Recuperação ou Reinvenção? Os Dados Explosivos do Turismo em 2024 e as Apostas do Brasil

O ano de 2024 consolidou uma retomada contundente do turismo global, com 1,4 bilhão de chegadas internacionais, equivalendo a 99% dos níveis anteriores à pandemia. De acordo com as análises e estatísticas da Organização das Nações Unidas para o Turismo (ONU Turismo), esse avanço foi impulsionado pela forte demanda reprimida ao longo de 2020-2022, pela recuperação de mercados-chave e pela melhoria expressiva do desempenho em regiões como Ásia e Pacífico. Enquanto Oriente Médio, Europa e África já ultrapassaram os números de 2019, as Américas atingiram 97% de recuperação, destacando-se o Caribe e a América Central, que superaram os resultados pré-pandêmicos.

PANORAMA GLOBAL

O turismo internacional gerou US$ 1,6 trilhão em 2024, um aumento de 4% em relação a 2019. Esse montante reforça a importância do setor na economia global e aponta para uma retomada acima do esperado, considerando os desafios logísticos e sanitários enfrentados no início da década.

Oriente Médio: Aumento de 32% em relação a 2019, com 95 milhões de chegadas. A região se firmou não apenas como polo de negócios, mas também como destino cultural e de eventos, ampliando sua competitividade internacional.

África: Crescimento de 7% comparado a 2019, totalizando 74 milhões de chegadas. O continente tem fortalecido sua imagem baseada em biodiversidade, cultura e projetos de ecoturismo.

Europa: Com 747 milhões de chegadas, superou ligeiramente os níveis pré-pandemia. Ainda é o maior mercado mundial, beneficiado por diversificação de produtos turísticos e alta integração regional.

Américas: 213 milhões de chegadas (97% de 2019), sobretudo impulsionadas pelo bom desempenho do Caribe e América Central.

A recuperação global reflete a combinação de grande demanda reprimida e políticas pró-turismo, incluindo a flexibilização de restrições de viagem. Contudo, custos de transporte crescentes e a volatilidade geopolítica podem afetar a curva de crescimento em 2025 e além. Nesse cenário, a busca por práticas sustentáveis, compensação de carbono e redução de impactos ambientais ganha espaço, indicando que destinos com projetos sólidos de turismo responsável poderão se destacar cada vez mais.

Mostra, também, que as relações geopolíticas e o novo governo americano trazem maiores desafios para a economia global, as diferenças de blocos e, consequentemente, para as viagens pelo planeta. É ficar de olho.

AMÉRICAS

Com 213 milhões de chegadas (97% dos níveis de 2019), as Américas mantiveram um crescimento robusto de 7% em relação a 2023. O Caribe e a América Central foram os principais motores, reforçando a preferência por destinos “pé na areia” e de turismo de experiência. Em termos de receitas, Colômbia (+37%) e Canadá (+70% em receitas) lideraram os ganhos, demonstrando a força de mercados que investiram em promoção internacional e diferenciação de produtos turísticos.

Na América Latina, destinos emergentes como República Dominicana e Guatemala lideraram a recuperação, capitalizando tendências de ecoturismo e consolidando a região como polo de experiências autênticas. O Brasil, embora não detalhado diretamente nos dados da ONU Turismo, desponta com sua vasta oferta de ecoturismo e crescente interesse em práticas sustentáveis. A combinação de biodiversidade única, cultura diversificada e demanda reprimida por turismo de natureza posiciona o país como protagonista regional — mas também traz à tona a responsabilidade de garantir um equilíbrio entre desenvolvimento e preservação ambiental.

BRASIL: RECORDE HISTÓRICO E NOVAS PERSPECTIVAS

O Brasil encerrou 2024 com 6,65 milhões de turistas estrangeiros, um crescimento de 12,6% em relação a 2023 — um recorde, superando até mesmo os valores gerados durante a Copa de 2014 (US$ 6,62 bilhões nos primeiros 11 meses de 2024).

