Notre Dame de Paris

Fatalidade

Catedral vista ontem dia 16/04 – um perímetro fechado impede a aproximação.

A primeira edição do livro de Notre Dame de Paris foi lançada em 16 de março de 1831, precedida por um breve prefácio onde o autor Victor Hugo evoca a inscrição gravada em letras gregas “ἈΝΆΓΚΗ” (ou seja, Ananke, ele opta por traduzir por ‘Fatalidade’) que ele teria visto “em um canto escuro de uma das Torres e que iria inspirá-lo a escrever o romance”.  É no mínimo curioso que neste prefácio o autor tenha incluído uma breve, mas severa crítica contra as restaurações apressadas de que eram vítimas os monumentos históricos em geral e Notre-Dame-de Paris, em particular.

CATEDRAL NOTRE DAME DE PARIS – “O padre escova, o arquiteto raspa e o povo demole.”

« Car c’est ainsi qu’on agit depuis tantôt deux cents ans avec les merveilleuses églises du moyen âge. Les mutilations leur viennent de toutes parts, du dedans comme du dehors. Le prêtre les badigeonne, l’architecte les gratte, puis le peuple survient, qui les démolit. »

CATEDRAL NOTRE DAME DE PARIS Restauração

De fato, esta não será a primeira vez que a igreja será restaurada. No início do século XIX a igreja estava caindo aos pedaços. Havia sobrevivido com dificuldade à Revolução Francesa e às revoltas políticas de 1830.  

Quem a salvou na época foi o próprio Victor Hugo, escrevendo o livro Notre Dame de Paris fez uma campanha de conscientização junto ao público e a administração, o que colocou a catedral no centro das atenções da cidade. A obra não somente salvou a igreja, mas também teria alavancado uma nova corrente literária pós-iluminismo voltada para a cultura medieval, lançando uma nova moda.  

Em 1800, sem a flecha edificada por Viollet-le-Duc

No capítulo intitulado “Notre-Dame”, Victor Hugo escreve: “sem dúvida, é ainda hoje uma majestosa e sublime construção a Igreja de Nossa Senhora de Paris”.   Mas, ele acrescenta, “mesmo tendo conservado sua beleza apesar da idade, é difícil não suspirar, não nos indignar ante os danos, mutilações incalculáveis causadas simultaneamente pelo tempo e pelos seres humanos ao Venerável monumento, sem respeito por Carlos Magno que colocou a primeira pedra, como por Philippe-Augusto, que colocou a última”.

CATEDRAL NOTRE DAME DE PARIS – Boas notícias apesar de tudo

Há dois dias o mundo se abalou vendo as imagens da Notre Dame em chamas. Há fortes suspeitas que as obras de reforma tenham sido causadoras do desastre de 2019. Teriam os restos de Victor Hugo se virado na tomba quando sua alma ouviu isso lá no céu?? .

Eu mesma não pude conter uma lágrima de emoção.

Porém amanheci no dia seguinte mais tranquila, diria mesmo bastante otimista. (Diga-se de passagem, muito mais preocupada com aquelas meninas que desaparecem na Nigéria -e de nossos pensamentos pouco depois- do que com a Notre-Dame).

Não sei se graças a minha fé ou aos meus exercícios mentais para me tornar uma pessoa mais positiva, ao despertar só consegui pensar na emoção dos talhadores de pedra, das fábricas de vitrais e todos os maçons profissionais que serão reunidos para a reconstrução. Quantos empregos não serão criados? Quantos ateliês moribundos ressuscitarão?

Ao ler os jornais me alegrei com a comoção e porque não dizer, a união planetária raramente vista.

Os dons já começaram, nos lembrando de que para “pelo menos isso” servem as grandes fortunas desse mundo.

Viollet Le Duc imita o estilo medieval

Quanto ao estado da Catedral, as notícias também foram boas: rosáceas preservadas, órgão preservado, coroa de espinho e outras relíquias sagradas preservadas, a estrutura ficou intacta. Ufa!!

