Explicando as recentes manifestações na França

Explicando as recentes manifestações na França ou Essa é a última vez que falamos nisso!

Afinal, eu também quero falar de turismo! Porém, como ignorar as manifestações que levaram mais de 160 000 pessoas às ruas da França neste sábado dia 24 de julho?

Assim, o passe sanitário instaurado dia 21 de julho, dias antes de ter obtido as aprovações do Senado e pela Assembleia Nacional, faz oficialmente parte de nossas vidas.

Após a discussão de mais de mil emendas durante sessões extraordinárias, inclusive noturnas em ambas instâncias, o estabelecimento do passe sanitário sofreu algumas mudanças de ordem legais e administrativas.

O valor das multas para estabelecimentos que não respeitem os controles do passe caíram de 45 000 para 1500, não haverá recurso judiciário penal, mas somente risco de fechamento do recinto em caso de recidiva.

Não haverá licenciamento de funcionário sem passe, mas suspensão do mesmo. Um procedimento trabalhista que ainda deixa muitas dúvidas no ar: suspenso, sem salário, sem seguro desemprego e sem possibilidade de buscar outro trabalho? Enfim, o que parece uma boa notícia pode ser no fundo uma grande punição!

Jovens poderão esperar até setembro para obter o passe sanitário, podendo assim circular livremente durante suas férias de verão.

Aparentemente somente shoppings e lojas com mais de 20 000m2 terão obrigação do controle do passe sanitário, porém as varandas de restaurantes não escaparam da mesma obrigação.

Digo aparentemente porque as discussões ainda não acabaram, alguns pontos podem ser revistos após aprovação. E tanto o governo como a oposição contam fazer apelo ao Conselho Constitucional para estudo de algumas questões. Esse último deve se pronunciar até dia 5 de agosto.

Os cruzeiros e serviços fluviais, quanto a eles, estão finalmente isentos de controle.

Enquanto isso o país está mais dividido do que nunca e submerso em fake news e notícias alarmantes oriundas de ambos times: os prós e os contras.

A possibilidade de inversão do papel das instituições governamentais, estabelecidas pelo Estado de Emergência Sanitária* instaurado em março 2020 e prorrogado desde então têm deixado os franceses inseguros, demasiado desconfiados e muito descontentes. Isso talvez explique o aumento de contestadores ao Passe Sanitário.

O Estado de direito

O francês, certo ou errado, se sente lesado de seu habitual Estado de Direito.

“O Estado de Direito pode ser definido como um sistema institucional no qual o poder público está sujeito à lei.”

A igualdade dos cidadãos no Estado de Direito

“A igualdade dos cidadãos é a segunda condição para a existência de um Estado de Direito. Isso implica que qualquer indivíduo, qualquer organização, pode contestar a aplicação de uma norma legal, se esta não estiver em conformidade com o padrão mais elevado.”

Fonte / Vie-publique.fr

E pelo poder de uma palavra, eu nasci para te conhecer LIBERDADE Paul Elouard

Esse clima de instabilidade concerne o cidadão francês e qualquer um que teme o enfraquecimento das instituições democráticas tais quais conhecemos até então. As manifestações vistas na França neste último sábado, catalisam muitas preocupações dos franceses.

Dentre as preocupações dos franceses encontramos liberdade e libre arbítrio, trabalho e desemprego, segurança, justiça, igualdade e democracia, entre outras questões.   

Estado de emergência sanitária, o que é

O estado de emergência sanitária é uma medida excepcional que pode ser decidida pelo Conselho de Ministros em caso de desastre sanitário, incluindo uma epidemia, colocando em risco a saúde da população. Um estado de emergência é declarado pela primeira vez por decreto do Conselho de Ministros sobre o relatório do Ministro responsável pela saúde por um período máximo de um mês. O decreto determina a divisão territorial ou divisões em que se aplica. Os dados de saúde nos quais o decreto se baseia são tornados públicos.

Após um mês, sua prorrogação deve ser autorizada por lei. A lei de extensão estabelece a duração do estado de emergência sanitária. Um decreto emitido pelo Conselho de Ministros pode pôr fim ao estado de emergência sanitária antes do término do prazo fixado por lei. As medidas tomadas no contexto do estado de emergência sanitária cessarão assim que o estado de emergência sanitária for encerrado.

