Vacinação na França: doses perdidas

Vacinação na França- A desconfiança de uma parcela crescente da população em relação à vacina AstraZeneca (Vaxzevria) causa mudança precoce nos critérios de idade para aplicação da mesma.

A boa notícia é que cada vez mais franceses querem se vacinar. Inicialmente reticentes, os franceses desejosos em se vacinar representavam em dezembro somente 42% da população, agora são 70%. Apenas 14% das pessoas irredutíveis persistem em não querer nenhuma categoria de vacina.

Apesar disso, há algumas semanas, centros de vacinação sofrem com a perda de muitas doses de AstraZeneca que não encontram a demanda esperada. De acordo com uma pesquisa da Odoxa-Backbone Consulting para o jornal Le Figaro, 71% dos franceses não confiam na vacina britânica. E como a vacinação não é obrigatória…

Peripécias da AstraZeneca na França e na Europa

Em 2 de fevereiro, logo após sua aprovação, a AstraZeneca foi inicialmente reservada para pessoas com menos de 65 anos, devido à falta de dados sobre sua eficácia em pessoas idosas.

Um mês depois, seu uso foi estendido para todas as idades. Então, em meados de março, a vacina foi suspensa durante alguns dias após relatos na Europa de casos de uma trombose muito rara e atípica (coágulos sanguíneos). Entretempo, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) reconheceu que eles estavam ligados à AstraZeneca.

Enquanto isso, a França decidiu, dia 19 de março, injetar essa vacina apenas para aqueles com mais de 55 anos de idade, uma vez que essas tromboses foram observadas principalmente em indivíduos mais jovens.

As autoridades de saúde ainda não anunciaram o que acontecerá com aqueles com menos de 55 anos que tomaram a primeira injeção. Porém, tudo indica que receberão como segunda dose a vacina Moderna ou Pfizer.

Outros países também estabeleceram limites de idade, mas sem necessariamente escolher o mesmo, o que alimenta a confusão. A AstraZeneca, por exemplo, é reservada para mais de 30 anos no Reino Unido, 60 anos na Alemanha ou 65 anos na Suécia. Finalmente essas reviravoltas acabaram por confundir o público em geral.

Reação do Governo Francês

Para evitar o desperdício das doses do precioso líquido que estão terminando no lixo dos centros de vacinas, o governo decidiu que a população na faixa etária acima de 55 anos começe a ser vacinada a partir desta segunda-feira, dia 12 de abril de 2021.

No último calendário de vacinas especificado por Emmanuel Macron durante seu discurso em 31 de março, a vez dos 60 anos viria dia 16 de abril, com acesso a todas as vacinas e a vez dos quincagenários estava prevista apenas para dia 15 de maio.

Com a nova diretriz governamental, todas as pessoas com 55 anos ou mais e anteriormente inelegíveis para vacinação poderão ser vacinadas desde já. No entanto, apenas as vacinas AstraZeneca ou Janssen (J-J) estarão disponíveis.

Vacinação na França: Janssen (J-J)

A França se prepara para receber 500.000 doses da vacina Johnson & Johnson que utiliza a mesma tecnologia que a AstraZeneca. Alertas sobre efeitos colaterais semelhantes aos suspeitos na AstraZeneca foram levantados, e o interesse pela vacina também pode ser afetado. Abrir imediatamente a vacinação para cerca de 4 milhões de pessoas de 55 a 59 anos poderá evitar a perda também dessas vacinas.

Simultaneamente, o tempo entre as duas aplicações das vacinas Pfizer/BioNTech e Moderna (de soro com o RNA mensageiro ) aumentará de quatro para seis semanas a partir de 14 de abril. Tal mudança permitirá o aumento do número de pessoas que receberão a primeira dose rapidamente.

As novas diretrizes de vacinação na França efetuadas para acelerar a vacinação e evitar a perda das vacinas AstraZeneca foram fruto da reatividade “para apagar fogo” que caracteriza o governo Macron. Ambas medidas foram anunciadas pelo Ministro da Saúde, Olivier Veran, no Le Journal du Dimanche (o Jornal do Domingo). Desta vez, não houve tempo para preparar a habitual elocução oficial em rede nacional. Nenhuma dose pode ser perdida, custe o que custe.

Saccage Paris, o hashtag polêmico

Paris – Um novo hashtag criado nesta sexta-feira, 2 de abril, obteve rapidamente milhares de adeptos no Twitter: #SaccageParis

Latas de lixo transbordantes, pilhas de papelão na rua, cones de plástico amarelo deteriorados delimitando ciclovias ou móveis deixados nas calçadas são algumas das imagens vistas no tweets.

Dezenas de milhares de mensagens e fotos denunciam a sujeira da capital francesa sob o atual mandato da prefeita socialista Anne Hidalgo, bem como algumas das escolhas feitas por sua equipe municipal.

