoS

Uma delas consiste no sentido propriamente dito da palavra ESSENCIAL.  

Na China por exemplo, nada era essencial além da organização governamental autoritarista. Assim, o exército distribuía alimentos aos lares chineses e não houve justificativas para que as pessoas deixassem seus lares durante o confinamento. Em caso de descumprimento a pena era de prisão.

   China pós confinamento – controles constantes

Na França os critérios para sair de sua casa em busca do essencial são basicamente: necessidade de comprar alimentos, ir ao médico, fazer trabalho voluntário, andar com seu animal de companhia ou fazer um pouco de esporte.

As saídas permitidas com essas justificativas são controladas através de uma declaração ou atestado de honra onde consta a múltipla escolha das razões, a hora de saída, seu endereço. Perímetro permitido para a saída 1 quilômetro de distância de seu domicílio; duração máxima 1 hora.

O Atestado de deslocamento pode ser preenchido também on-line e apresentado em caso de controle pelo telefone

Em caso de descumprimento a pena é de multa com valor inicial de 135 euros, valor este que aumenta gradativamente em caso de repetição do delito até a quarta vez e depois prisão.

Os serviços médicos, a cadeia alimentícia e distribuição de gasolina não se incluem nestas normas, obviamente.  A indústria metalúrgica onde trabalha meu cunhado ficou aberta para produzir material hospitalar, mas a construção civil não foi considerada essencial, por exemplo.

Os franceses reagiram como civis em uma sociedade democrática e organizada; a maioria aderiu apesar de certa resistência, no entanto, mediante os policiais que controlam incansavelmente os mais recalcitrantes e a chuva de multas, a sociedade se trancafiou em seus lares. Mesmo assim, mais de 800 000 multas foram emitidas no território desde o dia 17 de março até agora.

Outro fator que colaborou imensamente para o respeito das medidas de confinamento foram os incansáveis pedidos de consideração vindos por parte daqueles que seguiriam prestando os serviços essenciais: médicos e equipes de hospitais (enfermeiras, atendentes, equipes de limpeza), caminhoneiros, lixeiros aproveitaram das redes sociais para passar seu recado: Fique em casa por favor!

População Francesa aplaude médicos e novos heróis da nação

no Brasil a situação me pareceu bastante diferente. Primeiro devido à guerra entre o governo federal e os governadores de estados. Se aqui reclamamos de falta de coerência na gestão governamental e usamos desse pretexto para burlar aqui e ali o confinamento, no Brasil então...

Aí aqueles que servem a nação prestando os serviços essenciais foram usados como argumento político por aqueles em prol de um “desconfinamento”já. O que me pareceu no mínimo estranho. 

Mas polêmicas a parte, o povo Brasileiro é mesmo o herói da nossa nação!

Aqui até a oposição declarou que seria indecente usar da situação para fins políticos, aí nos trópicos as feras estão soltas.

Enquanto isso a noção do essencial depende quase unicamente de cada um. O que dizer de um país que considera a construção civil como atividade essencial em momento de pandemia? Onde nas comunidades desfavorecidas o PCC que se ocupa do bem estar de seus ocupantes?

Já a grande vantagem do Brasil é o senso de ajuda entre as pessoas, o aprendizado contínuo do “se virar” e “dar um jeitinho” protege o país. Criação de cápsulas respiratórias inovadoras, aparecimento de máscaras em profusão, iniciativa. Salve a população brasileira!  

Aqui faltam máscaras, falta álcool-gel e segundo os franceses falta também muita coerência nas medidas governamentais.

A grande polêmica do momento na França é: porque voltamos às aulas dia 11 de maio se os bares e restaurantes ficarão fechados? Se as escolas foram as primeiras instituições a fechar, por que serão as primeiras a abrir? Polêmica esta que vem levando a certo afrouxamento por parte dos pais que agora levam os filhos aos parques e ruas da cidade com maior freqüência. Ué? Eles não vão encarar corredores e salas possivelmente contaminadas pela saliva e coriza geral? Porque os parques e as ruas seriam mais perigosos?

Afinal, dois meses fechados dentro de casa fizeram acreditar aos pais de famílias que as medidas de confinamento foram criadas para nos proteger, mas na realidade foram criadas para resguardar o sistema de saúde público abominável que temos e a imagem de nossos ignóbeis governantes. Acho que este é um ponto em comum entre muitos países.

O retorno à vida normal e o “desconfinamento” eminente nos revelam igualmente as motivações que nossos governantes têm em comum.

Pontos em comum

Dia 13 de março – dia da primeira medida governamental- fechamento das escolas

E falando em pontos em comum, em quase todos os países a ficha demorou em cair e os anúncios de uma gripezinha não assustaram a população em um primeiro momento. O número de óbitos e avisos por parte dos médicos foram fundamentais para a compreensão do problema, ao contrário das declarações governamentais que causaram mais confusão que esclarecimentos.  

Ainda, apesar das inúmeras diferenças na maneira de como lidar com a questão do Coronavírus e do confinamento pelos governantes e pelos humanos deste mundo afora, outro ponto comum importante parece sobressair:

Através do planeta a grande maioria da humanidade descobriu por si só o sentido da palavra essencial: essencial é ter casa, boa alimentação, amor da família e amigos e saúde. 

Mais um ponto comum sobressai entre a França e a China até o momento, tendo em vista a minha reação pessoal e de muitos sindicatos franceses.

Compare com as imagens do vídeo acima – Mês de abril, a ficha caiu

Lembro agora as palavras de meu amigo chinês declaradas nos primeiros dias de confinamento:

Você está reclamando de ter que ficar em casa por ordem governamental, mas fique ligada! Após constatar a gravidade desse vírus e os óbitos, quando a ordem for para “desconfinar”e voltar às ruas, quem não vai querer sair de casa é você!


Nota Cronológica :

23 de janeiro: Primeiros casos de Codiv-19 diagnosticados na França continental

13 março: fechamento das escolas

14 março: fechamento de bares e restaurantes

15 março: eleições municipais são mantidas

17 março: início do confinamento

11 maio: data prevista para o fim do confinamento de maneira parcial- retorno ao trabalho e distanciamento social controlado com severidade.