Situação atual do estado de emergência sanitária

Estabelecido por dois meses pela lei de 23 de março de 2020, o estado de emergência sanitária havia sido prorrogado até 10 de julho, inclusivamente. A lei de 9 de julho de 2020 que organiza a saída do estado de emergência sanitária havia colocado em vigor um regime de transição a partir de 11 de julho autorizando o governo a tomar medidas excepcionais até 31 de outubro de 2020 para lidar com a epidemia de Covid-19.

O estado de emergência sanitária em todo o território nacional foi novamente declarado por decreto a partir de 17 de outubro de 2020 às 12h.m. A lei de 14 de novembro de 2020 prorrogou, pela primeira vez, o estado de emergência sanitária até 16 de fevereiro de 2021.

A lei de 15 de fevereiro de 2021 estende o estado de emergência sanitária até 1º de junho de 2021. A lei de 31 de maio de 2021 sobre a gestão da saída da crise de saúde organiza a saída do estado de emergência sanitária. Um regime de transição está em vigor de 2 de junho a 30 de setembro de 2021.


Concluindo: é muito mais fácil taxar essas 160 000 que foram às ruas da França manifestar de loucas “complotistas” que explicar esse contexto tão incomum.

Graças à Deus, as fronteiras estão abertas e podemos voltar a falar em turismo!

Greves de transportes marcam volta à normalidade

Greves de transportes marcam volta à normalidade ou a França sendo a França.

Transportes aéreos: Um comunicado conjunto emitido por diversos sindicatos (CGT, CFE-CGE, Unsa, CFDT e FO) acusa o projeto dos gestores da ADP de “abolir permanentemente o salário de mais de um mês para todos os funcionários e forçá-los a aceitar mobilidade geográfica que gera tempo adicional de locomoção”.

De fato, o projeto denominado PACT (Plano de Adaptação de Condições de Trabalho) planeja abolir vários bônus, resultando em cortes salariais entre 4 e 8%. Se o colaborador recusar, o PES (Plano de Economia Social aprovado pelo governo) prevê a demissão do mesmo!

Vale lembrar que esse tipo de dispositivo representa uma mudança radical nas leis trabalhistas francesas que sempre favoreceram o empregado perante ao empregador. 

O Comitê Social e Econômico do Aeroporto de Paris também se opõem ao projeto, e denuncia o desejo da gestão atual de fazer economias em um momento em que a pandemia teve consequências significativas sobre a atividade da ADP – Aéroports de Paris. A paralisação está prevista entre os dias 1° e 5 de julho.

Transportes ferroviários :  Para as empresas de transporte ferroviário da SNCF,o sindicato CGT convocou uma greve nacional dia 1 de Julho para exigir um aumento geral dos salários e recrutamento adicional.

Finalmente, nos dias 3 e 4 de julho, são os funcionários da TGV OuiGo que são chamados a parar de trabalhar.

As datas escolhidas para o movimento de greve de transportes interferem fortemente nos planos de férias de muitos franceses.

Paris – De acordo com a Diretoria de Ordem Pública e Trânsito (DOPC) da Prefeitura de Polícia registrou 2093 manifestações de protesto declaradas em 2019

É importante ressaltar que essas greves de transportes não catalisam somente a insatisfação com os cortes e arrochos ocasionados pela crise da Covid-19. Há também todas as feridas sociais do início do mandato de Emmanuel Macron, que não foram esquecidas e que não cicatrizaram durante a crise de saúde: as reformas do estatuto da SNCF, a raiva dos “coletes amarelos”, a oposição à reforma da previdência são alguns dos fatores que ainda estão muito presentes entre os ferroviários. 

O Francês teme que as mudanças elaboradas pelo governo atual os aproximem inexoravelmente do sistema empregatício e social americano ou Americain Way of Life.

Ou marche ou Crève

Uma expressão emprestada à Legião Estrangeira designa o sentimento de muitos franceses em relação as mudanças recentes e futuras:Ou marche ou Crève”, ou seja ou você anda (segundo as novas normas) ou você “morre”. Ou você se adapta às normas impostas pela oligarquia “mundialista” ou você sai do circuito econômico.

