Desabafo. Uber, Airb&b,Banana Chiquita,Lâmia

A semana que passou foi uma semana peculiar devido a inúmeros incidentes históricos de diferentes teores de gravidade, mas que, no entanto, nos afetam a todos; Renan mantido, Hollande renuncia a candidatar-se novamente, houve greve em Versalhes quarta-feira passada; os taxistas quebraram o hall de Uber no aeroporto do Rio de Janeiro; um avião caiu matando tragicamente 71 chapecoenses.

Quero “falar” aqui dos três últimos fatos. Greve em Versalhes; os taxistas quebraram o hall de Uber; um avião caiu matando 71 pessoas. Fatos (não comparáveis, certo) que parecem desconectados e, no entanto, tem algo em comum.

Quanto a greve na rica cidade de Versalhes poderíamos dizer que é uma vergonha, mas prefiro pensar que o francês segue lutando contra a economia mundial da banana Chiquita. Presenciando ondas de demissões e vivenciando uma diminuição real de qualidade de vida ligada a sobrecarga e redução de condições de trabalho, os funcionários do Castelo e todo os sindicalizados da CGT pararam a abastada cidade.

Eu sei que a livre empresa é o xodó da América de norte a sul, porém os taxistas do Rio, desesperados, estavam lutando pelo seu ganha pão e de suas famílias. E também contra uma economia de banana Chiquita. Alguém se importa com os taxistas?

Como lutar contra um preço atrativo? Contra um empreendimento de sucesso? Como convencer um povo místico que não há milagre atrás de preço barato? Se até uma companhia aérea de segunda categoria parece uma opção plausível o que dizer de bananas, transporte terrestre, hotelaria? Quem poderia imaginar que um piloto decidiria não parar para abastecer em Bogotá e iria confiar na reserva para chegada no destino. Quem vai fazer a ligação entre a catástrofe e a economia esperada com essa decisão do piloto, no caso o dono da empresa? Afinal comprar combustível e o pagar direitos de uso dos aeroportos representa um custo importante para uma pequena empresa de aviação. Quanto representou a economia?

Você sabia que a banana Chiquita é a número 1 de vendas no mundo? Todo mundo adora porque é baratinha!! E todo mundo adora coisa barata (assim como Airbnb e Uber). Quem se importa se os plantadores de bananas morrem as pencas com doenças graves devido a utilização de pesticidas e o povo que come a dita banana morre aos poucos com os mesmos pesticidas…

Quem se importa se os taxistas estão desesperados perdendo seu ganha pão e de suas famílias e de certa maneira, lutando contra a economia da banana Chiquita?

Tenho um carro parado na garagem, “contrato” uns sujeitos mais pobres que não dispõe de carros e ainda faço uma graninha com carro, com a pobreza dos meninos e a decadência dos taxis. Viva a livre empresa! Ou ainda para sair da minha própria pobreza “descolo” o carro e digiro 16 horas por dia. Qualificação, controle de horas trabalhadas, condições do veículo e do próprio motorista? Isso ninguém quer pensar quando opta por um transporte mais barato.

Não se engane, não escrevo isso por trabalhar com transporte de pessoas, pois faço receptivo e não somente transporte, são coisas bem diferentes, mas isso talvez seja assunto para outro post.

A falta de legislação e controle de qualidade do Airbnb por exemplo, permitem a muitas pessoas arredondarem o fim do mês ou ainda não terem que se submeter as restritivas condições de aluguel a longo prazo quando locam seus bens para estrangeiros de passagem. Inquilinos declarados e com direitos? Prefiro colocar meu bem na mão de um administrador que por sua vez coloca e gera no Airbnb e não tenho nem ideia do que se passa nem responsabilidade quanto ao imóvel alugado. Adios habitantes, um confortável bangalô na periferia e 2 horas de transporte coletivo esperam por vocês que trabalham e gostariam de viver em Paris. Au revoir hotelaria.

Escrevo esse post por que estamos vendo a quarteirização do mundo e ninguém está notando. Todo mundo está feliz com a opção mais baratinha e querendo acreditar em milagres. E assim vamos nos tornando cidadãos de segunda categoria, sem garantias de empregos, sem cotizações trabalhistas, fazedores de “bicos” institucionalizados, idosos pobres e mal servidos, jovens que desconhecem vantagens sociais trabalhistas e aquela pobreza que era característica do hemisfério sul e que gostaríamos de ter solucionado vem se generalizando ao invés de diminuir.

E o que os fatos destacados tem em comum? São frutos da sacrossanta guerra pelos preços baixos do povo, da sede de maiores lucros das grandes empresas e do concomitante arroxo social que veem nos impondo os governos mundiais.