O que sofreu perda quase total foi o teto, nele as esquadrilhas de madeira (muito seca) eram as únicas peças de origem do século XII e XIII. A a flecha foi obra do arquiteto Viollet-le-Duc no séc. XIX. Inclusive ambas as partes apresentavam desgastes consideráveis e tinham reforma prevista para durar uns vinte anos. “Se vacilar” agora com mais recursos será ainda mais rápido.

Uma excelente notícia?

As vendas do romance de Victor Hugo explodiram desde o acontecimento. Quem diria, Victor Hugo pode repousar em paz!

Nada melhor para a humanidade que leitura. Até parece que nesta vida tudo tem mesmo uma razão de ser.

No link você encontra uma versão on-line do livro Notre Dame de Paris em português. Um presente para você enquanto não vem ( ou volta) a Paris. Boa leitura!

Notre Dame de Paris- O musical

Quarto DBL com vista para MONALISA

foto Julian Abrams RelaxNews FRT

O que poderia ser mais inusitado do que passar uma noite no maior museu de arte e antiguidades do mundo? Surreal, não é mesmo? Porém é verdade. O mais visitado monumento parisiense irá instalar um quarto sob sua famosa pirâmide, situada na Praça do Carrossel do Louvre, na noite do 30 de abril.

Para celebrar os 30 anos da pirâmide do Louvre, o Museu e a Airbnb fizeram uma parceria que planeja instalar um quarto sob a própria pirâmide de vidro. Nesta data, após o encerramento do Museu do Louvre, os sortudos terão a Mona Lisa e a Vênus de Milo como anfitriões. 

Após uma visita guiada e um aperitivo na sala da Gioconda, um jantar será servido aos pés da Vênus de Milo em uma sala de jantar preparada especialmente para a ocasião. Antes da noite na peça de vidro piramidal os dois convidados apreciarão um concerto íntimo nos salões de Napoleão III. Bons sonhos garantidos para uma noite muito especial!

Relaxnews FRT

Segundo os gestionários do museu: “Com o apoio da Airbnb, o Louvre quer promover suas coleções junto a indivíduos que não viriam espontaneamente ao Museu”. Com certeza Airbnb conta promover não somente sua oferta de quartos, mas buscar também novos donos de casas e apartamentos para receber seus clientes.

Além dessa iniciativa, os parceiros prometem outras atividades conjuntas, tais como concertos e visitas noturnas. A seguir…

Para participar ao concurso basta preencher o formulário no link  Louvre & Airbnb.  Eu tentei e deu erro ( mas vou continuar tentando). E você? Vai tentar?

O dia da mentira e nossas heranças francesas


O dia da mentira nasceu quando Charles IX decidiu alterar a data da mudança do ano cristão. 

De fato o papa Gregório XII já havia mudado a data dois anos antes, mas somente em 1564 o Rei Charles IX determinou que o ano cristão começasse no dia 1 de Janeiro ao invés de 1 de abril na França.

O acontecimento teve como conseqüência a mudança do dia de troca de presentes que marcava a passagem para o ano novo.

Naquela época os presentes então oferecidos eram geralmente alimentos. Como o dia 1 de abril marca o fim da Quaresma – período durante o qual o consumo de carne é proibido para os cristãos – o peixe era o presente mais comum.

Alguns franceses resistiram à mudança de data realizada por Charles IX e continuaram a seguir o calendário antigo, pelo qual o ano se iniciava dia 1 de abril. Gozadores passaram então a ridiculariza-los, enviando presentes extravagantes como falsos peixes ou convites para festas inexistentes. Na França este dia é chamado de Poisson d’avril, ou Peixe de abril. Em 200 anos o costume de fazer piadas mentirosas criou raízes na França e se espalhou pelo mundo.

No Brasil, o primeiro de abril começou a ser difundido em Minas Gerais, pelo o jornal A Mentira lançado no 1º de abril de 1828, com a notícia do falecimento de Dom Pedro, desmentida no dia seguinte. A Mentira saiu pela última vez a 14 de setembro de 1849, convocando todos os credores para um acerto de contas no dia 1º de abril do ano seguinte, dando como referência um local inexistente.