Acampamento Gilets Jaunes – Movimento Coletes Amarelos 2019

Buscando sobre a origem da expressão Ou Marche ou Crève, encontrei justamente um vídeo de Pierre Hillard, ex-professor de relações internacionais da École supérieure du commerce em Paris, doutor em ciência política. Nele o professor lamenta a ignorância das populações sobre a real situação da França e que está por vir. Ele destaca a falta de “humanidade” das oligarquias mundialistas, o perigo crescente do controle da mídia por essas mesmas oligarquias e o desejo de impor uma cultura única tendo como princípio de base o individualismo e o consumo. Hillard acusa a Europa de ser o maior instrumento desse mecanismo.

As atividades do grupo Bidelberg 

Outro grupo que levanta suspeitas na França de trabalhar em prol de uma mundialização impiedosa e imoral é o Grupo Bilderberg. Meu filho de 16 anos foi o primeiro a me chamar a atenção sobre suas atividades.

Denis Healey, um dos iniciadores da Conferência Bilderberg de 1954 e membro do comitê diretor por 30 anos, explicou em 2001: “Dizer que estávamos procurando estabelecer um único governo mundial é muito exagerado, mas não totalmente absurdo. Nós em Bilderberg pensamos que não poderíamos entrar em guerra para sempre e matar milhões de pessoas por nada. Nós pensamos que uma única comunidade poderia ser uma coisa boa.

O relatório da reunião do grupo em 1999, publicado pelo jornal independente inglês Schnews coloca em evidência, por exemplo, o desejo dos participantes de “redesenhar a economia mundial”.

Mudanças sim, mas para melhor

Para a ADP, a SNCF e para o mundo, talvez o tempo seja propício para mudanças, mas os franceses querem ter certeza que essas mudanças sejam para o melhor.

Resumindo enfim, os franceses continuam com boa memória e não estão dispostos a deixar o governo atual e a Europa passarem suas “boiadas” sob pretexto da Covid-19. 


Notas:

ADP Aéroports de Paris

SNCF Société Nationale de Chemin Ferroviaires

O Grupo Bilderberg, também conhecido como Conferência de Bilderberg ou Clube Bilderberg, é uma reunião anual e informal de cerca de cento e trinta pessoas, principalmente americanos e europeus, compostos majoritariamente por personalidades da diplomacia, negócios, política e mídia. Este fórum anual foi inaugurado em maio de 1954 em Oosterbeek, na Holanda, em uma reunião no Hotel Bilderberg (daí seu nome) e tem escritórios em Leiden, nos Países Baixos. Sua cobertura não midiática e a natureza confidencial das revisões da conferência regularmente despertam controvérsias e alimentam teorias conspiratórias sobre sua influência.

Claude François,o pesadelo de Frank Sinatra

O titulo deste texto é Claude François, o pesadelo de Frank Sinatra, mas poderia ser Claude François, Frank Sinatra e o Brasil. Descubra o porquê.

As fronteiras do principal destino turístico do mundo seguem fechadas (*1). O turismo se encontra em letargia! Mas eu estou aqui com você querido leitor!

Pois, mesmo sem deslocamentos e visitas, nos resta a cultura e muitos fatos que fizeram da França o que ela é. Curiosidades que sempre quis dividir com você e nunca tive tempo, como a história de Walt Disney da semana passada e agora esta sobre o cantor Claude François.

Poucos sabem que a famosa canção My Way (*2) , levada ao sucesso internacional graças à Frank Sinatra é francesa. Composta por Jacques Revaux e Claude François, criada em 1967 sob o título “Comme d’Habitude” ou “Como de Hábito” foi adaptada, para o público anglo-saxão, por Paul Anka antes de ser interpretada no palco por Frank Sinatra.

Na boca do ítalo-americano, o lamento do homem francês ( Claude François) sobre o peso do quotidiano em sua vida amorosa tornou-se a história de um artista em fim de carreira, que olha para trás e faz o balaço de sua vida.

Coincidentemente a última canção do lado B e canção título do disco de Frank Sinatra foi lançada simultaneamente ao próprio adeus do artista aos palcos, anunciado para o mesmo ano de 1969. (“And Now, The End is Near…“) Falso adeus,  já que o “old bleu yes” continuaria a cantar My Way, entre outros sucessos, por mais um quarto de século, antes de finalmente sair de cena em 1998.

Sucesso planetário x tortura mental

O fato é que “My Way” grudou na pele do artista, se tornando possivelmente uma de suas canções mais populares.