Enquanto isso tantos agentes perdem a fala perante aos preços baixos dos “on-line”. Para superar esse obstáculo você deve ser o primeiro a acreditar, não há milagre: quando o preço for muito diferente do que o preço praticado no mercado (como aquele que você oferece na agencia por exemplo) algo foi cortado (seja em conforto, segurança, garantias de qualidade, serviços pós venda e até mesmo direitos trabalhistas) e no final alguém pode pagar caro pela economia.  Já para os mais místicos deixo recado subjetivo para ver se fica claro: o Homem sempre paga pela ignorância do homem. O caminho mais atraente a curto prazo raramente é o que gera melhores resultados a longo prazo.

Prometo que vou fotografar as belezas Natalinas e parisienses rapidinho para animar as festas e vendas, mas Chapecó foi a gota, como m. no ventilador. As consequências deste misticismo estão indo longe demais e não deu para calar a dor.

 

 

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Silvia Helena

Após breves passagens pela Faculdade Metodista de São Bernardo e Belas Artes de São Paulo, aos 18 anos fui estudar no Canadá, onde vivi durante 23 anos. Lá me formei em História da Arte pela Universidade de Montréal, estudei turismo no Collège Lasalle de Montréal e no Institut de Tourisme et Hôtellerie du Québec. Comecei minha carreira na área trabalhando em Cuba. Durante os anos vividos no Canadá, entre outras coisas, fui guia de circuitos pela costa leste e abri minha primeira agência de receptivo para brasileiros. Há 18 anos um vento forte bateu nas velas da minha vida me conduzindo até França. Atualmente escrevo de Paris, onde vivo e trabalho dirigindo a empresa de receptivo, LA BELLE VIE.

12 thoughts on “Desabafo. Uber, Airb&b,Banana Chiquita,Lâmia

  1. O mundo ta mudando muito rápido. A tecnologia esta fazendo grandes transformações. Infelizmente é assim… Temos que nos adaptar as constantes mudanças. A maior empresa de filmes do mundo, não tem um DVD, A maior empresa de Taxis do mundo não tem um único carro. Em breve, o maior banco do mundo, não vai ter uma unica agencia. A maior empresa de musicas do mundo, não tem um CD. Entende o que quero dizer??? Evolução. Quantas profissões deixaram de existir por conta da tecnologia? Em breve… Corretor de imoveis vai deixar de existir, frentista, caixa de banco entre outros. O próprio motorista do Uber vai ser substituído por carros que dirigem só. O mundo de hoje exige que tenhamos conhecimento em varias áreas para não ficar para trás, como ficou quem vivia de cursinhos de datilografia.

    1. OI David
      Obrigada por seguir o post e pelo seu comentário. Eu sabia que corria o risco de parecer retrograda.
      Eu adoro tecnologia e evolução, porém estou criticando o caminho que as coisas estão tomando. Estou falando de desemprego, de fazer bico para viver e pensar que isso é evolução, de especulação imobiliária, de perdas de qualidade de vida e conquistas sociais.
      David, evolução mesmo é Blablacar, Velib, Autolib e site de troca de casas para viagens. Evolução é emprego, pagamento de encargos, impostos e recursos tais como transporte, educação e saúde gratuitos. Evolução seria poder morar perto do trabalho. Evolução seria aposentadoria aos 55. O resto é o povo sonhando com luxo e glorificando quem está ficando milionário as custas do subemprego alheio. As pessoas tendem a crer que se a coisa é barata para uns e lucrativa para alguém é benéfica para todos. Não é porque qualquer um pode fazer qualquer coisa que ela fica bem-feita. Você iria a um oculista que na realidade é dentista só porque ele tem a tecnologia para diagnostica-lo?
      David, eu não confiaria num piloto de avião que é também o dono da empresa e responsável em pagar as contas da mesma, mas está aí a prova que eu não penso como a maioria das pessoas. Não faria um longo percurso terrestre nestas condições, muito menos aéreo.
      E ainda sobre a tecnologia, você soube que um carro Tesla sem motorista entrou num caminhão, matando o passageiro? O céu estava particularmente cinza esbranquiçado esse dia, a mesma cor do caminhão não reconhecido pelos sensores. O acidente poderia ter acontecido com um motorista adormecido, certo, mas sua morte não teria ocorrido graças a confiança que ele colocou na Tesla e na evolução. A invenção é fantástica, eu também quero um, mas isso não significa que vou confiar cegamente quando estarei desfrutando. Evolução sim, as cegas não.
      David, mais uma vez obrigada, eu entendo o que quer dizer. E você entende meu sonho de um futuro onde a tecnologia trabalhará em prol de todos e não para o enriquecimento de poucos?

      Termino deixando aqui uma fábula de Florian escrita no século XVIII.
      Colin guardava as vacas de seu pai
      Colin ia só sem namorada e pela planície se entediava.
      Até que viu sair da floresta um guarda florestal, que foi logo falando assim;
      -Desde cedo corro atrás de um cervo, que perdi várias vezes e tem me deixado muito mal.
      -Acaba de passar. Mas se estas cansado, sossegue, olhe minhas vacas em meu lugar, eu farei sua caça, para que possa descansar.
      -Sim, ótima ideia, tome meu fúsil e meu cão
      E foi assim que Colin partiu com Sultão
      O cão correu e entre arbustos o cervo encontrou
      Colin impaciente não hesitou, mas com tiros o cervo assustou
      e com sua bala o pobre Sultão tocou.
      Com o cão em prantos para a planície Colin decidiu voltar
      Mas qual surpresa! Viu o guarda florestal a roncar e as vacas já não pode encontrar.
      De volta a casa apanhou de bastão e o pai enquanto batia tentava explicar certa lógica à sucessão
      A cada um sua profissão e as vacas em seu ligar ficarão.