Dois terços dos turistas chegaram por via aérea, evidenciando a importância de melhorar a conectividade e ampliar rotas, ao mesmo tempo em que se discute a descarbonização do transporte aéreo ou alternativas de compensação de carbono.

Insight Climático:

O Brasil carrega o desafio de equilibrar a expansão turística com a conservação de seus biomas — Amazônia, Pantanal, Mata Atlântica, Cerrado, entre outros. A crescente pressão de turistas em áreas naturais pode acarretar riscos ambientais, demandando fiscalização, limites de visitação e a adoção de protocolos de turismo responsável. Ao mesmo tempo, a proteção de ecossistemas é um ativo estratégico: uma floresta em pé ou um manguezal preservado podem gerar renda para comunidades locais e atrair turistas interessados em experiências genuinamente sustentáveis.

DESAFIOS GLOBAIS DO TURISMO: CONECTIVIDADE, POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS E VISTOS

1. Conectividade Aérea: A decisão de companhias aéreas de encerrar rotas afeta a atratividade de destinos. O caso da Ryanair em Jerez (Espanha) ilustra como tarifas excessivas ou falta de incentivos podem comprometer economias locais. No Brasil, a discutida fusão da GOL e Azul ainda vão trazer muito debate, sempre mostrando a sensibilidade do setor e a possibilidade de retirada de rotas (que já vem ocorrendo), assim como preços ainda altos.

2. Políticas dos EUA

A reeleição de Donald Trump e eventuais políticas protecionistas podem dificultar viagens e reduzir o fluxo de turistas internacionais para os EUA. Vamos acompanhar as medidas e restrições a vistos; além das barreiras de imigração e comerciais mais rigorosas, que podem afetar a demanda global, diminuindo a capacidade de gastos de viajantes e impactando destinos que dependem de conexões via Estados Unidos.

3. Exigência de Visto pela Europa para Brasileiros

A criação de vistos adiciona burocracia e custos, desencorajando potenciais viajantes, como é o caso também da Europa. Nesse caso, para destinos europeus, a redução do fluxo brasileiro implica perdas econômicas, particularmente em países onde o turismo sul-americano representa fatia relevante do mercado.

Reflexões Finais sobre o Brasil e a Agenda Climática

O turismo global avança em meio a incertezas e transformações, mas o Brasil tem a oportunidade de se destacar ao alinhar seu planejamento de longo prazo com a agenda climática. Projetos de conservação, iniciativas de turismo responsável e colaboração com comunidades locais podem servir de vitrine de inovação sustentável. O país reúne biodiversidade única e potencial de hospitalidade reconhecido mundialmente — recursos poderosos para se diferenciar num mercado competitivo e cada vez mais atento às credenciais ambientais.

Contudo, a superação dos desafios passa por políticas públicas consistentes, investimento em infraestrutura verde, formação de mão de obra especializada e parcerias entre governos, setor privado e sociedade civil. A adoção de métricas de impacto (carbono emitido, conservação de habitats, benefícios econômicos para comunidades) permitirá mensurar com precisão o sucesso de iniciativas e corrigir rotas quando necessário.

A transformação do modelo de turismo brasileiro — pautada pela responsabilidade socioambiental e pela inovação — pode ser um legado duradouro, capaz de gerar divisas e preservar os recursos naturais que fazem do país um destino tão singular. À medida que 2025 se aproxima, a urgência de colocar a sustentabilidade no centro das decisões turísticas não é apenas uma exigência de mercado, mas uma responsabilidade global.

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Jeanine Pires

Apaixonada pela indústria de viagens e turismo, há 31 anos atua como líder do setor no Brasil e no exterior. Já Presidiu e foi Diretora da EMBRATUR entre 2003 e 2010; é Diretora da Pires Inteligência em Destinos e, no final de 2022, entrou para a CVC Corp como Diretora de Alianças e Relações Governamentais. Jeanine foi Co-fundadora da startup ONER Travel em 2020 e já atuou como Presidente do Conselho da Fecomércio São Paulo e da WTM Latin America. Com formação e especialidade em marketing de destinos e economia do turismo, Jeanine faz palestras, cursos e consultorias.

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