Quando questionado pelo jornal Le Parisien, o homem que lançou a hashtag através de sua conta @PanamePropre, no entanto, garante que não segue nenhuma agenda política, reconhecendo simplesmente uma velha proximidade com a UDF, o antigo partido centrista. Ele explicou que tinha feito isso apenas para fazer com que sua “explosão de raiva” fosse ouvida.

reação da oposição

Membros da oposição aproveitaram rapidamente da oportunidade para criticar a gestão do prefeito de Paris.

Marine Le Pen

#saccageparis As milhares de imagens compartilhadas com a hashtag #SaccageParis partem os corações dos amantes de Paris. Parabéns aos parisienses revoltados! A degradação da nossa bela capital pela equipe Hidalgo é um sofrimento nacional que não deve deixar nenhum francês indiferente. MLP

Rachida Dati

#saccageparis: Diante da negação da realidade da equipe municipal, exigimos a realização imediata de um excepcional Conselho de Paris dedicado aos problemas de limpeza e segurança em #Paris.

Paris e a covid-19

De fato, certas circunstâncias contribuem para as condições insalubráveis inegáveis de Paris neste momento.

Visto que as refeições são consumidas exclusivamente ao ar livre encontramos pelas ruas uma maior quantidade de resíduos. Além disso, os terraços de madeira instalados às pressas como resultado das medidas sanitárias no verão de 2020, agora tristemente abandonados, viram suas condições se deteriorar com o inverno.  Hotéis, lojas, restaurantes fechados e ruas vazias, acampamentos de imigrantes sem teto em determinados bairros deixam uma triste impressão para os passantes. 

O movimento online provocou igualmente a reação da prefeita de Paris e sua equipe denunciando nos jornais uma campanha para denegrir sua gestão , com fotos que seriam antigas ou ainda justificando que devido a epidemia de Covid-19 há cortes em cerca de 10% dos serviços responsáveis pela limpeza da cidade.

Esforços da municipalidade

Apesar das reclamações vistas nos tweets, a municipalidade de Paris dispõe de uma equipe de limpeza de 2500 pessoas. Desde 2016 a mesma colocou à disposição dos parisienses um dispositivo chamado “Na Minha Rua”, que os permitem relatar qualquer anomalia no espaço público às equipes municipais, como a presença de resíduos maciços, pichações ou espaços verdes em más condições. 10.000 pedidos são tratados por semana, garante a prefeitura.

Diariamente, mais de 2.900 km de calçadas são varridas e muitos dos 30 000 lixos nas calçadas, espalhados em vias públicas, são esvaziados de 1 a 3 vezes. Em Paris você encontra um lixo público munido com cinzeiro aproximadamente à cada cem metros.

Uma grande frota de “carrinhos aspiradores” é dedicada à limpeza das calçadas da capital francesa. 1.600 km de ruas são aspiradas e lavadas pelo menos uma vez por semana. As intervenções variam dependendo do tamanho da rua e do tipo de atividades. As pistas amplamente utilizadas (avenida periférica, pistas rápidas e subterrâneas.) são limpas à noite, em trechos, a fim de minimizar a interrupção do tráfego. Até as margens do Sena são lavadas toda semana, seja com equipamentos das docas ou de um barco. As pistas ribeirinhas também se beneficiam de uma faxina minuciosa uma vez por mês e após cada inundação do Rio Sena.

Eu me alegro que através das redes sociais sejamos capazes de fazer pressão ao poder público. Acho essencial mesmo.

Porém, não me preocupo com Paris. Sem dúvida a crise do Covid-19 acentuou alguns problemas, como em todos os setores da sociedade este ano.

Como eu já vi Paris passar por muitos sábados de manifestações, por greves de lixeiros, pelas festividades da Copa do Mundo, pela crise econômica de 2008, ou ainda enchentes do Rio Sena e assisti à várias operações de limpeza excepcionais, tenho certeza que esse cápitulo também vai terminar e somente as belas imagens do hashtag Paris ficarão em nossas memórias. #Paris

França: medidas sanitárias, escolas, vacinas.

Bem que eu hesitei em falar das novas medidas sanitárias aplicadas na semana passada pelo governo Macron, anunciadas pelo primeiro ministro Jean-Castex.  Afinal, o governo francês é reativo e muda as normas sanitárias à medida que a situação muda e, devido as novas variantes, a situação não para de mudar .

E agora? As novas medidas, são “novas novas medidas” ou somente uma repetição das medidas da semana passada?

  • Na realidade a medida de toque de recolher às 19 horas e demais regras aplicadas à 16 departamentos na semana passada  agora se extendem a todo território francês, assim como o fechamento dos comércios não essenciais.
  • Deslocamentos de mais de 10km de seu endereço fixo são proibidos, porém, serão tolerados durante o fim-de-semana de Páscoa, permitindo à aqueles que tem casas secundárias de se instalarem fora das cidades.
  • A proibição de reagrupamento acima de seis pessoas em via pública segue em vigor.
  • A novidade é o fechamento das escolas por um mês. Dos quais aproxidamente 2 semanas de aulas on-line e duas de férias escolares.

Todas as escolas da frança metropolitana – creches, escolas primárias, faculdades e escolas secundárias, fecharão na sexta-feira à noite, 2 de abril.