Incrível, não é mesmo?                                             

Mas o dia da mentira não é a única coisa que herdamos da França. O texto de Lorena Dillon, editado para o Ano da França no Rio de Janeiro e abaixo transcrito, nos lembra de alguma delas:

O Carnaval: A festa foi trazida pelos franceses. No século XI já existiam as festividades antes da quarta feira de cinzas, data do início da quaresma na religião católica.  Os franceses foram quem deram elegância e brilho ao carnaval, o luxo aos bailes de máscaras que saíram dos salões da nobreza para as ruas de Paris, atravessou os mares e chegou às Américas.

A elite carioca adota o baile de máscaras na segunda da metade do século XIX.

As primeiras notícias sobre o uso da serpentina surgem em 1893, um ano depois do confete. A idéia da serpentina surge com a brincadeira das telegrafistas francesas, que lançavam, umas sobre as outras, as fitas de papel azulado usadas nos telégrafos da época.

A Quadrilha: Surge com força no final do século XVIII uma contradance que agradou tanto o imperador Napoleão Bonaparte, que ele fez dela peça obrigatória dos grandes bailes de sua corte imperial. Com um toque teatral, a dança representa uma festa de casamento contada através das evoluções da coreografia, daí a existência do narrador que comenta a ação e dita os comandos em francês para a evolução da dança.

 No Brasil, a quadrilha vira moda nos salões do século XIX. Aqui ocorre a fusão cultural e a quadrilha que deriva da polca, ganha ritmos do maxixe e depois do baião. Foi mantida com narrativa francesa a representação de um casamento, embora de forma debochada, além de termos inserido elementos na narrativa como o padre e o pai da noiva.

Música: A importante influência francesa na cultura brasileira tem na música um dos seus exemplos mais marcantes. A música erudita o compositor francês Claude Debussy  provoca uma revolução com sua nova divisão rítmica. O maestro Heitor Villa Lobos fora um dos seus seguidores, que por sua vez influenciou Dorival Caymmi e Tom Jobim.

 A influência francesa de Debussy está em “o mar”, composição de Dorival Caymmi, que resgata o cancioneiro popular e abre portas para a liberdade harmônica da música popular brasileira.

 A música dos “chansonieres” franceses ( cantadores de canções) introduziu a música de fossa, ou mais conhecida como “ dor de cotovelo”. No Brasil a cantora que melhor representou este estilo musical foi Maysa Matarazzo. Muitas intérpretes brasileiras como Ângela Ro Ro e Alcione já cantaram a música francesa mais famosa no Brasil, Ne me quitte pas de Jaques Brel. A versão francesa mais conhecida é na voz de Edith Piaf.

Um dos cantores franceses mais populares da França é Charles Aznavour, que se apresentou no Brasil pela primeira vez em 1959, em apresentação no Teatro Copacabana. O cantor, em sua turnê de despedida em Abril de 2008, declarou seu amor ao Brasil e retornou ao país em Setembro para fazer mais sete shows.

Teatro: A França influenciou mundialmente o teatro e um dos templos irradiadores é a Comédie-Française, fundada por decreto de Luís XIV, em 1680. O nascente teatro brasileiro tem forte influência francesa, com encenações de peças que faziam sucesso em Paris. A comédia Moliere, pseudônimo de Jean Baptiste Poquelin, influenciou escritores brasileiros como Martins Pena e Artur Azevedo. A atriz francesa Henrriete Morineau participou do movimento de profissionalização do teatro brasileiro e teve papel fundamental para consolidação do teatro no país.

Vaudeville, chamado Alcazar Lírico, na rua da Vala, atual Uruguaiana, deu origem ao teatro de revista. Eram espetáculos apresentados em francês e português e tinha uma diversidade de números apresentados em uma só noite. É nesta época que entra em cena o Can Can.

Finalmente, neste dia da mentira, descobri que somos mais franceses do que imaginávamos!