No entanto, concerto após concerto durante um período de 25 anos, ele nunca hesitou em dizer ao público exatamente o que ele achava dela:

“Eu odeio essa música – se você a cantasse por oito anos, você odiaria também!” (Caesars Palace, 1978)

“E, claro, chega a hora do momento torturante – não para vocês, mas para mim.” (L.A. Anfiteatro, 1979)

“Eu odeio essa música. EU ODEIO ESSA MÚSICA! Eu estou até aqui com essa maldita canção!” (Atlantic City, 1979)

E ainda assim, em muitas dessas mesmas apresentações, ele disse à multidão que a mesma música tinha sido “muito boa para mim – e cantores como eu”. Afinal “My Way” é uma canção que fez mais do que qualquer outro título para a última fase da carreira de Frank Sinatra. Ela praticamente relançou sua carreira.

Quanto à Claude François, o cantor francês, ele fez grande sucesso durante seus quinze anos, se tornando um dos artistas franceses mais populares de seu tempo. Era considerado como uma espécie de “Roberto Carlos” da França antes de sua morte acidental em 1978.

(The last but not the least) Eu, pessoalmente não gosto do repertório de Claude François, nem de My Way eu gosto, porém não deixa de ser interessante o fato de  Claude François ter marcado também a vida de muitos brasileiros, mesmo sem que eles tenham jamais ouvido este nome até os dias de hoje.

anos 60/70

Claude franÇois e a música francesa no brasil

Não foi somente Paul Anka que teve a brilhante idéia de adaptar a música de Claude François. De fato, as “trocas” musicais entre brasileiros e franceses eram mais comuns do que imaginamos. Veja alguns exemplos:

Le téléphone pleure –autor Claude François 1974

O telefone chora –  intérprete Márcio José 1975


Tu t’en vas 1975 – autor Alain Barrière

Não se vá -intérpretes Jane e Erondi 1977


a música brasileira na franÇa

E essas trocas musicais se fizeram da França para o Brasil , mas também aconteceram no sentido contrário. A França, por sua vez, se apaixonou pelo nosso samba e a bossa nova.


Partido Alto – Chico Buarque de Holanda 1972

Qui c’est celui-là ? (Quem é esse ai ?) Pierre Vassiliu 1973.

Título número um na França em 1974.  Adaptação de Partido Alto de Chico Buarque.

O disco do mesmo nome vendeu 300.000 cópias em quatro meses. O “partido alto” em francês não envelheceu e até hoje anima as festas e noitadas de nostálgicos.


Samba da Benção autor Vinicius de Moraes 1967

Saravah –Pierre Bayrou – filme Um Homem, Uma Mulher 1966.

Espere até 21 segundos do filme. Um dos meus filmes preferidos da Sessão Coruja. O artista Pierre Bayrou veio ao Rio e escutou a canção antes mesmo de ser gravada no Brasil. De volta à França, Pierre Bayrou convenceu Claude Lelouche a mudar o cenário de seu filme pra introduzir a sua versão em francês de Samba da Benção.


Enfim, mesmo se o turismo está letárgico, a França ainda tem muita história para contar. Sua ligação com o Brasil e influência no mundo é atemporal. Assim como, a influência da música brasileira na França também não deixa nada à desejar, é claro.

Começamos com o pesadelo de Frank Sinatra e acabamos fazendo um passeio musical no passado *3. Nada mais adequado para uma terça feira de Carnaval.

Espero que tenha gostado.  Abraços e a semana que vêm tem mais!


Outros

Águas de Março, Vanessa Paradis
Bia, Coração Vagabundo
Henry Salvador, Eu sei que vou te amar
Brigitte Bardot canta bossa nova
Jeanne Moreau canta samba
Patrick Bruel e Chico Buarque
France Gall Maria Vai Com As Outras – Vinicuis de Moraes
Anos 30, quiça onde tudo começou!

Notas:

*1 De acordo com dados da Organização Mundial do Turismo, desde a década de 1990, a França tornou-se o principal destino turístico do mundo  (89 milhões de turistas internacionais em 2017).

*2 My Way é uma das músicas mais gravadas no mundo com Yesterday dos Beatles e Georgia on My Mind escritas e gravadas em 1930 por Hoagy Carmichael e Stuart Gorrell, e popularizada em 1960 por Ray Charles7.

De acordo com o relatório de 2012 da SACEM, graças ao sucesso de My Way, “Comme d’Habitude” continua sendo a canção francesa mais exportada. As receitas anuais somam mais de um milhão de euros.

*3 Não gosto mesmo de introdução, desenvolvimento e conclusão.