Escolas e a pressão sindical

Na próxima semana, de 6 a 9 de abril, “cursos para escolas, faculdades e ensino médio serão administrados on-line”, disse o presidente, exceto “para os filhos de médicos, enfermeiros e cuidadores e algumas outras profissões, bem como crianças com deficiência”. Entre 10 de abril a 26 de abril, todos os estudantes metropolitanos estarão de férias por duas semanas. Os alunos do ensino fundamental e infantil retornarão à escola em 26 de abril, enquanto os estudantes do ensino médio voltam às aulas on-line por uma semana adicional até dia 3 de maio.

Vale ressaltar que dentre os países da União Europeia, a França foi aquele que menos fechou suas escolas durante a pandemia. As classes foram mantidas desde o fim do primero confinamento no primeiro semestre de 2020, sem pausas, embora os grupos tenham sido divididos e a frequentação escolar intercalada nas escolas públicas em certos momentos. 

O medo de descolarização e marginalização e a observação do disfuncionamento do sistema on-line para estudantes da rede de ensino pública, além das baixas taxas de contaminação entre a faixa etária juvenil motivaram até então a manutenção das escolas abertas.

A educação não é negociável” declarou Emmanuel Macron em seu anúncio desta quarta-feira. Seria esse um recadinho para o sindicato dos professores?

De fato, a França se orgulha de jamais haver fechado suas escolas mesmo durante as duas guerras que vivenciou no século XX.


França 1a guerra mundial 1914 /1918

Revista Pedagógica 1915Agradeço ao meu eminente amigo, o senhor deputado Ferdinand Buisson, pela honra concedida ao oferecer-me a presidência desta brilhante reunião. Tenho o prazer de ser novamente o anfitrião desta nobre casa e seu presidente muito ativo e dedicado, meu honorável colega Sr. Dessoye. Vim prestar homenagem ao heroísmo demonstrado por nossos trinta mil professores mobilizados desde o início da guerra. Citações à ordem, promoções, condecorações, proezas de todos os tipos, lesões, mortes excepcionais: eles se cobriram de glória; coroaram seus ensinamentos com as mais altas das lições, o sacrifício de si mesmo para a Pátria e os Justos; eles adicionaram uma página imortal à história da Universidade da França. Nossas professoras competem com nossos professores em dedicação e coragem. Em todos os lugares elas distribuem suas forças, seus corações para os feridos, doentes, refugiados, crianças...

Vocês conquistaram uma grande vitória, senhores: a escola da República, submetida ao maior teste que uma instituição humana pode passar, ganhou nesta crise a admiração e o reconhecimento de todos os franceses.

Revista Pedagógica 1915_ Conferência da Liga dos Professores discurso do Deputado e membro da Academia Francesa Paul Deschanel

França 1939/45


Desta vez, a pressão do sindicato dos professores em prol da vacinação de seus membros, a pressão dos médicos, o temor das novas variantes e o fechamento contínuo de classes com jovens infectados foram considerados pelo governo razões plausíveis para a tomada de decisão.

Resta aos franceses o prazer de sair de casa e admirar a vizinhança. Com a tolerância anunciada para este fim de semana de Páscoa, as famílias mais abastadas preparam-se para deixar as cidades e os trens estão lotados.

 A liberdade de andar por aí.

Algumas pessoas se surpreenderam com a liberdade de locomoção e a falta de limite para o número de horas passadas ao ar livre e se perguntam as razões dessa medida.

Macron sabe que as notícias de países onde a vacinação está mais avançada chegam à cada dia. E se o povo estivesse fechado em suas casas a frustação seria crescente e sem limites. A saúde mental dos franceses é importante! E o ano que vêm, é ano de eleição.

A luz no fim do túnel.

Medidas sanitárias a parte, sabemos que a saída para toda essa situação está nas vacinas. Se você acha que no Brasil as coisas estão lentas com seus 17 milhões de pessoas vacinadas, saiba que aqui temos aproximadamente 8 milhões de pessoas vacinadas com a primeira dose e 3 milhões com as duas.

A França optou por comprar suas vacinas unicamente através das negociações feitas pela União Europeia, fato que nos deixou atrasados em relação à aqueles que decidiram “jogar a partida em solo”.

Além disso, ao contrário do Brasil, a França não dispoe de logística para vacinação em massa. Para vacinas obrigatórias, o médico receita, você compra na farmácia e volta ao médico para aplicação.

Assim, tudo está sendo criado do 0. Pontos de vacinação, distribuição, logística não aparecem do nada. Esperamos que quando as novas doses programadas para chegar em breve as discussões de quem as aplicarão já tenham cessado. Farmacêuticos, médicos em gabinetes, pontos de vacinas em estádios, tudo já foi cogitado.

Muitas dúvidas pairam no ar, a única certeza é que as vacinas resolverão o problema, e somente essa certeza já é uma excelente notícia, não é mesmo?!   

E como diz um famoso ditado francês: Tudo chega para quem sabe esperar. (“Tout vient a point à qui sait attendre”)

Esperemos…