  2. Silvia, sua comparação com a queda do avião da Chapecoense foi bem infeliz. A Chapecoense não contratou a Lamia por ser mais barata, mas por ter apresentado questões técnicas apropriadas para atender equipes de futebol, como se dizia especialista nisso com a conivência do governo Boliviano. Se você trabalha com receptivo e transportes, sabe bem como funciona. O que houve ali foi neglicencia de agencia reguladora aérea e da empresa, ganância, poder, corrupção. A Chapecoense não barganhou preço. Te falta informações para ter feito essa comparação.

    1. Oi Flavia
      Obrigada por seu comentário.
      Na verdade, refleti e li bastante quando escrevi sobre o incidente e a categoria da companhia aérea. Tudo isso já é o suficientemente infeliz sem que tenhamos que questionar as razões de uma falha humana.
      Sei o quanto foi pago pelo serviço. Sei também que faturamento não é benefício. O afretamento inesperado de um aparelho para fazer parte do trajeto deve com certeza ter mudado os resultados da operação. Outros jornalistas que li compartilham esta opinião. Os custos são preocupações dos empresários, a realização de economia também, por isso é sempre bom a existência de vários níveis de gestão e controle em empresas que implicam riscos para os usuários. Daí ter falado na escolha de uma empresa de segunda categoria. Se o avião tivesse parado em Bogotá não teria caído. Porém entendo sua reflexão e respeito sua opinião, não duvido da questão da ganância da qual fala tampouco. Tudo isso é muito infeliz e delicado. Comparto minhas reflexões pois me retiraram da zona de conforto. Embora não estejamos de acordo, fico feliz em ler suas palavras e com sua participação ao questionamento.

  3. Olá Silvia.
    Estou de acordo com você pois acho que trajédias como a da Chapecoense poderia ser sido evitada contratando empresas aéreas com curriculum mais apropriados para atender este tipo de serviço (fretamento). e que possam repaldar o seu cliente. Aqui o valor do serviço teve o seu preço!
    Com o respeito que se merece, mas acho que ninguém daria de presente uma passagem aérea a um amigo ou familiar de uma empresa como a TAMIA.

    1. Prezado Cheldo
      Obrigada por seguir o post e ter deixado seu comentário. Fiquei apreensiva com as reações ao falar de algo trágico e relacionar com economia, dinheiro, porém temos que pensar em causas e consequências e esperar que o erro de uns sirva para outros.

  4. Silvia, Bom Dia !
    Não seria a corrupção a causadora desse estrago ? Nossos políticos na ganância histórica é capaz de aprovar todos os projetos e leis desde que obtenham vantagens. O povo nunca foi e nunca será a prioridade dessa classe de políticos abastados. Na lei sempre existirá uma pequena virgula que pode mudar completamente a história. A lei da livre concorrência (constituição Federal), por exemplo, na questão TÁXIS x UBER serviu exatamente para aprovar um novo concorrente em detrimento ao existente, que como você comentou paga seus impostos etc etc.
    A velha corrupção !

    1. Oi Douglas
      Obrigada por ler o post e deixar seu comentário
      Pois é! A ganância dos políticos, o arroxo e crise, resultando em mais dinheiro para uns, piores condições de vida para os piões do tabuleiro, ou seja para a população em geral.

  5. Interessante abordagem.
    Outra coisa que espelha essa economia burra são as lojas de produtos chineses (R$ 1,99).
    Abrir mão da qualidade, por uns trocados.

    1. Edson,
      Obrigada por seguir o post e ter deixado seu comentário. Uma campanha inteligente de televisão francesa do passado já dizia: Nossas prateleiras=Nossos empregos. Ou seja, o que colocamos em um reflete no outro.

  6. O comentario da Flavia está equivocado. Para que ter que voar até Santa Cruz de la Sierra para depois pegar este aviao que tinha que fazer mais uma escala paa reabastecer? Nao era muito mais simples a Chapecoense voado até Bogotá num voo commercial e feito uma conexao para Medellin? Optaram pelo mais barato e deu no que deu…..

    1. Oi Helio
      Obrigada por seguir o post e deixar seu comentário. Vejo motorista de carro independente correndo riscos, fazendo trabalho comercial de noite (respondendo clientes de sites próprios) e dirigindo de dia, infringindo leis administrativas para aumentar seus ganhos ou fazer economias, não por falta de caráter, mas para viver. Só por isso não confiaria em um piloto que também é dono da empresa.

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